Mais uma vez, começaremos elogiando o Rabótcheie Dielo. "Literatura de Denúncia e Luta Proletária", assim denominou Martynov o seu artigo do Rabótcheie Dielo (n.º 10), sobre as divergências com o Iskra "Não podemos limitar-nos a denunciar o regime que entrava o seu desenvolvimento (do partido operário). Devemos, igualmente, fazer de nós o eco dos interesses correntes e urgentes do proletariado" (p. 63). É assim que Martynov formula a essência dessas divergências. "...O Iskra.... é efectivamente o órgão da oposição revolucionária que denuncia o nosso regime e principalmente o nosso regime político... Trabalhamos e trabalharemos, no que nos diz respeito, pela causa operária, em estreita ligação orgânica com a luta proletária". (Ibid.). Não é possível deixar de agradecer a Martynov por essa formulação. Ela adquire um grande interesse geral, pelo facto de abranger, no fundo, não somente as nossas divergências de pontos de vista com o Rabótcheie Dielo, mas todas as divergências que existem, de maneira geral, entre nós e os "economistas" sobre a questão da luta política. Já mostramos que os "economistas" não negam absolutamente a "política", mas que se desviam constantemente da concepção social-democrata em direcção à concepção sindical da política. É exactamente assim que o faz Martynov; e por isso queremos tomá-lo como espécime dos erros "economistas" na questão de que nos ocupamos. Tentaremos demonstrar que nem os autores do "Suplemento especial da Rabótchaia Mysl", nem os da declaração do "Grupo da Auto-libertação", nem tampouco os da carta económica do n.º 12 do Iskra têm o direito de nos reprovar tal escolha.
Ninguém ignora que a extensão e a consolidação da luta económica dos operários russos marcharam de par com a eclosão da "literatura" de denúncia económica (referente às fábricas e à vida profissional). As "folhas volantes" denunciavam principalmente o regime das fábricas, e isso deu origem imediatamente a uma verdadeira paixão pelas denúncias entre os operários. Quando estes últimos viram que os círculos sociais-democratas queriam e podiam fornecer-lhes "folhas volantes" de um novo género, dizendo toda a verdade sobre a sua vida miserável, o seu trabalho fatigante e a sua servidão, fizeram, de certo modo, chover cartas das fábricas e das oficinas. Esta "literatura de denúncia" fez sensação não somente na fábrica, cuja "folha volante" fustigava o regime, mas em todas as empresas onde havia rumores dos factos denunciados. Ora, como as necessidades e a miséria dos operários de diferentes empresas e profissões têm muitos pontos comuns, a "verdade sobre a vida operária" maravilhou todo o mundo. Uma verdadeira paixão de "aparecer em letra de forma" tomou conta dos operários mais atrasados, nobre paixão por essa forma embrionária de guerra contra toda a ordem de coisas existente, baseada na pilhagem e na opressão. E as "folhas volantes" constituíram, efectivamente, na imensa maioria dos casos, uma declaração de guerra, porque o que divulgavam entusiasmava vivamente os operários, impelia-os a reclamar a supressão dos abusos mais gritantes e a apoiar as suas reivindicações através de greves. Os próprios donos das fábricas foram, afinal, obrigados a reconhecer nesses panfletos uma declaração de guerra a ponto de muitas vezes não desejarem sequer aguardar a própria guerra. Como sempre, simplesmente através da sua publicação, tais revelações adquiriram vigor e exerceram forte pressão moral. Não era raro o facto de a simples aparição de um panfleto obter a satisfação total ou parcial das reivindicações dos operários. Numa palavra, as denúncias económicas (nas fábricas) eram e continuam a ser uma poderosa alavanca da luta económica. E assim o será, enquanto existir o capitalismo, que impele necessariamente os operários à autodefesa. Nos países europeus mais avançados, pode-se ainda agora observar que a denúncia de condições escandalosas de trabalho em algum "ofício" em desuso, ou num ramo de trabalho no domicílio esquecido de todos, leva ao despertar da consciência de classe, à luta sindical, e à difusão do socialismo.
A grande maioria dos social-democratas russos, nestes últimos tempos, foi quase inteiramente absorvida pela organização dessas denúncias nas fábricas. Basta lembrar a Rabótchaia Mysl para se ver a que ponto chegou tal absorção; esquecia-se que, no fundo, essa actividade não era ainda em si mesma social-democrata, mas apenas sindical. As denúncias referiam-se, no fundo, somente às relações dos operários de uma determinada profissão com os seus patrões, e não tiveram, outro resultado senão o de ensinar àqueles que vendiam a sua força de trabalho, a vender esta "mercadoria" de forma mais vantajosa, e a lutar contra o comprador no terreno de uma transacção puramente comercial. Essas denúncias (na condição de serem convenientemente utilizadas pela organização dos revolucionários) podiam servir de ponto de partida e de elemento constitutivo da acção social-democrata; mas também podiam conduzir (e até conduziam, quando se inclinavam diante da espontaneidade) à luta "exclusivamente profissional" e a um movimento operário não social-democrata. A social-democracia dirige a luta da classe operária, não apenas para obter condições vantajosas na venda da força de trabalho, mas, também, pela abolição da ordem social, que obriga os não possuidores a venderem-se aos ricos. A social-democracia representa a classe operária nas suas relações não apenas com um determinado grupo de empregadores, mas com todas as classes da sociedade contemporânea e com o Estado como força política organizada. Consequentemente, portanto, os sociais-democratas não só não podem limitar-se à luta económica, como também não podem admitir que a organização das denúncias económicas constitua a sua actividade mais definida. Devemos empreender activamente a educação política da classe operária, trabalhar para desenvolver a sua consciência política. Quanto a esse ponto, após a primeira ofensiva da Zaria e do Iskra contra o "economismo", agora "todos estão de acordo" (acordo por vezes apenas verbal, como veremos em seguida).
A questão que se coloca é: em que deve consistir a educação política? Podemos limitar-nos a difundir a ideia de que a classe operária é hostil à autocracia? Naturalmente que não. Não é suficiente para esclarecer os operários sobre a sua opressão política (como não o seria para explicar-lhes a oposição entre os seus interesses e os dos patrões). É necessário fazer a agitação a propósito de cada manifestação concreta desta opressão (como fizemos em relação às manifestações concretas da opressão económica). Ora, como esta opressão se exerce sobre as mais diversas classes da sociedade, manifesta-se nos mais diversos aspectos da vida e da actividade profissional, civil, privada, familiar, religiosa, científica etc. etc., não se torna evidente que não realizaremos a nossa tarefa que é desenvolver a consciência política dos operários, se não nos encarregarmos de organizar uma ampla campanha política de denúncia da autocracia? De facto, para fazer a agitação sobre as manifestações concretas da opressão, é preciso denunciar essas manifestações (da mesma forma que para conduzir a agitação económica, era preciso denunciar os abusos cometidos nas fábricas).
Acho que isto está claro. Mas verifica-se justamente que a necessidade de desenvolver amplamente a consciência política não é reconhecida "por todos", senão em palavras. Verifica-se, por exemplo, que o Rabótcheie Dielo longe de se encarregar de organizar, ele próprio, uma ampla campanha de denúncias políticas (ou de tomar a iniciativa com vista a essa organização) põe-se a puxar para trás o Iskra, que já tinha iniciado essa tarefa. Escutem: "A luta política da classe operária é apenas" (justamente ela não é "apenas") "a forma mais desenvolvida, a forma maior e mais efectiva da luta económica" (programa do Rabótcheie Dielo, R D., n.º 1, p. 3). "Agora, para os sociais-democratas trata-se de saber como conferir à própria luta económica, sempre que possível, um carácter político" (Martynov, no número 10, p. 42). "A luta económica é o meio mais amplamente aplicável para levar as massas à luta política activa" (resolução do Congresso da União e "emendas": Dois Congressos, p.11 e 17). O Rabótcheie Dielo, como se vê, desde o seu nascimento até às últimas "instruções à redacção", esteve sempre impregnado dessas teses, que evidentemente exprimem, todas, um único ponto de vista sobre a agitação e a luta políticas. Considerem este ponto de vista sob o ângulo da opinião que prevalece entre todos os "economistas", opinião segundo a qual à agitação política deve seguir a agitação económica. Será verdade que a luta económica é, em geral, "o meio mais amplamente aplicável" para levar as massas à luta política? Isto é absolutamente falso. Todas as manifestações, quaisquer que sejam elas, da opressão policial e do arbitrarismo absolutista, e não apenas as ligadas à luta económica, constituem um meio não menos "amplamente aplicável" para tal "integração". Por que os zemskie natchaIniki e os castigos corporais infligidos aos camponeses, a corrupção dos funcionários e a maneira como a polícia trata a "plebe" das cidades, a luta contra os famintos, a campanha repelindo a aspiração do povo à instrução e à ciência, a extorsão dos impostos, a perseguição às seitas, o adestramento dos soldados e o regime de caserna imposto aos estudantes e aos intelectuais liberais – por que todas essas manifestações de opressão, e milhares de outras mais, não directamente ligadas à luta "económica", constituem em geral os meios e as ocasiões menos "amplamente aplicáveis" de agitação política, de integração da massa à luta política? Muito pelo contrário; na soma total dos casos quotidianos em que o operário sofre (ele próprio, ou os ligados a ele) a servidão, a arbitrariedade e a violência, os casos de opressão policial que se aplicam precisamente à luta profissional não constituem, certamente, senão uma pequena minoria. Por que, então, restringir de antemão a amplitude da propaganda política, proclamando como "o mais amplamente aplicável" apenas um único meio, ao lado do qual, para o social-democrata, deveria haver outros que, de forma geral, não são menos "amplamente aplicáveis"?
Em época já muito remota (há um ano! ... ), o Rabótcheie Dielo escrevia: "As reivindicações políticas imediatas tornam-se acessíveis à massa após uma, ou na pior das hipóteses, após várias greves", "desde que o governo utilize a polícia e o corpo policial" (n.º 7, p. 15, Agosto de 1900). Essa teoria oportunista dos estádios foi rejeitada pela União, que nos faz uma concessão declarando: "não há nenhuma necessidade, desde o início, de se fazer a agitação política exclusivamente no terreno económico" (Dois Congressos, p. 11). Esta única negação pela União de uma parte dos seus antigos erros mostrará ao futuro historiador da social-democracia russa, melhor do que toda a espécie de longas dissertações, a que ponto os nossos "economistas" rebaixaram o socialismo! Mas, que ingenuidade da União imaginar que, a troco do abandono de uma forma de estreitamento da política, poderia fazer-nos aceitar outra forma de estreitamento! Não teria sido mais lógico dizer, também, que é preciso sustentar uma luta económica, da forma mais ampla possível; que é preciso sempre utilizá-la para os fins de agitação política, mas que "não há nenhuma necessidade' de se considerar a luta económica como o meio mais amplamente aplicável para integrar a massa à luta política activa?
A União considera importante o facto de ter substituído a expressão "o meio mais amplamente aplicável", pela expressão "o melhor meio", que figura na resolução correspondente ao Quarto Congresso da União Operária Judaica (Bud). Na verdade, seria embaraçoso para nós dizer qual dessas duas resoluções é a melhor: em nossa opinião são as duas piores. Tanto a União como o Bund perdem-se no que diz respeito a uma interpretação economista, sindical da política (em parte, talvez inconscientemente, sob a influência da tradição). No fundo, a questão em nada se altera, quer se empregue as palavras "o melhor", ou "o mais amplamente aplicável". Se a União tivesse dito que "a agitação política no terreno económico" constitui o meio mais amplamente aplicado (e não "aplicável") teria razão quanto a certo período de desenvolvimento de nosso movimento social-democrata. Teria razão precisamente no que concerne aos economistas, no que diz respeito a muitos (senão a maior parte) dos militantes práticos de 1898-1901; de facto, esses "economistas" práticos aplicaram a agitação política (se é que a aplicaram de algum modo), quase exclusivamente no terreno económico. Como vimos, a Rabótchaia Mysl e o "Grupo da Auto-libertação" admitiam, também eles, e até recomendavam uma agitação política desse género! O "Rabótcheie Dielo" devia condenar resolutamente o facto de a agitação económica, útil em si mesma, ter sido acompanhada de uma restrição prejudicial da luta política; ora, ao invés disso, declara o meio mais aplicado (pelos "economistas") como o mais aplicável! Não é de se surpreender que, quando damos a esses homens o nome de "economistas", não lhes resta senão insultarem-nos, chamando-nos de "mistificadores" e "desorganizadores", e de, "núncios do papa" e "caluniadores", de se lamentarem diante de todos que lhes fizemos uma afronta atroz, e declarar, quase jurando aos seus grandes deuses: "decididamente, hoje, nenhuma organização social-democrata está contaminada pelo economismo". Ali! Esses caluniadores, esses políticos malévolos! Não terão eles inventado todo esse "economismo" para infringir às pessoas, por simples ódio à humanidade, afrontas atrozes?
Qual é o sentido concreto, real, da tarefa que Martynov atribui à social-democracia de "conferir à própria luta económica um carácter político"? A luta económica é a luta colectiva dos operários contra os patrões, para vender vantajosamente a sua força de trabalho, para melhorar as suas condições de trabalho e de existência. Essa luta é necessariamente uma luta profissional, porque as condições de trabalho são extremamente variadas, de acordo com as profissões e, portanto, a luta pela melhoria de condições deve ser forçosamente conduzida pela profissão (pelos sindicatos no Ocidente, pelas uniões profissionais provisórias, por intermédio das "folhas volantes" na Rússia etc.). Conferir "à própria luta económica um carácter político" significa, portanto, procurar conseguir as mesmas reivindicações profissionais, melhorar as condições de trabalho em cada profissão através de "medidas legislativas e administrativas" (como se exprime Martynov na página seguinte – 43 – do seu artigo). É exactamente o que fazem e sempre fizeram os sindicatos operários. Leiam a obra dos seus profundos conhecedores (e de "profundos" oportunistas), como o casal Webb, e verão que há muito os sindicatos operários da Inglaterra compreenderam e realizam a tarefa de "conferir à própria luta económica um carácter político": que há muito e muito tempo lutam pela liberdade das greves, pela supressão dos obstáculos jurídicos de todo género e de toda ordem ao movimento cooperativista e sindical, pela promulgação de leis para a protecção da mulher e da criança, pela melhoria das condições do trabalho através de uma legislação sanitária, industrial etc.
Assim, pois, sob um aspecto "terrivelmente" profundo e revolucionário, a frase pomposa – "conferir à própria luta económica um carácter político" – dissimula na realidade a tendência tradicional de rebaixar a política social-democrata ao nível da política sindical! Sob o pretexto de corrigir a estreiteza do Iskra, que prefere – vejam vocês; "revolucionar o dogma do que revolucionar a vida", servem-nos como novidade a luta pelas reformas económicas. Na realidade, a frase – "Conferir à própria luta económica um carácter político" – implica apenas a luta pelas reformas económicas. E o próprio Martynov poderia ter chegado a essa conclusão pouco subtil, se tivesse meditado profundamente nas suas próprias palavras. "O nosso partido", diz ele, apontando a sua arma mais terrível contra o Iskra, "poderia e deveria exigir do governo medidas legislativas e administrativas concretas contra a exploração económica, o desemprego, a fome etc."(Rabótcheie Dielo, n.º 10, p. 42-43). Reivindicar medidas concretas não significa reivindicar reformas sociais? E mais uma vez tomamos o testemunho do leitor imparcial: caluniamos nós os rabotchediélentsi – perdoem-me esta infeliz palavra em voga! – qualificando-os de bernsteinianos disfarçados, quando pretendem que o seu desacordo com o Iskra repousa na necessidade de lutar por reformas económicas?
A social-democracia revolucionária sempre compreendeu e compreende na sua actividade a luta pelas reformas. Usa, porém, a agitação "económica" não somente para exigir do governo medidas de toda espécie, mas, também (e sobretudo), para dele exigir que deixe de ser um governo autocrático. Além disso, acredita dever apresentar ao governo essa reivindicação não só no terreno da luta económica, mas também no terreno de todas as manifestações, quaisquer que sejam, da vida política e social. Numa palavra, subordina a luta pelas reformas, como a parte ao todo, à luta revolucionária pela liberdade e pelo socialismo. Martynov ressuscita sob uma forma diferente a teoria dos estádios e tenta prescrever à luta política que tome resolutamente um caminho por assim dizer económico. Preconizando, desde o impulso revolucionário, a luta pelas reformas como uma "tarefa" pretensamente especial, arrasta o partido para trás, e faz o jogo do oportunismo "economista" e liberal.
Prossigamos. Após ter dissimulado pudicamente a luta pelas reformas sob a frase pomposa – "conferir à própria luta económica um carácter político" – Martynov apresentou, simplesmente como algo de particular, as reformas económicas (e mesmo as simples reformas no interior da fábrica). Por que teria feito isso? Ignoramos. Talvez por negligência? Mas se não tivesse considerado unicamente as reformas "fabris", toda a sua tese, que acabamos de mencionar acima, perderia sentido. Talvez porque julgue possíveis e prováveis, da parte do governo, apenas as "concessões" no aspecto económico? Se a resposta for sim, isto constitui um erro estranho: as concessões são possíveis e também se fazem no aspecto legislativo, quando se trata de aplicar a chibata, quando se trata de passaportes, de resgates, de seitas, da censura etc, etc. As concessões (ou pseudoconcessões) "económicas" são evidentemente as menos dispendiosas e as mais vantajosas para o governo, pois, dessa forma, espera ganhar a confiança das massas operárias. Mas é precisamente por isso que nós, os sociais-democratas, não devemos de forma alguma e por motivo algum ceder a essa opinião (ou a um mal-entendido) de que as reformas económicas pretensamente nos agradam, e que as consideramos as mais importantes etc. "Tais reivindicações" – diz Martynov falando das medidas legislativas e administrativas concretas que mencionou anteriormente – "não seriam uma frase oca, porque, prometendo resultados tangíveis, poderiam ser apoiadas activamente pela massa operária..." Não somos "economistas", oh, não! Simplesmente prostramo-nos diante da "tangibilidade" dos resultados concretos, tão servilmente como o fazem os senhores Bernstein, Prokopovitch, Struve, R. M., e tutti quanti. Simplesmente damos a entender (com Narciso Tuporilov) que tudo o que "não promete resultados tangíveis" não é mais do que uma "frase oca"! Simplesmente expressamo-nos como se a massa operária fosse incapaz (que já provou, ao contrário dos que despejam o seu próprio filistinismo sobre ela, a sua capacidade) de apoiar activamente qualquer protesto contra a autocracia, mesmo aquele que não lhe promete absolutamente qualquer resultado tangível!
Tomemos os mesmos exemplos lembrados pelo próprio Martynov, relativos às "medidas" contra o desemprego e a fome. Enquanto o Rabótcheie Dielo trabalhava, segundo fazia crer, para elaborar e desenvolver "reivindicações concretas (sob a forma de projectos de lei?) referentes a medidas legislativas e administrativas", "prometendo resultados tangíveis", o Iskra, que "prefere invariavelmente revolucionar o dogma do que revolucionar a vida", dedicava-se a explicar a ligação estreita entre o desemprego e o regime capitalista, advertindo que a "fome se aproxima", denunciando a "luta contra os famintos" desencadeada pela polícia e os escandalosos "regulamentos provisórios draconianos", e a Zaria lançava em tiragem especial, como folheto de propaganda, uma parte da Revista da Situação Interior, dedicada à fome. Mas, meu Deus, como foram "unilaterais", nesse caso, os ortodoxos incorrigivelmente estreitos, os dogmáticos surdos às injunções da "própria vida"! Nenhum de seus artigos contém – que horror! – nem uma única, vejam bem, "reivindicação concreta", "prometendo resultados tangíveis"! Os infelizes dogmáticos! É preciso enviá-los à escola de Kritchévski e Martynov para convencê-los de que a táctica é um processo de crescimento, do que cresce etc., e que é preciso conferir à própria luta económica um carácter político!
“Além da sua importância revolucionária directa, a luta económica dos operários contra os patrões e o governo ("a luta económica contra o governo"!!) apresenta ainda a utilidade de incitar os operários a pensar constantemente que estão frustrados nos seus direitos políticos" (Martynov, p. 44). Citamos essa frase não a fim de repetir pela centésima ou milésima vez o que dissemos acima, mas a fim de agradecer muito particularmente a Martynov por esta nova e excelente frase: "A luta económica dos operários contra os patrões e o governo". Que maravilha! Com que talento inimitável, com que magistral eliminação de todas as diferenças parciais, de todas as variedades de matizes entre "economistas", encontra-se expressa aqui, numa proposição breve e límpida, toda a essência do "economismo", desde o apelo instigando os operários à "luta política que conduzem no interesse geral, a fim de melhorar a sorte de todos os operários", passando pela teoria dos estádios, para finalizar com a resolução do congresso sobre o "meio mais amplamente aplicável" etc. "A luta económica contra o governo" constitui exactamente a política sindical, que ainda se encontra muito e muito longe da política social-democrata.
"Que quantidade de Lomonossovs sociais-democratas surgiram entre nós, nos últimos tempos!" observou um dia um camarada, referindo-se à inclinação surpreendente de muitos daqueles que se voltam para o "economismo", para chegar apenas "pela sua própria inteligência" às grandes verdades (como, por exemplo, aquela de que a luta económica instiga os operários a pensar que estão frustrados nos seus direitos), desconhecendo, com soberano desprezo próprio do talento nato, tudo o que já foi dado pelo desenvolvimento anterior do pensamento e do movimento revolucionários. Esse talento nato é justamente Lomonossov-Martynov. Olhem o seu artigo, "As Questões Imediatas", e verão como chega "pela sua própria inteligência" àquilo que há muito foi dito por Axelrod (a propósito de quem o nosso Lomonossov, bem entendido, guarda um silêncio absoluto); como começa, por exemplo, a compreender que não podemos desconhecer o espírito de oposição dessas ou daquelas camadas da burguesia (R. D. nº.9, p. 61, 62, 71 – comparem à "Resposta" da redacção do R D. a Axelrod, p. 22, 23-24) etc. Mas, ai! só chega e só começa; pois, compreendeu tão pouco do pensamento de Axelrod, que fala da "luta económica contra os patrões e o governo". Durante três anos (1898-1901) o Rabótcheie Dielo esforçou-se para compreender Axelrod, e ainda não o compreendeu! Será que isto ocorre talvez porque para a social-democracia, da mesma forma que "para a humanidade", sempre são colocadas tarefas realizáveis?
Mas, os Lomonossovs não somente ignoram de maneira particular as coisas (isto seria apenas meio mal!), como também não se dão conta da sua ignorância. Isto constitui uma verdadeira desgraça, que os leva a empreender repentinamente a tarefa de "aprofundar" Plekhanov.
"Depois que Plekhanov escreveu o opúsculo em questão (As Tarefas dos Socialistas na Luta Contra a Fome na Rússia) muita água correu", diz Lomonossov-Martynov. "Os sociais-democratas que dirigiram durante dez anos a luta económica da classe operária... ainda não tiveram tempo de dar amplo fundamento teórico à táctica do Partido. Agora essa questão chegou à maturidade, e se quisermos conferir tal fundamento teórico, devemos aprofundar de forma segura os princípios tácticos que, em seu tempo, Plekhanov desenvolveu... Devemos agora diferenciar entre a propaganda e a agitação, de maneira distinta do que o fez Plekhanov."
(Martynov acaba de citar as palavras de Plekhanov: "O propagandista inculca muitas ideias numa única pessoa, ou num pequeno número de pessoas: o agitador inculca apenas uma única ideia ou um pequeno número de ideias: em troca, inculca-as em toda uma massa de pessoas").
"Por propaganda entendemos a explicação revolucionária de todo o regime actual, ou das suas manifestações parciais, quer feita de forma acessível a apenas algumas pessoas, ou às grandes massas. pouco importa. Por agitação, no sentido estrito da palavra (sic), entendemos o apelo dirigido às massas para certos actos concretos, a contribuição para a intervenção revolucionária directa do proletariado na vida social."
As nossas felicitações à social-democracia russa – e internacional – que recebe assim, graças a Martynov, uma nova terminologia mais estrita e mais profunda. Até agora, pensávamos (com Plekhanov e todos os dirigentes do movimento operário internacional) que um propagandista, ao tratar por exemplo do problema do desemprego, deve explicar a natureza capitalista das crises, mostrar o que as torna inevitáveis na sociedade moderna, mostrar a necessidade da transformação dessa sociedade em sociedade socialista etc. Numa palavra, deve fornecer "muitas ideias", um número tão grande de ideias que, de momento, todas essas ideias tomadas em conjunto apenas poderão ser assimiladas por um número (relativamente) restrito de pessoas. Tratando da mesma questão, o agitador tomará o facto mais conhecido dos seus ouvintes, e o mais palpitante, por exemplo uma família de desempregados morta de fome, a indigência crescente etc., e apoiando-se sobre esse facto conhecido de todos, fará todo o esforço para dar à "massa" uma única ideia: a da contradição absurda entre o aumento da riqueza e o aumento da miséria; esforçar-se-á para suscitar o descontentamento, a indignação da massa contra essa injustiça gritante, deixando ao propagandista o cuidado de dar uma explicação completa dessa contradição. Por isso, o propagandista age principalmente por escrito, e o, agitador de viva voz. Não se exige de um propagandista as mesmas qualidades de um agitador. Diremos que Kautsky e Lafargue, por exemplo, são propagandistas, enquanto Bebel e Guesde são agitadores. Distinguir um terceiro domínio, ou uma terceira função da actividade prática, função que consistiria em "atrair as massas para certos actos concretos", é o maior dos absurdos, pois o "apelo" sob forma de acto isolado, ou é o complemento natural e inevitável do tratado teórico, do folheto e propaganda, do discurso da agitação, ou é uma função pura e simples de execução. De facto, tomemos, por exemplo, a luta actual dos sociais-democratas alemães contra os direitos alfandegários sobre os cereais. Os teóricos redigem estudos especiais sobre a política alfandegária, onde "apelam", digamos assim, para se lutar por tratados comerciais e pela liberdade do comércio; o propagandista faz o mesmo numa revista, e o agitador nos discursos públicos. Os "actos concretos" da massa são, nesse caso, a assinatura de uma petição endereçada ao "Reichstag" contra a majoração dos direitos alfandegários sobre os cereais. O apelo a essa acção emana indirectamente dos teóricos, dos propagandistas e dos agitadores, e directamente dos operários que passam as listas de petição nas fábricas e domicílios particulares. Segundo a "terminologia de Martynov", Kautsky e Bebel seriam ambos propagandistas e portadores das listas dos agitadores. Não é isso?
Esse exemplo dos alemães me faz pensar na palavra alemã Verbalhornung, literalmente: "balhornização". Jean Balhorn foi um editor, que viveu no século XVI, em Leipzig; publicou um abecedário onde, segundo o hábito, figurava entre outros desenhos um galo; mas, o galo era representado sem esporões e com dois ovos ao lado. No frontispício fora acrescentado: "Edição corrigida de Jean Balhorn." Desde essa época, os alemães qualificam de Verbalhornung uma "correcção" que, na verdade, é o contrário de uma melhoria. A história de Balhorn vem-me à mente de maneira involuntária, quando vejo como os Martynov "aprofundam" Plekhanov...
Por que o nosso Lomonossov "imaginou" essa terminologia confusa? Para mostrar que o Iskra, "da mesma maneira que Plekhanov há quinze anos, não considera senão um lado das coisas". "No Iskra, ao menos agora, as tarefas da propaganda relegam para segundo plano as da agitação". Se traduzirmos essa última tese da língua de Martynov para linguagem humana (pois a humanidade ainda não teve tempo de adoptar a terminologia que acaba de ser descoberta), chegamos ao seguinte: no Iskra, as tarefas de propaganda e da agitação política relegam para segundo plano a que consiste "em apresentar ao governo reivindicações concretas de medidas legislativas e administrativas", "prometendo resultados tangíveis" (dito de outra forma, reivindicações de reformas sociais, se nos é permitido, ainda uma vez mais, empregar a antiga terminologia da antiga humanidade, que ainda não chegou à altura de Matynov). Que o leitor compare a essa tese a seguinte passagem:
"O que nos espanta nesses programas" (os programas dos sociais-democratas revolucionários), "é que colocam constantemente em primeiro plano as vantagens da acção dos operários para o Parlamento (inexistente entre nós) e desconhecem totalmente (em decorrência do seu niilismo revolucionário) a importância que teria a participação dos operários nas assembleias legislativas patronais – existentes entre nós – nos assuntos da fábrica... ou mesmo simplesmente a sua participação na administração municipal ..."
O autor desta passagem exprime, de maneira um pouco mais aberta, um pouco mais clara e franca, a mesma ideia à qual chegou Lomonossov-Martynov pela sua própria inteligência. O autor é R. M. do "Suplemento especial da Rabótchaia Mysl" (p. 15).
Dirigindo contra o Iskra a sua "teoria" da "elevação da actividade da massa operária", Martynov revelou, na realidade, a sua tendência de rebaixar essa actividade declarando que o melhor meio, o de especial importância, "o mais amplamente aplicável" para suscitá-la, e o próprio campo dessa actividade era essa mesma luta económica diante da qual se prostram todos os "economistas". Erro característico, pois está longe de ser unicamente próprio de Martynov. Na realidade, a "elevação da actividade da massa operária" será possível unicamente se não nos limitarmos à "agitação política no terreno económico". Ora, uma das condições essenciais para a extensão necessária da agitação política é organizar as revelações políticas em todos os aspectos. Somente essas revelações podem formar a consciência política e suscitar a actividade revolucionária das massas. Por isso essa actividade é uma das funções mais importantes de toda a social-democracia internacional, pois mesmo a liberdade política não elimina absolutamente as revelações; apenas lhe modifica um pouco a direcção. Assim, o partido alemão, graças à constante energia com que prossegue a sua campanha de revelações políticas, fortifica de modo particular as suas posições e estende a sua influência. A consciência da classe operária não pode ser uma consciência política verdadeira, se os operários não estiverem habituados a reagir contra todo o abuso, toda a manifestação de arbitrariedade, de opressão e de violência, quaisquer que sejam as classes atingidas; a reagir justamente do ponto de vista social-democrata, e não de qualquer outro ponto de vista. A consciência das massas operárias não pode ser uma consciência de classe verdadeira, se os operários não aprenderem a aproveitar os factos e os acontecimentos políticos concretos e de grande actualidade, para observar cada uma das outras classes sociais em todas as manifestações da sua vida intelectual, moral e política; se não aprenderem a aplicar praticamente a análise e o critério materialista a todas as formas da actividade e da vida de todas as classes, categorias e grupos de população. Todo aquele que orienta a atenção, o espírito de observação e a consciência da classe operária exclusiva ou preponderantemente para ela própria, não é um social-democrata; pois para se conhecer a si própria, de facto, a classe operária deve ter um conhecimento preciso das relações recíprocas de todas as classes da sociedade contemporânea, conhecimento não apenas teórico... ou melhor: não só teórico, como fundamentado na experiência da vida política. Eis porque os nossos "economistas", que pregam a luta económica como o meio mais amplamente aplicável para integrar as massas no movimento político, realizam um trabalho profundamente prejudicial e reaccionário nos seus resultados práticos. Para se tornar um social-democrata, o operário deve ter uma ideia clara da natureza económica, da fisionomia política e social do grande proprietário de terras e do pope, do dignitário e do camponês, do estudante e do vagabundo, conhecer os seus pontos fortes e os seus pontos fracos, saber enxergar, nas fórmulas correntes, sofismas de toda espécie com que cada classe e cada camada social encobre os seus apetites egoístas e sua verdadeira "natureza"; saber distinguir esses ou aqueles interesses que reflectem as instituições e as leis, e como as reflectem. Ora, não é nos livros que o operário poderá obter essa "ideia clara": ele a encontrará apenas nas amostras vivas, nas revelações ainda recentes do que se passa num determinado momento à nossa volta, do que todos ou cada um falam ou cochicham entre si, do que se manifesta nesses ou naqueles factos, números, veredictos, e assim até ao infinito. Essas revelações políticas abrangendo todos os aspectos são a condição necessária e fundamental para educar as massas em função da actividade revolucionária.
Por que o operário russo ainda manifesta tão pouca actividade revolucionária face às violências selvagens exercidas pela polícia contra o povo, face à perseguição às seitas, às "vias de facto" quanto aos camponeses, aos abusos escandalosos da censura, às torturas infligidas aos soldados, à guerra feita às iniciativas mais inofensivas em matéria de cultura, e assim por diante? Será porque a "luta económica" não o "incita" a isso, porque lhe "promete" poucos "resultados tangíveis", lhe oferece poucos resultados "positivos"? Não! Repetimos. Pretender isso é querer atribuir a outrem as suas próprias faltas, é atribuir à massa operária o seu próprio filistinismo (ou bernisteinismo). Até agora, não soubemos organizar campanhas de denúncias suficientemente amplas, ruidosas e rápidas contra todas essas infâmias; a culpa é nossa, de nosso atraso em relação ao movimento de massas. E se o fizermos (devemos e podemos faze-lo), o operário mais atrasado compreenderá ou sentirá que o estudante e o membro de uma seita, o mujique e o escritor estão expostos às injúrias e à arbitrariedade da mesma força tenebrosa que o oprime e pesa sobre ele a cada passo, durante toda a vida; e, tendo sentido isso, desejará, desejará irresistivelmente e saberá ele próprio reagir; hoje, ele fará "arruaças" contra os censores, amanhã fará manifestações diante da casa do governador, que terá reprimido uma revolta camponesa, depois de amanhã castigará os polícias de sotaina que fazem o trabalho da santa inquisição etc. Até agora fizemos muito pouco, quase nada, para lançar entre as massas operárias revelações sobre todos os aspectos da actualidade. Muitos de entre nós não têm nem mesmo consciência dessa obrigação que lhes cumpre, e arrastam-se cegamente em consequência da "obscura luta quotidiana" no estreito quadro da vida da fábrica. Daí dizer – "o Iskra tem tendência a subestimar a importância da marcha progressiva da obscura luta quotidiana, comparada à propaganda das brilhantes ideias acabadas (Martynov, p. 61)" – é arrastar o Partido para trás, é defender e glorificar a nossa falta de preparação, o nosso atraso.
Quanto ao apelo às massas para a acção, isto será feito por si, desde que haja uma agitação política enérgica, revelações vivas e precisas. Apanhar alguém em flagrante delito e acusá-lo perante todos e em toda parte é mais eficaz do que qualquer apelo, e constitui uma forma de agitação onde, muitas vezes, é impossível estabelecer quem precisamente "atraiu" a multidão e colocou em andamento esse ou aquele plano de manifestação etc. Fazer o apelo, não de forma geral, mas no sentido próprio da palavra, não é possível se não der lugar à acção: não se pode impelir os outros a agir, se não se dá imediatamente o próprio exemplo. Para nós, publicistas (escritores políticos) sociais-democratas, cabe aprofundar, ampliar e intensificar as revelações políticas e a agitação política.
A propósito de "apelos". O único órgão que, antes dos acontecimentos da Primavera, chamou os operários a intervir activamente numa questão que não lhes prometia de modo algum qualquer resultado tangível, como o recrutamento forçado dos estudantes para o exército, foi o "Iskra". Imediatamente após a publicação da ordem de 11 de Janeiro sobre "o recrutamento forçado de 183 estudantes para o exército", o Iskra, antes de qualquer manifestação, publicou um artigo a esse respeito (n.º 2, Fevereiro) e apelou abertamente "ao operário para vir em auxílio do estudante", apelou ao "povo" para contestar o insolente desafio do governo. Perguntamos a todos: como e através do que explicar o facto marcante de Martynov, que fala tanto dos "apelos" como uma forma especial de actividade, nada ter dito sobre esse apelo? Depois disso, não será filistinismo da parte de Martynov, declarar que o Iskra é unilateral pela razão exclusiva de não "apelar" suficientemente à luta pelas reivindicações "que prometem resultados tangíveis"?
Os nossos "economistas", aí incluído o Rabótcheie Dielo, tiveram êxito porque se dobraram à mentalidade dos operários atrasados. Mas o operário social-democrata, o operário revolucionário (o número desses operários aumenta dia a dia) repudiará com indignação todos esses raciocínios sobre a luta pelas reivindicações "que prometem resultados tangíveis" etc., pois compreenderá que não são mais do que variações sobre o velho tema do aumento de um copeque por rublo. Este operário dirá aos seus conselheiros da Rabótchaia Mysl e do Rabótcheie Dielo: "Não é justo que os senhores se dêem a tanto trabalho e intervenham com tanto zelo em assuntos dos quais nós mesmos nos ocupamos, e deixem de cumprir os vossos próprios deveres. Não é muito inteligente dizer, como os senhores fazem, que a tarefa dos sociais-democratas é conferir um carácter político à própria luta económica; isso é apenas o princípio, e não constitui a tarefa essencial dos sociais-democratas, pois no mundo inteiro, e aí também está incluída a Rússia, é a própria polícia que começa a conferir à luta económica um carácter político; os próprios operários aprendem a compreender a quem serve o governo. De facto, "a luta económica dos operários contra os patrões e o governo", que os senhores louvam como se tivessem descoberto uma nova América, é conduzida em todos os recantos da Rússia pelos próprios operários, que ouviram falar de greves, mas, provavelmente, ignoram tudo sobre o socialismo. A nossa "actividade" de operários, actividade que os senhores se obstinam a querer apoiar lançando reivindicações concretas, que prometem resultados tangíveis, já existe entre nós; e na nossa acção profissional ordinária, de todos os dias, apresentamos nós próprios essas reivindicações concretas, a maior parte das vezes sem qualquer ajuda dos intelectuais. Mas essa actividade não nos satisfaz; não somos crianças que podem ser alimentadas apenas com a "sopinha" da política "económica"; queremos saber tudo o que os outros sabem, queremos conhecer em detalhe todos os aspectos da vida política e participar activamente de cada acontecimento político. Para isso, é necessário que os intelectuais nos repitam um pouco menos o que já sabemos, e que nos dêem um pouco mais do que ainda ignoramos, daquilo que a nossa experiência "económica", na fábrica, jamais nos ensinará: os conhecimentos políticos. Esses conhecimentos apenas os senhores, intelectuais, podem adquirir, é vosso dever fornecer-nos tais conhecimentos em quantidades cem, mil vezes maiores do que o fizeram até agora, e não apenas sob a forma de raciocínios, folhetos e artigos (os quais frequentemente costumam ser – perdoem a franqueza! – maçantes), mas – e isto é imperioso – sob a forma de revelações vivas sobre o que fazem o nosso governo e as nossas classes dominantes exactamente no momento actual, em todos os aspectos da vida. Portanto, ocupai-vos um pouco mais ciosamente da tarefa que vos pertence, e façam menos " elevar a actividade da massa operária". Da actividade, sabemos muito mais do que os senhores pensam, e sabemos mantê-la através de uma luta aberta, dos combates de rua, e até através das reivindicações que não deixam entrever nenhum "resultado tangível"! E não lhes compete "elevar" a nossa actividade, pois é exactamente actividade o que vos falta. Não vos inclineis tanto diante da espontaneidade, e pensai um pouco mais em elevar a vossa própria actividade, Senhores!
Confrontámos anteriormente, numa nota, um "economista" e um não social-democrata terrorista que, por acaso, fossem solidários. Mas, de forma geral, existe entre eles uma ligação interna, não acidental, mas necessária, a respeito da qual voltamos exactamente a propósito da educação da actividade revolucionária. Os "economistas" e os terroristas de hoje possuem uma raiz comum, a saber, o culto da espontaneidade de que falámos no capítulo anterior como um fenómeno geral, e que iremos agora examinar na sua influência sobre a acção e a luta políticas. À primeira vista, a nossa afirmação pode parecer paradoxal, tão grande parece ser a diferença entre os que colocam em primeiro plano "a obscura luta quotidiana", e os que induzem o indivíduo isolado a lutar com a maior abnegação. Mas tal ponto não constitui um paradoxo. "Economistas" e terroristas inclinam-se perante os dois pólos opostos da tendência espontânea: os "economistas", diante da espontaneidade do "movimento operário puro"; os terroristas, diante da espontaneidade da mais ardente indignação dos intelectuais que não sabem ou não podem conjugar o trabalho revolucionário e o movimento operário. De facto, é difícil para os que perderam a fé nessa possibilidade, ou que nela jamais acreditaram, encontrar outra saída para a sua indignação e energia revolucionária, que não o terrorismo. Assim, em consequência, nessas duas tendências o culto da espontaneidade é apenas o começo da realização do famoso programa do Credo: os operários conduzem a sua "luta económica contra os patrões e o governo" (que o autor do Credo nos perdoe exprimir o seu pensamento na língua de Martynov! Julgamo-nos no direito de fazê-lo, uma vez que no Credo também se fala que na luta económica os operários "entram em choque com o regime político"), e os intelectuais conduzem a luta política através das suas próprias forças, naturalmente por intermédio do terror! Dedução absolutamente lógica e inevitável sobre a qual não será demais insistir, mesmo quando aqueles que começam a realizar esse programa não compreendem o carácter inevitável dessa conclusão. A actividade política tem a sua lógica, independente da consciência daqueles que, com as melhores intenções do mundo, ou apelam ao terror, ou pedem que se confira à própria luta económica um carácter político. O inferno está cheio de gente de boas intenções e, neste caso, as boas intenções não impedem que as pessoas se deixem seduzir pela "lei do mínimo esforço", pela linha do programa puramente burguês do Credo. De facto, não é por acaso que muitos liberais russos – liberais declarados, ou liberais que trazem a máscara do marxismo – simpatizam de todo o coração com o terrorismo e esforçam-se, no momento actual, por apoiar o crescimento da mentalidade terrorista.
O aparecimento do "Grupo Socialista-Revolucionário Svoboda", que atribui a si próprio a tarefa de ajudar, através de todos os meios, o movimento operário, mas que inscreveu no seu programa o terrorismo e, por assim dizer, emancipou-se da social-democracia, confirmou uma vez mais a notável clarividência de P. Axeldrov que, já no final de 1897, previra com toda a exactidão esse resultado das flutuações da social-democracia ("A propósito dos objectivos actuais e da táctica"), e esboçou as suas célebres "Duas Perspectivas". Todas as discussões e divergências ulteriores entre os sociais-democratas russos estão contidas, como a planta na semente, nessas duas perspectivas.
A partir daí concebe-se que o Rabótcheie Dielo não tenha resistido à espontaneidade do "economismo", nem tenha podido resistir à espontaneidade do terrorismo. É interessante notar a argumentação original com que a Svoboda apoia o terrorismo. Nega completamente o papel de intimidação do terror (Renascimento do Revolucionismo, p. 64); mas por outro lado valoriza o seu "carácter excitativo". Isto é característico, em primeiro lugar, de uma das fases da desagregação e da decadência do círculo tradicional de ideias (pré-social-democrata) que fazia que se mantivesse a ligação com o terrorismo. Admitir que agora é impossível "intimidar" e, por conseguinte, desorganizar o governo através do terrorismo, significa, no fundo, condenar completamente o terrorismo como método de luta, como esfera de actividade consagrada por um programa. Em segundo lugar, o que ainda é mais característico, como exemplo de incompreensão das nossas tarefas prementes no que diz respeito à "educação da actividade revolucionária das massas", a Svoboda prega o terrorismo como meio de "excitar" o movimento operário, de imprimir-lhe um impulso vigoroso. Seria difícil imaginar uma argumentação que se refutasse a si própria com mais evidência! Pergunta-se: haveria, portanto, tão poucos factos escandalosos na vida russa para ser preciso inventar meios especiais de "excitação"? Por outro lado, é evidente que aqueles que não se excitam, nem são excitáveis mesmo pela arbitrariedade russa, observarão da mesma forma, "cruzando os braços", o duelo do governo com um punhado de terroristas. Ora, são exactamente as massas operárias que estão bastante excitadas pelas infâmias da vida russa, mas somos nós que não sabemos recolher, se é possível falar assim, e concentrar todas as gotas e todos os pequenos córregos da efervescência popular, que a vida russa verte em quantidade infinitamente maior do que imaginamos ou acreditamos, e que é preciso reunir numa única torrente gigantesca. Que isso é realizável, prova-o incontestavelmente o impulso prodigioso do movimento operário e a sede, já assinalada anteriormente, que os operários manifestam pela literatura política. Por isso, os apelos ao terrorismo, bem como os apelos para conferir à própria luta económica um carácter político, são apenas pretextos diferentes para se fugir ao dever mais imperioso dos revolucionários russos: organizar a agitação política sob todas as suas formas. A Svoboda quer substituir a agitação pelo terrorismo, reconhecendo abertamente que "desde que uma agitação enérgica e intensa atraia as massas, o papel excitativo do terror terá fim" (p. 68 do Renascimento do Revolucionarismo). Isto mostra precisamente que terroristas e "economistas" subestimam a actividade revolucionária das massas, a despeito do testemunho evidente dos acontecimentos da primavera. Uns lançam-se à procura de "excitantes" artificiais, outros falam de "reivindicações concretas". Tanto uns como outros não prestam atenção suficiente ao desenvolvimento de sua própria actividade em matéria de agitação política e de organização de revelações políticas. E não há nada que possa substituir isso, nem agora, nem em qualquer outro momento.
Dissemos que era necessário desenvolver o nosso movimento, infinitamente maior e mais profundo que aquele de 1870-1880, com o mesmo espírito de decisão e a mesma energia sem limites. De facto, até ao presente parece que ninguém ainda duvidou de que a força do movimento actual está no despertar das massas (e principalmente do proletariado industrial), e de que a sua fraqueza reside na falta de consciência e de espírito de iniciativa dos dirigentes revolucionários.
Nestes últimos tempos, contudo, foi feita uma descoberta espantosa, que ameaça subverter todas as ideias adquiridas sobre este ponto. Esta descoberta é obra do Rabótcheie Dielo que, na sua polémica com o Iskra e a Zaria, não se limitou a objecções particulares e tentou reconduzir o "desacordo geral" à sua raiz mais profunda: a uma "apreciação diferente da importância relativa do elemento espontâneo e do elemento conscientemente metódico". A tese de acusação do Rabótcheie Dielo expressa-se da seguinte forma: "subestimação da importância do elemento objectivo ou espontâneo do desenvolvimento"[1]. Ao que respondemos: essa tese é tão significativa que, se a polémica com o Iskra e a Zaria não tivesse outro resultado senão o de levar o Rabótcheie Dielo a descobrir esse "desacordo geral", esse resultado, por si só, dar-nos-ia grande satisfação, pois esclarece nitidamente o fundo das divergências teóricas e políticas que dividem, hoje, os social-democratas russos.
Além disso, a questão das relações entre a consciência e a espontaneidade tem um enorme interesse geral, e exige um estudo detalhado.
a) Ascensão do espontaneísmo
No capítulo anterior assinalámos o entusiasmo generalizado da juventude russa instruída pela teoria marxista, por volta de 1895. Foi também nessa mesma época, que as greves operárias, após a famosa guerra industrial de 1896 em Petersburgo, se revestiram de um carácter geral. A sua expansão por toda a Rússia atestava claramente a profundidade do movimento popular que de novo surgia, e se falamos do "elemento espontâneo", é certamente nesse movimento de greves que devemos, antes de tudo, considerá-lo. Mas, há espontaneidade e espontaneidade. Houve, na Rússia, greves nas décadas de 1870 e 1880 (e mesmo na primeira metade do século XIX), que foram acompanhadas da destruição "espontânea" de máquinas etc. Comparadas a esses "tumultos", as greves após 1890 poderiam mesmo ser qualificadas de "conscientes", tal foi o progresso do movimento operário nesse intervalo. Isto mostra-nos que o "elemento espontâneo", no fundo, não é senão a forma embrionária do consciente. Os tumultos primitivos já traduziam um certo despertar da consciência: os operários, perdiam a sua crença costumeira na perenidade do regime que os oprimia; começavam... não direi a compreender, mas a sentir a necessidade de uma resistência colectiva, e rompiam deliberadamente com a submissão servil às autoridades. Era, portanto, mais uma manifestação de desespero e de vingança que de luta. As greves após 1890 mostram-nos melhor a emersão da consciência: formulam-se reivindicações precisas, procura-se prever o momento favorável, discutem-se certos casos e exemplos de outras localidades etc. Se os tumultos constituíam simplesmente a revolta dos oprimidos, as greves sistemáticas já eram o embrião, mas nada além do embrião, da luta da classe. Tomadas em si mesmas, essas greves constituíam uma luta sindical, mas não ainda social-democrata; marcavam o despertar do antagonismo entre operários e patrões; porém, os operários não tinham, e não podiam ter, consciência da oposição irredutível dos seus interesses a toda a ordem política e social existente, isto é, a consciência social-democrata. Nesse sentido, as greves após 1890, apesar do imenso progresso que representaram em relação aos "tumultos", continuavam a ser um movimento essencialmente espontâneo.
Os operários, já dissemos, não podiam ter ainda a consciência social-democrata. Esta só podia chegar até eles a partir de fora. A história de todos os países atesta que, pelas próprias forças, a classe operária não pode chegar senão à consciência sindical, isto é, à convicção de que é preciso unir-se em sindicatos, conduzir a luta contra os patrões, exigir do governo essas ou aquelas leis necessárias aos operários etc.[2] Quanto à doutrina socialista, esta nasceu das teorias filosóficas, históricas, económicas elaboradas pelos representantes instruídos das classes proprietárias, pelos intelectuais. Os fundadores do socialismo científico contemporâneo, Marx e Engels, pertenciam eles próprios, pela sua situação social, aos intelectuais burgueses. Da mesma forma, na Rússia, a doutrina teórica da social-democracia surgiu de maneira completamente independente do crescimento espontâneo do movimento operário; foi o resultado natural, inevitável do desenvolvimento do pensamento entre os intelectuais revolucionários socialistas. A época de que falamos, isto é, por volta de 1895, essa doutrina constituía não apenas o programa perfeitamente estabelecido do grupo "Libertação do Trabalho", mas também conquistara para si a maioria da juventude revolucionária da Rússia.
Assim, houve ao mesmo tempo um despertar espontâneo das massas operárias, despertar para a vida consciente e para a luta consciente, e uma juventude revolucionária que, armada da teoria social-democrata, buscava aproximar-se dos operários. Quanto a isso, é particularmente importante estabelecer este facto esquecido com frequência (e relativamente pouco conhecido), de que os primeiros social-democratas desse período, que se dedicavam com ardor à agitação económica (contando, para isso, com as indicações verdadeiramente úteis do folheto "Sobre a Agitação", à época ainda manuscrito) longe de considerar essa agitação como sua tarefa única, atribuíam desde o começo à social-democracia russa as grandes tarefas históricas, em geral, e a tarefa do derrube da autocracia, em particular. Assim, o grupo dos social-democratas de Petersburgo, que fundou a "União de Luta para Libertação da Classe Operária" redigiu, já em fins de 1895, o primeiro número de um jornal intitulado Rabótcheie Dielo. Pronto para ser impresso, esse número foi apreendido pela polícia numa busca efectuada na noite de 8 para 9 de Dezembro de 1895, em casa de um dos membros do grupo, Anatoly Alexeyevich Vaneyey [3], de forma que o Rabótcheie Dielo do primeiro período não pôde ver a luz do dia. O editorial desse jornal (que, talvez, em trinta anos uma revista como a Russkaia Starina exumará dos arquivos do departamento da polícia) expunha as tarefas históricas da classe operária na Rússia, entre as quais se colocava em primeiro plano a conquista da liberdade política. Seguiam-se um artigo, "Em que pensam os nossos ministros?" sobre o saque dos Comités de instrução elementar pela polícia, bem como uma série de artigos de correspondentes, não só de Petersburgo, como de outras localidades da Rússia (por exemplo, sobre um massacre de operários na província de Iaroslavl). Assim, se não me engano, esse "primeiro ensaio" dos social-democratas russos de 1890-1900 não era um jornal estritamente local, e ainda menos de carácter "económico", visava unir a luta grevista ao movimento revolucionário dirigido contra a autocracia e levar todos os oprimidos, vítimas da política do obscurantismo reaccionário, a apoiar a social-democracia. E para quem quer que conheça um pouco o estado do movimento nessa época, está fora de dúvida que um jornal como esse encontrou toda a simpatia dos operários da capital e dos intelectuais revolucionários, e teve a maior difusão. O fracasso do empreendimento provou simplesmente que os social-democratas de então eram incapazes de corresponder às exigências do momento, por falta de experiência revolucionária e de preparação prática. O mesmo se deve dizer do Rabótchaia Listok de São Petersburgo, e sobretudo da Rabótchaia Gazeta e do Manifesto do Partido Operário Social-Democrata da Rússia, fundado na Primavera de 1898. Subentenda-se que não nos passa pela cabeça a ideia de censurar os militantes da época pela sua falta de preparação. Mas, para aproveitar a experiência do movimento e daí extrair lições práticas, é preciso considerar em toda a extensão as causas e a importância deste ou daquele erro. Por isso, é extremamente importante estabelecer que uma parte (talvez mesmo a maioria) dos social-democratas militantes de 1895-1898 considerava, com justa razão, possível naquela época, mesmo no começo do movimento "espontâneo", preconizar um programa e uma táctica de combate mais extensos[4]. Ora, a falta de preparação entre a maior parte dos revolucionários, sendo um fenómeno perfeitamente natural, não podia dar lugar a qualquer apreensão particular. A partir do momento em que as tarefas eram bem definidas; a partir do momento em que se possuía suficiente energia para tentar de novo realizá-las, os fracassos momentâneos constituíam apenas meio mal. A experiência revolucionária e a habilidade de organização são coisas que se adquirem. É preciso apenas desenvolver em nós mesmos as qualidades necessárias! É preciso que tenhamos consciência dos nossos defeitos, o que, no trabalho revolucionário, já é mais que meio caminho para os corrigir.
Mas, o que era meio mal tornou-se um mal verdadeiro, quando esta consciência começou a obscurecer-se (porém, ela era bastante viva entre os militantes dos grupos acima mencionados), quando surgiram pessoas – e mesmo órgãos social-democratas – prontas a erigir os defeitos em virtudes, e tentando mesmo justificar teoricamente a sua idolatria, o seu culto do espontâneo. É tempo de fazer o balanço dessa tendência, caracterizada de maneira muito inexacta pelo termo "economismo", demasiado estreito para exprimir o seu conteúdo.
b) O culto da espontaneidade. "Rabótchaia Mysl"
Antes de passar às manifestações literárias desse culto, assinalaremos o seguinte facto característico (cuja fonte foi acima mencionada) de um desacordo entre as duas futuras tendências da social-democracia russa que lança uma certa luz sobre o seu nascimento e o seu crescimento entre os camaradas militantes de Petersburgo. No início de 1897, A. Vaneiev e alguns dos seus camaradas tiveram ocasião de participar, antes da sua partida para o exílio, de uma reunião privada, onde se encontraram os "velhos" e os "jovens " membros da "União de Luta para a Libertação da Classe Operária". A conversa girou principalmente sobre a organização e, em particular, sobre os "estatutos das caixas operárias", publicados sob a forma definitiva no número 9-10 do Listok “Rabotnika” (p. 46). Entre os "velhos" (os "dezembristas", como eram chamados em tom de gracejo pelos social-democratas de Petersburgo) e alguns dos "jovens" (que mais tarde colaboraram activamente na Rabótchaia Mysl) manifestou-se logo uma divergência muito nítida, e estabeleceu-se uma ardente polémica. Os "jovens" defendiam os princípios essenciais desses estatutos, tais como tinham sido publicados. Os "velhos" diziam que não era isso o que se colocava em primeiro lugar; que era preciso, inicialmente, consolidar a "União de Luta" para dela fazer uma organização de revolucionários, à qual estariam subordinadas as diversas caixas operárias, os círculos de propaganda entre a juventude das escolas etc. Bem entendido, as duas partes estavam longe de ver nessa divergência o germe de um desacordo; ao contrário, consideravam-na isolada e acidental. Esse facto, porém, mostra que o nascimento e a difusão do "economismo" na Rússia não se fizeram igualmente sem luta contra os "velhos" social-democratas (o que os "economistas" de hoje frequentemente esquecem). E se essa luta não deixou, na maior parte dos casos, traços "documentais", é unicamente porque a composição dos círculos em actividade mudava com incrível rapidez, porque não se estabelecera qualquer tradição e porque, em consequência, as divergências de pontos de vista não foram registadas em qualquer documento.
O aparecimento da Rabótchaia Mysl trouxe o "economismo" para a luz do dia, porém tal não se deu imediatamente. É preciso ter, uma ideia concreta das condições de trabalho e da breve existência de numerosos círculos russos (ora, só quem passou por isso, pode ter ideia exacta das coisas), para compreender quanto teve de fortuito o sucesso ou o fracasso da nova tendência nas diferentes cidades, e a impossibilidade absoluta em que durante muito tempo se encontravam os partidários e os adversários dessa "nova" tendência, de determinar se era realmente uma tendência distinta ou simplesmente a expressão da falta de preparação de alguns. Assim, os primeiros números policopiados da Rabótchaia Mysl permaneceram completamente desconhecidos da imensa maioria dos social-democratas, e se agora temos a possibilidade de nos referir ao editorial do seu primeiro número, é unicamente porque tal editorial foi reproduzido no artigo de V.I. (Listok "Rabótnika", n.º 9-10, p. 47 e seg.), que evidentemente não deixou de louvar com empenho – com empenho inconsiderado – esse novo jornal tão nitidamente diferente dos jornais e projectos de jornais acima citados[5]. Ora, esse editorial exprime com tanto relevo todo o espírito da Rabótchaia Mysl e do "economismo" em geral, que vale a pena determo-nos aí.
Após ter indicado que o braço fardado de azul não deteria jamais o progresso do movimento operário, o editorial prossegue: "... O movimento operário deve a sua vitalidade ao facto de ser o próprio operário a encarregar-se da sua sorte, arrancando-a das mãos dos seus dirigentes." Esta tese fundamental é, em seguida, desenvolvida nos seus detalhes. Na realidade, os dirigentes (isto é, os social-democratas organizadores da "União de Luta") foram arrancados pela polícia, por assim dizer, das mãos dos operários[6], e querem fazer-nos acreditar que os operários conduziam a luta contra os dirigentes e se libertavam do seu jugo! Em lugar de estimular a marcha para a frente, de consolidar a organização revolucionária e de ampliar a actividade política, incitou-se o retrocesso em direcção à luta exclusivamente sindical. Proclamou-se que "a base económica do movimento está obscurecida pela tendência a jamais esquecer o ideal político", que o lema do movimento operário é "a luta pela situação económica" (!) ou, melhor ainda, "os operários pelos operários"; declarou-se que as caixas de greve "valem mais para o movimento do que uma centena de outras organizações" (que se compare esta afirmação, feita em Outubro de 1897, com a disputa dos "dezembristas" com os jovens, no inicio de 1897) etc. Frases como: é preciso colocar em primeiro plano, não a "nata" dos operários, mas o operário "médio", o operário das fileiras; ou como: "O político segue sempre docilmente o económico"[7] etc. etc., entraram na moda e exerceram influência sobre a massa dos jovens seduzidos pelo movimento e que, na maioria, não conheciam senão fragmentos do marxismo, tal como era exposto legalmente.
Isto constituiu o completo aniquilamento da consciência pela espontaneidade – pela espontaneidade dos "social-democratas" que repetiam as "ideias" do Senhor V.V., a espontaneidade dos operários seduzidos pelo argumento de que mesmo um aumento de um copeque por rublo valia mais que todo socialismo e toda política, de que deviam "lutar sabendo que o faziam não por remotas gerações futuras mas por eles próprios e pelos seus filhos" (editorial do n.º 1 da Rabótchaia Mysl). As frases desse género foram sempre a arma preferida dos burgueses do Ocidente que, odiando o socialismo, trabalhavam (como Hirsch, o "social-político" alemão) para transplantar para os seus países o sindicalismo inglês, e diziam aos operários que a luta exclusivamente sindical[8] é uma luta por eles próprios e pelos seus filhos, e não por remotas gerações futuras com vistas a um incerto socialismo futuro. E agora os "V.V. da social-democracia russa" põem-se a repetir essas frases burguesas. Aqui, é importante assinalar três pontos que nos serão de grande utilidade para a continuação da nossa análise sobre as divergências actuais.[9]
Em primeiro lugar, o aniquilamento da consciência pela espontaneidade, de que falamos, também se deu de maneira espontânea. Isto parece um jogo de palavras, mas infelizmente é uma verdade amarga. O que provocou esse aniquilamento não foi uma luta declarada entre duas concepções absolutamente opostas, nem a vitória de uma sobre a outra, mas o desaparecimento de um número cada vez maior de "velhos" revolucionários "colhidos" pela polícia, e a entrada em cena, cada vez mais frequente, dos "jovens" "V.V. da social-democracia russa". Quem quer que tenha, não direi participado do movimento russo contemporâneo, mas simplesmente respirado o seu ar, sabe perfeitamente que esta é precisamente a situação. E se, apesar disso, insistimos particularmente para que o leitor considere com cuidado esse facto conhecido de todos, se para maior evidência referimo-nos, de algum modo, aos dados sobre o Rabótcheie Dielo do primeiro período, e sobre a discussão entre "jovens" e "velhos" no início de 1897, é porque as pessoas que se gabam de "espírito democrático" especulam sobre a ignorância desse facto pelo grande público (ou entre os adolescentes). Mais adiante, ainda voltaremos a esse ponto.
Em segundo lugar, desde a primeira manifestação literária do "economismo" podemos observar um fenómeno eminentemente original e extremamente característico para a compreensão de todas as divergências entre social-democratas da actualidade: os partidários do "movimento puramente operário", os adeptos da ligação mais estreita e mais "orgânica" (expressão do Rab. Dielo) com a luta proletária, os adversários de todos os intelectuais não operários (ainda que fossem intelectuais socialistas) foram obrigados, para defender sua posição, a recorrer aos argumentos burgueses "exclusivamente sindicais". Isto nos mostra que, desde o princípio, a Rabótchaia Mysl começara – insistentemente – a realizar o programa do Credo. Isto mostra (o que não pode chegar a compreender o Rabótcheie Dielo), que qualquer culto da espontaneidade do movimento operário, qualquer diminuição do papel do "elemento consciente", do papel da social-democracia significa – quer se queira, quer não – um reforço da influência da ideologia burguesa entre os operários. Todos aqueles que falam de "sobrestimação da ideologia"[10], de exagero do papel do elemento consciente[11] etc., imaginam que o movimento puramente operário é, por si próprio, capaz de elaborar, e irá elaborar para si, uma ideologia independente, com a única condição de que os operários "arranquem sua sorte das mãos de seus dirigentes". Mas, isto constitui um erro profundo. Para completar o que dissemos acima, citaremos ainda as palavras profundamente justas e significativas de K. Kautsky, a propósito do projecto do novo programa do partido social-democrata austríaco[12].
"Muitos dos nossos críticos revisionistas atribuem a Marx a afirmação de que o desenvolvimento económico e a luta de classes não somente criam as condições da produção socialista, mas engendram directamente a consciência (o enigma é de K.K.) da sua necessidade. E eis que esses críticos objectam que a Inglaterra, país do mais avançado desenvolvimento capitalista, está mais alheia do que qualquer outro país a essa consciência. O projecto do programa leva a crer que a comissão que elaborou o programa austríaco partilha, também, desse ponto de vista dito marxista ortodoxo, que refuta o exemplo da Inglaterra. O projecto afirma: "Quanto mais o proletariado aumenta em consequência do desenvolvimento capitalista, mais é obrigado e tem a possibilidade de lutar contra o capitalismo. O proletariado adquire a "consciência" da possibilidade e da necessidade do socialismo. Por conseguinte, a consciência socialista constituirá o resultado necessário, directo da luta proletária de classe. Ora, isto é inteiramente falso. Como doutrina, o socialismo evidentemente tem as suas raízes nas relações económicas actuais, da mesma forma que a luta de classe do proletariado; do mesmo modo que esta última, resulta da luta contra a pobreza e a miséria das massas, provocadas pelo capitalismo. Mas o socialismo e a luta de classe surgem paralelamente e um não engendra o outro; surgem de premissas diferentes. A consciência socialista de hoje não pode surgir senão na base de um profundo conhecimento científico. De facto, a ciência económica contemporânea constitui tanto uma condição da produção socialista como, por exemplo, a técnica moderna, e, apesar de todo o seu desejo, o proletariado não pode criá-las; ambas surgem do processo social contemporâneo. Ora, o portador da ciência não é o proletariado, mas os intelectuais burgueses (o enigma é de KA.): foi do cérebro de certos indivíduos dessa categoria que nasceu o socialismo contemporâneo, e foram eles que o transmitiram aos proletários intelectualmente mais evoluídos, que o introduziram, em seguida, na luta de classe do proletariado onde as condições o permitiram. Assim, pois, a consciência socialista é um elemento importado de fora (von Aussenhineigetranes) da luta de classe do Proletariado, e não algo que surgiu espontaneamente (ur wüchsig). Também o antigo programa de Heinfeld dizia, muito justamente, que a tarefa da social-democracia é introduzir no proletariado (literalmente: preencher o proletariado com) a consciência da sua situação e a consciência da sua missão. Não seria necessário fazê-lo se essa consciência emanasse naturalmente da luta da classe. Ora, o novo projecto abandonou essa tese do antigo programa e juntou-se à tese acima citada. O que interrompeu completamente o curso do pensamento...
No momento, não seria possível falar de uma ideologia independente, elaborada pelas próprias massas operárias no curso de seu movimento[13], o problema coloca-se exclusivamente assim: ideologia burguesa ou ideologia socialista. Não há meio-termo (pois a humanidade não elaborou uma "terceira" ideologia; e, além disso, numa sociedade dilacerada pelos antagonismos de classe não seria possível existir uma ideologia à margem ou acima dessas classes). Por isso, qualquer diminuição da ideologia socialista, qualquer distanciamento dela implica o fortalecimento da ideologia burguesa. Fala-se de espontaneidade. Mas o desenvolvimento espontâneo do movimento operário resulta justamente na subordinação à ideologia burguesa, efectua-se justamente segundo o programa do "Credo", pois o movimento operário espontâneo é o sindicalismo, a Nur-Gewerkschafilerei: ora, o sindicalismo é justamente a escravidão ideológica dos operários pela burguesia. Por isso, nossa tarefa, a da social-democracia, é combater a espontaneidade, desviar o movimento operário dessa tendência espontânea que apresenta o sindicalismo, de se refugiar sob as asas da burguesia, e atraí-lo para a social-democracia revolucionária. Por conseguinte, a frase dos autores da carta "económica" do n.º 12 do Iskra, afirmando que todos os esforços dos mais inspirados ideólogos não poderão desviar o movimento operário do caminho determinado pela acção recíproca dos elementos materiais e do meio material, equivale exactamente a abandonar o socialismo, e se esses autores fossem capazes de meditar no que dizem, até às ultimas consequências, com lógica e destemor, como deve fazer quem se dedica ao campo da acção literária e social, não lhes restaria senão cruzar sobre o peito vazio os seus braços inúteis e... deixar o campo livre aos senhores Struve e Prokopovitch, que arrastam o movimento operário "no sentido do mínimo esforço", isto é, no sentido do sindicalismo burguês, ou aos senhores Zubatov, que o arrastam no sentido da "ideologia" clérigo-policial.
Recorde-se o caso da Alemanha. Qual foi o mérito histórico de Lassalle diante do movimento operário alemão? Foi ter desviado este movimento do caminho do sindicalismo progressista e do cooperativismo, para onde se dirigia espontaneamente (com a ajuda benévola dos Schulze-Delitzsch e consortes). Para realizar essa tarefa, foi preciso mais do que frases a respeito da subestimação do elemento espontâneo, sobre a táctica-processo, sobre a acção recíproca dos elementos e do meio etc. Para isso foi preciso uma luta encarniçada contra a espontaneidade, e só após essa luta de longos e longos anos é que se chegou, por exemplo, a fazer da população operária de Berlim o baluarte do partido progressista, uma das melhores cidadelas da social-democracia. E esta luta está ainda longe de terminar (como poderiam supor os estudiosos da história do movimento alemão através de Prokopovitch, e da filosofia desse movimento através de Struve). Ainda agora, a classe operária alemã está dividida, se assim se pode dizer, entre diversas ideologias: uma parte dos operários está agrupada nos sindicatos operários católicos e monarquistas; outra, nos sindicatos Hirsch-Duncker, fundados pelos admiradores burgueses do sindicalismo inglês; uma terceira, nos sindicatos social-democratas. Esta última parte é infinitamente mais numerosa que todas as outras, mas a ideologia social-democrática não pode obter, e não poderá conservar essa supremacia, senão através de uma luta incansável contra todas as outras ideologias.
Mas, por que – perguntará o leitor – o movimento espontâneo, que se dirige para o sentido do mínimo esforço, conduz exactamente à dominação pela ideologia burguesa? Pela simples razão de que, cronologicamente, a ideologia burguesa é muito mais antiga que a ideologia socialista, está completamente elaborada e possui meios de difusão infinitamente maiores[14]. Quanto mais jovem for o movimento socialista num país, mais energicamente terá que lutar contra todas as tentativas feitas para consolidar a ideologia não socialista; tanto mais resolutamente será preciso colocar os operários em guarda contra os maus conselheiros que gritam contra a "sobrestimação do elemento consciente" etc. Com o Rabótcheie Dielo, os autores da carta económica gritam em uníssono contra a intolerância própria da infância do movimento. A isto responderemos: de facto, o nosso movimento ainda está na sua infância, e para atingir a sua virilidade deve justamente imbuir-se de intolerância em relação àqueles que, através do culto da espontaneidade, retardam o seu desenvolvimento. Nada há de mais ridículo e de mais prejudicial para se colocar ao velho militante que, há muito, já passou por todas as fases decisivas da luta!
Em terceiro lugar, o primeiro número da Rabótchaia Mysl mostra-nos que a denominação de "economismo" (à qual, evidentemente, não temos intenção de renunciar, pois de qualquer modo este vocábulo já adquiriu direito de ser citado) não traduz com exactidão suficiente o fundo da nova tendência. A Rabótchaia Mysl não nega completamente a luta política: os estatutos da caixa que publica no seu primeiro número falam da luta contra o governo. A Rabótchaia Mysl considera somente que "o político segue sempre docilmente o económico". (E o Rabótcheie Dielo dá uma variação dessa tese, afirmando no seu programa que "na Rússia, mais que em qualquer outro país, a luta económica é inseparável da luta política"). Essas teses da Rabótchaia Mysl e do Rabótcheie Dielo são absolutamente falsas, se por política se entende a política social-democrata. Com muita frequência, a luta económica dos operários, como já vimos, está ligada, (não de forma indissolúvel, é verdade) à política burguesa, clerical, ou outra. As teses do Rabótcheie Dielo são justas, se por política se entende a política sindical, isto é, a aspiração geral dos operários a obter do Estado as medidas susceptíveis de remediar os males inerentes à sua situação, mas, que não suprimem tal situação, isto é, não suprimem a submissão do trabalho ao capital. Essa aspiração é, de facto, comum aos sindicalistas ingleses hostis ao socialismo, aos operários católicos e aos operários "de Zubatov", etc. Há política e política. Assim, pois, vemos que a Rabótchaia Mysl, mesmo no que concerne à luta política, mais do que repudiá-la, inclina-se diante da sua espontaneidade, da sua inconsciência. Reconhecendo inteiramente a luta política que surge espontaneamente do próprio movimento operário (ou, mais ainda: os anseios e reivindicações políticas dos operários) recusa-se por completo a elaborar ela própria uma política social-democrata específica, que responda às tarefas gerais do socialismo nas condições russas actuais. Mais adiante mostraremos que esta também é a falta cometida pelo Rabótcheie Dielo.
c) O grupo da Auto-libertação e o "Rabótcheie Dielo"
Se analisamos com tantos detalhes o editorial pouco conhecido e hoje quase esquecido do primeiro número da Rabótchaia Mysl é porque ele foi o primeiro a expressar de forma relevante a corrente geral, que mais tarde surgiria à luz do dia sob a forma de uma infinidade de riachos. V. I. tinha absoluta razão quando, louvando esse primeiro número e esse editorial da Rabótchaia Mysl, constatou "a (sua) veemência e o seu ardor" (Listok “Rabotnika” n.º 9-10, p. 49). Qualquer homem de convicções firmes, que acredita trazer algo de novo quando escreve com "ardor", coloca em relevo o seu ponto de vista. Somente aqueles habituados a permanecer sentados entre duas cadeiras carecem de "ardor"; somente estes, após terem elogiado, ontem, o ardor da Rabótchaia Mysl, são capazes, hoje, de censurar o "ardor polémico" dos seus adversários.
Sem nos determos no "suplemento especial da Rabótchaia Mysl (a seguir, teremos de nos referir, por diferentes motivos, a essa obra que expõe com a maior lógica as ideias dos "economistas"), limitamo-nos a assinalar sumariamente o "Apelo do Grupo da Auto-libertação dos Operários" (Março de 1899, reproduzido no Nakanune de Londres, n.º 7, Julho de 1899). Os autores deste apelo dizem, com toda a razão, que "a Rússia operária, que apenas começa a sacudir-se do seu torpor e a olhar à sua volta, apega-se instintivamente aos primeiros meios de luta que se lhe oferecem", mas daí tiram a mesma conclusão errónea que a Rabótchaia Mysl, esquecendo-se que o instintivo é exactamente o inconsciente (o espontâneo), em ajuda do qual devem correr os socialistas; que os "primeiros" meios de luta "que se lhe oferecem" serão sempre, na sociedade contemporânea, os meios sindicalistas de luta e a "primeira" ideologia, a ideologia burguesa (sindicalista). Esses autores não "negam" mais a política, dizem somente (somente!), de acordo com o Senhor V. V., que a política é uma superstrutura e que, por conseguinte, "a agitação política deve ser a superstrutura da agitação em favor da luta económica, que deve surgir no campo dessa luta e marchar atrás dela".
Quanto ao Rabótcheie Dielo, começou sua actividade directamente pela "defesa" dos "economistas". Após ter enunciado uma contra verdade manifesta declarando desde o seu primeiro número (n.º 1, p. 141-142) "ignorar a que jovens camaradas se referia Axelrod", que no seu conhecido folheto[15] fazia uma advertência aos "economistas", o Rabótcheie Dielo teve, no curso de sua polémica com Axelrod e Plekhanov a propósito dessa contraverdade, de reconhecer que "simulando não saber de quem se tratava, desejava defender todos os jovens social-democratas do estrangeiro contra essa acusação injusta" (a acusação de estreiteza de Axelrod aos "economistas"). Na realidade, esta acusação era perfeitamente justa, e o Rabótcheie Dielo sabia muito bem que ela visava, entre outros, V. I., membro da sua redacção. Notarei de passagem, a esse respeito, que na polémica em questão Axelrod tinha inteira razão, e o Rabótcheie Dielo estava completamente errado na interpretação do meu trabalho, "As Tarefas dos Social-Democratas Russos". Este trabalho foi escrito em 1897, ainda antes do aparecimento da Rabótchiai Mysl quando eu considerava, com toda a razão, que a tendência inicial da "União de Luta" de São Petersburgo, tal como a caracterizei acima, era a predominante. Efectivamente, esta tendência foi preponderante pelo menos até meados de 1898. Ademais, o Rabótcheie Dielo não fora inutilmente fundado para desmentir a existência e o perigo do "economismo", para se referir a um trabalho que expunha os pontos de vista que foram suplantados em São Petersburgo, em 1897-1898, pelos "economistas"?[16]
Mas, o Rabótcheie Dielo não apenas "defendia" os "economistas"; também incorria, ele próprio, constantemente nos seus principais erros. O que se encontrava na origem desse desvio, era a interpretação ambígua da seguinte tese do seu programa: "O fenómeno essencial da vida russa, designado principalmente para definir as tarefas (o escrito é nosso) e o carácter da actividade literária da "União", é, em nossa opinião, o movimento operário de massas (escrito pelo Rabótcheie Dielo), que surgiu esses últimos anos". Está fora de discussão, que o movimento de massas seja um fenómeno muito importante. Mas, a questão é saber como compreender a "definição das tarefas" para esse movimento de massas. Pode ser compreendida de duas maneiras: ou nos inclinamos diante da espontaneidade desse movimento, isto é, reconduzimos o papel da social-democracia ao de um simples criado do movimento operário como tal (assim o entendem o Rabótchaia Mysl o "Grupo da Auto-libertação" e os outros "economistas"); ou admitimos que o movimento de massas nos impõe novas tarefas teóricas, políticas e de organização, muito mais complexas do que aquelas com que podíamos contentar-nos antes do aparecimento do movimento de massas. O Rabótcheie Dielo sempre tendeu, e tende, precisamente para a primeira interpretação; jamais falou com precisão de novas tarefas, e sempre raciocinou como se esse "movimento de massas" nos eximisse da necessidade de conceber com nitidez e de realizar as tarefas que ele impõe. Será suficiente indicar que, o Rabótcheie Dielo julgou impossível atribuir como primeira tarefa do movimento operário de massas o derrube da autocracia, tarefa que rebaixou (em nome do movimento de massas) ao nível da luta pelas reivindicações políticas imediatas ("Resposta", p. 25).
Deixando de lado o artigo de B. Krítchévski, redactor-chefe do Rabótcheie Dielo – "A Luta Económica e Política no Movimento Russo" – aparecido no número 7, artigo onde se encontram os mesmos erros[17], passaremos directamente ao número 10 do Rabótcheie Dielo. É claro que não examinaremos uma a uma as objecções de B. Kritchévski e de Martynov contra a Zaria e o Iskra. O que nos interessa aqui, é unicamente a posição de princípio adoptada pelo Rabótcheie Dielo no seu número 10. Assim, não examinaremos o facto curioso, de o Rabótcheie Dielo ver uma "contradição fundamental" entre a tese seguinte:
"A social-democracia não une as mãos, não limita sua actividade a um plano preconcebido ou a um procedimento de luta política preestabelecido; admite todos os meios de luta, contanto que correspondam às forças disponíveis do Partido", etc. (Iskra n.º 1)
e esta tese:
"...sem uma organização sólida, habilitada à luta política em todas as circunstâncias e em todos os períodos, não seria possível sequer falar desse plano de acção sistemática estabelecido à luz de princípios severos, e seguido sem fraquejamentos, o único a merecer o nome de táctica" (Iskra, n.º 4).
Confundir por princípio o reconhecimento de todos os meios, de todos os planos e procedimentos da luta, desde que sejam racionais, com a necessidade de se guiar num determinado momento político a partir de um plano rigorosamente aplicado, se se quer falar de táctica, equivaleria a confundir o reconhecimento pela medicina de todos os sistemas de tratamento, com a necessidade de se ter de seguir um determinado sistema no tratamento de uma dada doença. Mas, é o próprio Rabótcheie Dielo que sofre da doença que denominamos o culto do espontâneo, sem querer admitir qualquer "sistema de tratamento" dessa doença. Ademais, fez esta descoberta notável, que "a táctica-plano contradiz o espírito fundamental do marxismo" (n.º 10, p. 18); que a táctica é "o processo de crescimento das tarefas do partido, que crescem ao mesmo tempo que ele" (p. 11, grifado pelo Rabótcheie Dielo). Esta última frase tem todas as possibilidades de se tornar famosa, um monumento indestrutível da "tendência" do Rabótcheie Dielo. À pergunta: "para onde ir?" este órgão dirigente responde: o movimento é o processo de variação de distância entre o ponto de partida e o ponto seguinte do movimento. Esta reflexão de incomparável profundidade não é apenas curiosa (não valeria a pena nela nos determos), constitui, ainda, o programa de toda uma tendência, programa que R. M. (no "Suplemento especial à Rabótchaia Mysl") expressou nestes termos: a luta é desejável se for possível; e é possível aquela que se trava num dado momento. É exactamente esta a tendência do oportunismo ilimitado, que se adapta passivamente à espontaneidade.
"A táctica-plano contradiz o espírito fundamental do marxismo!" Mas, isto é caluniar o marxismo, é convertê-lo numa caricatura análoga àquela que nos opunham os populistas na sua guerra contra nós. É, precisamente, rebaixar a iniciativa e a energia dos militantes conscientes, enquanto o marxismo, ao contrário, estimula enormemente a energia do social-democrata, abrindo-lhe as maiores perspectivas, pondo (se assim podemos dizer) à sua disposição as forças prodigiosas de milhões e milhões de operários que se preparam espontaneamente para a luta! Toda a história da social-democracia internacional fervilha de planos formulados por este ou aquele chefe político, planos que atestam a clarividência de alguns e a exactidão dos seu pontos de vista políticos e de organização, ou que revelam a miopia e os erros políticos de outros. Quando a Alemanha conheceu uma das maiores reviravoltas de sua história – a formação do Império, a abertura do Reichstag, a concessão do sufrágio universal – Liebknecht tinha um plano da política e da acção social-democrata em geral, e Schweitzer tinha outro. Quando a lei da excepção se abateu sobre os socialistas alemães, Most e Hasselmann tinham um plano: o apelo puro e simples à violência e ao terror; Höchberg, Schramm e (em parte) Bernstein tinham outro: os social-democratas tendo sido vítimas, pela sua violência insensata e seu revolucionarismo, da lei que os atingia, deviam agora, através de um comportamento exemplar, obter perdão; enfim, existia um terceiro plano: o dos homens que prepararam e realizaram a publicação de um órgão ilegal. Retrospectivamente, recuando muitos anos, após terminada a luta pela escolha do caminho a seguir, e agora que a história se pronunciou definitivamente sobre o valor da direcção escolhida, é claro que não é difícil manifestar profundidade declarando, sentenciosamente, que as tarefas do Partido crescem ao mesmo tempo que ele. Mas, nas horas de confusão[18], quando os "críticos" e "economistas" russos rebaixam a social-democracia ao nível do sindicalismo, e os terroristas pregam com ardor a adopção de uma "táctica-plano", que apenas retoma os erros antigos – ater-se em semelhante momento a tais frases é passar a si próprio um "certificado de indigência". No momento em que inúmeros social-democratas russos carecem exactamente de iniciativa e energia, de "extensão da propaganda, da agitação e da organização política", de "planos" para pôr em execução, de forma mais ampla, o trabalho revolucionário, dizer que "a táctica-plano[19] contradiz o espírito fundamental do marxismo" não é apenas aviltar teoricamente o marxismo mas praticamente puxar o Partido para trás.
“O social-democrata revolucionário, ensina-nos adiante o Rabótcheie Dielo, tem como tarefa unicamente acelerar, pelo seu trabalho consciente, o desenvolvimento objectivo, e não suprimi-lo ou substituí-lo por planos subjectivos. O Iskra, em teoria, conhece tudo isso. Mas a importância considerável que o marxismo atribui, com razão, ao trabalho revolucionário consciente, leva de facto o Iskra, em consequência de seu doutrinarismo em matéria de táctica, a subestimar o valor do elemento objectivo ou espontâneo do desenvolvimento" (p. 18).
Eis-nos, de novo, diante de uma confusão teórica extraordinária, digna dos senhores V. V. e consortes. Mas, perguntaremos ao nosso filósofo, em que pode consistir a "subestimação" do desenvolvimento objectivo para o autor de planos subjectivos? Evidentemente, em perder de vista o facto de que este desenvolvimento objectivo cria ou consolida, arruína ou enfraquece estas ou aquelas classes, categorias, grupos, essas ou aquelas nações, grupos de nações etc., determinando assim o aparecimento desse ou daquele agrupamento político internacional de forças, essa ou aquela posição dos partidos revolucionários etc. Mas, o erro desse autor será, então, de ter subestimado não o elemento espontâneo, mas, ao contrário, o elemento consciente, pois a ele terá faltado a "consciência" para uma justa compreensão do desenvolvimento objectivo. É por isso que somente o facto de se falar "da apreciação da importância relativa" (grifado pelo Rabótcheie Dielo) assinala uma ausência completa de "consciência". Se certos "elementos espontâneos do desenvolvimento" são acessíveis em geral à consciência humana, a apreciação errónea desses elementos equivalerá a uma "subestimação do elemento consciente". E se são inacessíveis à consciência, não os conhecemos, e não podemos falar deles. Que deseja, pois, B Kritchévski? Se considera errados os "planos subjectivos" do Iskra (e de facto os declara errados), deveria mostrar, precisamente, quais os factos objectivos que não são levados em conta por esses planos, e acusar o "Iskra" de falta de consciência, de "subestimação do elemento consciente", para utilizar sua linguagem. Mas, se descontente com os planos subjectivos, não tem outros argumentos senão os da "subestimação do elemento espontâneo" (!!), somente poderá provar através disso que: 1.º) teoricamente, compreende o marxismo à maneira dos Karéiev e dos Mikhailóvski, suficientemente escarnecidos por Beltov; 2.º) praticamente, está inteiramente satisfeito com os "elementos espontâneos do desenvolvimento", que arrastaram os nossos marxistas legais ao bernsteinismo e os nossos social-democratas ao "economismo", e que está "muito indignado" contra os que decidiram desviar, a qualquer custo, a social-democracia russa dos caminhos do desenvolvimento "espontâneo".
A seguir, aparecem coisas verdadeiramente divertidas. "Do mesmo modo que os homens, apesar de todo o progresso das ciências naturais, continuarão a multiplicar-se através de procedimentos ancestrais, do mesmo modo que o nascimento de uma nova ordem social, apesar de todo o progresso das ciências sociais e do aumento do número de combatentes, será sempre e sobretudo o resultado de explosões espontâneas. Da mesma forma que a sabedoria ancestral diz: a quem faltará inteligência para ter filhos? – também a sabedoria dos "socialistas modernos" (à maneira de NarcisseTuporilov) diz: para participar do nascimento espontâneo de uma nova ordem social, não faltará inteligência a ninguém. Também pensamos assim. Para participar dessa maneira, basta se laisser aller pelo "economismo", quando reina o "economismo", pelo terrorismo, quando surge o terrorismo. Assim, o Rabótcheie Dielo, na última primavera, quando era tão importante pôr-se em guarda contra o entusiasmo pelo terror, encontrou-se perplexo, diante de uma questão "nova" para ele. E agora, seis meses mais tarde, quando a questão deixou de ter tão palpitante actualidade, apresenta-nos ao mesmo tempo esta declaração: "pensamos que a tarefa da social-democracia não pode, nem deve opor-se à ascensão de tendências terroristas" (Rabótcheie Dielo, n.º 10, p. 23), bem como à resolução do congresso: "O congresso reconhece como inoportuno o terror ofensivo sistemático" (Dois Congressos, p. 18). Que clareza e coerência admiráveis! Não nos opomos, mas declaramos inoportuno, e declaramos isso de forma que a "resolução" não inclua o terror não sistemático e defensivo. Concordamos que tal resolução não oferece qualquer perigo, e que constitui garantia contra qualquer erro, como o de falar sem nada dizer! Para quem redigiu tal resolução, não é preciso senão uma coisa: saber segurar-se à cauda do movimento. Quando o Iskra zombou do Rabótcheie Dielo, que declarou que a questão do terror era uma questão nova, o Rabótcheie Dielo acusou severamente o Iskra "de ter a pretensão verdadeiramente incrível de impor à organização do Partido a solução de problemas tácticos, apresentada há mais de quinze anos por um grupo de escritores emigrados" (p. 24). De facto, que atitude pretensiosa e que exagero do elemento consciente: resolver teoricamente e de antemão as questões, a fim de convencer em seguida a organização, o partido e as massas de que essa solução é bem fundamentada![20] Outra coisa é simplesmente repetir coisas já ditas, e sem nada "impor" a ninguém, e obedecer a qualquer "virada" tanto para o "economismo" como para o terrorismo. O Rabótcheie Dielo chega a sintetizar esse grande preceito da sabedoria humana e acusa o Iskra e a Zaria "de opor ao movimento o seu programa, como um espírito pairando acima do caos informe" (p. 29). Mas, qual é o papel da social-democracia, senão o de ser o "espírito" que não somente paira acima do movimento espontâneo, mas, eleva este ao nível de "seu programa"? Não é, portanto, o papel de se arrastar na cauda do movimento; coisa inútil, no melhor dos casos, e, no pior, extremamente prejudicial para o movimento. O Rabótcheie Dielo não se limita a seguir essa "táctica-processo"; eleva-a mesmo em princípio, de forma que a sua tendência deveria ser qualificada não de oportunismo, mas, antes, de caudismo (da palavra cauda). É forçoso reconhecer que aqueles que estão firmemente decididos a sempre marchar na cauda do movimento, também estão, absolutamente e para sempre, contra o defeito de "subestimar o elemento espontâneo do desenvolvimento".
***
Constatamos, assim, que o erro fundamental da "nova tendência" da social-de-mocracia russa é inclinar-se diante da espontaneidade; é não compreender que a espontaneidade das massas exige de nós, social-democratas, uma consciência elevada. Quanto maior for o impulso espontâneo das massas, mais amplo será o movimento, e de forma ainda mais rápida se afirmará a necessidade de uma consciência elevada no trabalho teórico, político e de organização da social-democracia.
O impulso espontâneo das massas na Rússia foi (e continua a ser) tão rápido que a juventude social-democrata encontrou-se pouco preparada para realizar essas imensas tarefas. A falta de preparação é a nossa desgraça comum, a infelicidade de todos os social-democratas russos. O impulso das massas não cessou de crescer e de se estender de forma ininterruptamente contínua; e longe de se interromper nos locais onde foi iniciado, estendeu-se a novas localidades, a novas camadas da população (o movimento operário provocou um redobramento da efervescência entre a juventude das escolas, dos intelectuais em geral, e mesmo entre os camponeses). Os revolucionários atrasaram-se quanto à progressão do movimento, e nas suas "teorias" e actividade, não souberam criar uma organização que funcionasse constante e continuamente, capaz de dirigir todo o movimento.
No primeiro capítulo, constatámos que o Rabótcheie Dielo rebaixa as nossas tarefas teóricas e repete "espontaneamente" o grito em moda: "liberdade de crítica"; mas aqueles que o repetem não tiveram "consciência" suficiente para compreender a oposição diametral existente entre as posições dos "críticos" – oportunistas – e os revolucionários na Alemanha e na Rússia.
Nos capítulos seguintes, veremos como esse culto da espontaneidade se manifestou no domínio das tarefas políticas e no trabalho de organização da social-democracia.
[1] Rabótcheie Dielo, N.º 10, Setembro de 1901, pp. 17-18. – Lenine
[2] O sindicalismo não exclui de forma absoluta toda a "política", como por vezes se pensa. Os sindicatos sempre conduziram certo tipo de propaganda e certas lutas políticas (porém, não social-democratas). No capítulo seguinte, exporemos a diferença entre a política sindical e a política social-democrata.
[3] A. Vaneiev morreu em 1899, na Sibéria Oriental, de tuberculose contraída durante a prisão preventiva. Por isso, julgamos possível publicar as informações no texto: respondemos pela sua autenticidade, pois provêm de pessoas que conheceram pessoal e intimamente A. Vaneiev.
[4] "Criticando a actividade dos sociais-democratas dos últimos anos de século XIX, o Iskra não leva em conta a ausência, à época, de condições para um trabalho diferente da luta em favor de pequenas reivindicações." Assim falam os "economistas" na sua Carta aos Órgãos Social-Demo-cratas Russos (Iskra, n.º 12). Os factos citados no texto provam que essa afirmação sobre a "ausência de condições" é diametralmente oposta à verdade. Não apenas por volta de 1900, mas também em 1895, todas as condições estavam reunidas para permitir outro trabalho além da luta por pequenas reivindicações, salvo a preparação suficiente dos dirigentes. E eis que em vez de reconhecer abertamente esta falta de preparação entre nós, ideólogos e dirigentes, os "economistas" querem transferir toda a culpa, quanto à "ausência de condições", para a influência do meio material que determinaria um caminho, do qual nenhum ideólogo conseguiria desviar o movimento. O que é isto senão submissão servil a espontaneidade, senão admiração dos "ideólogos" pelos seus próprios defeitos? – Lenine
[5] Diga-se de passagem, que este elogio à Rabótchaia Mysl em Novembro de 1898, quando o economismo, sobretudo no estrangeiro, se tinha definido completamente, partia do próprio V. I., que pouco depois se tornou um dos redactores do Rabótcheie Dielo. E o Rabótcheie Dielo ainda negava, como continua a fazer, a existência de duas tendências na social-democracia russa! – Lenine
[6] O seguinte facto característico mostra a exactidão dessa comparação. Quando, após a prisão dos "dezembristas", se espalhou entre os operários da estrada de Schlüsselburg a notícia de que a sua descoberta e prisão foram facilitadas por um agente provocador, N. Mikhailov (um dentista), ligado a um grupo estreitamente vinculados aos "dezembristas", os operários indignados decidiram matá-lo. – Lenine
[7] Extraído do mesmo editorial do primeiro número da Rabótchaia Mysl. É por aqui que se pode julgar da preparação teórica dos "V. V. da social-democracia russa", que reproduziam esta grosseira vulgarização do "materialismo económico", enquanto os marxistas faziam guerra, nas suas publicações, ao verdadeiro V. V., desde há muito apelidado de "artesão da reacção", por compreender da mesma maneira as relações entre a política e a economia! – Lenine
[8] Os alemães possuem até uma palavra especial, Nur-Gewerkschaftler, para designar os partidários da luta "exclusivamente sindical".
[9] Sublinho “actuais” para os fariseus que encolhem os ombros e dizem: agora é fácil denegrir a Rabótchaia Mysl, mas não é isso história antiga? Mutato nomine de te fabula narratur, responderemos a esses fariseus modernos, cujo servilismo absoluto às ideias da Rabótchaia Mysl será demonstrado mais adiante. – Lenine
[10] Carta dos "economistas" no n.º 12 do Iskra. – Lenine
[11] Rabótcheie Dielo, n.º 10. – Lenine
[12] Neue Zeit, 1901-1902, XX, 1, n.º 3, p. 79. O projecto da comissão a que se refere Kautsky foi adoptado (no final do ano passado) pelo Congresso de Viena sob forma um pouco alterada. – Lenine
[13] Naturalmente, isto não significa que os operários não participem dessa elaboração. Mas não participam como operários, participam como teóricos do socialismo, como os Proudhon e os Weitling; noutras palavras, não participam senão na medida em que conseguem adquirir os conhecimentos mais ou menos perfeitos da sua época, e os fazem progredir. E para que os operários o consigam com maior frequência, é preciso o maior esforço para elevar o nível da consciência dos operários em geral; é preciso que estes não se limitem ao quadro artificialmente restrito da "literatura para operários", mas que saibam assimilar cada vez melhor a literatura geral. Seria mesmo mais exacto dizer, em lugar de "se limitem", “não sejam limitados”, porque os próprios operários lêem e desejariam ler tudo o que se escreve para os intelectuais: somente alguns (maus) intelectuais pensam que é suficiente falar "aos operários" da vida na fábrica e repisar aquilo que eles já sabem há muito tempo. – Lenine
[14] Diz-se frequentemente: a classe operária gravita espontaneamente em direcção ao socialismo. Isto é perfeitamente verdadeiro no sentido de que a teoria socialista determina as causas dos males da classe operária mais profunda e exactamente que as outras, e por isso os operários a assimilam com muita facilidade, desde que esta teoria não capitule, ela própria, diante da espontaneidade, desde que submeta essa espontaneidade. Isto está, em geral, subentendido, mas é precisamente isto que o Rabótcheie Dielo esquece ou deturpa. A classe operária gravita espontaneamente em direcção ao socialismo; mas a ideologia burguesa mais difundida (e constantemente ressuscitada sob as mais variadas formas) é, porém, aquela que em maior grau se impõe espontaneamente à classe operária. – Lenine
[15] As Tarefas Atuais e a Táctica dos Sociais-Democratas Russos, Genebra, 1898. Duas cartas à Rabótchaia MysI, escritas em 1897. – Lenine
[16] Em defesa da sua primeira contraverdade ("ignoramos a que jovens camaradas se referia P. Axelrod"), o Rabótcheie Dielo acrescentou uma segunda, quando escreveu na sua Resposta: "desde que a crítica das Tarefas foi feita, surgiram tendências, ou afirmaram-se tendências de forma mais ou menos nítida entre certos sociais-democratas russos, em direcção ao exclusivismo económico, que significam um passo atrás em relação ao estado de nosso movimento, tal como foi representado nas Tarefas" (p. 9). Isto é dito na Resposta, publicada em 1900. Ora, o primeiro número do Rabótcheie Dielo (com a crítica) apareceu em Abril de 1899. Mas, não foi em 1899 que o "economismo" apareceu realmente? Não, em 1899 fez-se ouvir pela primeira vez, o protesto dos sociais-democratas russos contra o "economismo" (protesto contra o Credo). Quanto ao "economismo", nasceu em 1897, como o sabe perfeitamente o Rabótcheie Dielo, pois, desde Novembro de 1898, (List. "Rabót.", n.º. 9-10), V. I. fazia elogios à Rabótchaia Mysl. – Lenine
[17] Veja-se, por exemplo, como se encontra enunciada nesse artigo a "teoria dos estádios", ou a teoria do "ziguezague tacteante" na luta política: "As reivindicações políticas, comuns pelo seu carácter a toda a Rússia, devem, todavia, nos primeiros tempos (isto foi escrito em Agosto de 1900) corresponder à experiência extraída da luta económica por cada categoria (sic!) de operários. É somente (!) a partir dessa experiência que se pode e deve empreender a agitação política" etc. (p. 11). Na página 4, o autor, erguendo-se contra as acusações de heresia economista, segundo ele absolutamente injustificadas, exclama pateticamente: “Qual é o social-democrata que ignora que, de acordo com a doutrina de Marx e Engels, os interesses económicos das diferentes classes desempenham um papel decisivo na história e que, consequentemente, a luta do proletariado pelos seus interesses económicos deve, em particular, ter importância primordial no seu desenvolvimento de classe e luta pela emancipação?" (O ênfase é nosso.) Este “consequentemente” é completamente irrelevante. O facto dos interesses económicos desempenharem um papel decisivo, não implica, de modo nenhum, que a luta económica (= sindical) seja de primordial importância para o mais essencial: os interesses "decisivos" das classes só podem ser satisfeitos por transformações gerais políticas radicais; em particular, o interesse económico fundamental do proletariado só pode ser satisfeito por uma revolução política, que substituirá a ditadura da burguesia pela ditadura do proletariado. B Kritchévski repete o raciocínio dos "V. V. da social-democracia russa" (a política vem depois da economia, etc.), e dos bernsteinianos da social-democracia alemã (era justamente através de raciocínio análogo que Woltmann, por exemplo, procurou demonstrar que os operários devem começar por adquirir a "força económica" antes de pensar na revolução política). – Lenine
[18] Ein Jahr der Verwirrung (Um Ano de Confusão), é o título que Mehring deu ao capítulo da sua História da Social-Democracia Alemã, onde descreve as hesitações e a indecisão manifestadas inicialmente pelos socialistas na escolha de uma "táctica-plano" correspondente às novas condições. – Lenine
[19] Editorial do Iskra n.º 1. – Lenine
[20] Também não se deve esquecer que, resolvendo "teoricamente" a questão do terror, o grupo "Auto-libertação do Trabalho" sintetizou a experiência do movimento revolucionário anterior. – Lenine
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