de Marx, Engels, Lenine, Estaline, Mao Tsé-tung e outros autores
Terça-feira, 2 de Outubro de 2007
Que fazer? IV-1- Os métodos artesanais dos economistas e a organização dos revolucionários

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III Parte -2

 

As afirmações do Rabótcheie Dielo, já examinadas anteriormente, declarando que a luta económica é o meio mais amplamente aplicável de agitação política, que a nossa tarefa consiste, hoje, em conferir à própria luta económica um carácter político etc., reflectem uma concepção estreita das nossas tarefas, não só em matéria política, mas ainda em matéria de organização. Para conduzir "a luta económica contra os patrões e o governo", não seria necessária uma organização centralizada para toda a Rússia (e ela não poderia constituir-se no curso de tal luta), organização que agrupasse num único ataque comum todas as manifestações, quaisquer que fossem, de oposição política, de protesto e de indignação, organização de revolucionários profissionais, e fosse dirigida pelos verdadeiros chefes políticos de todo o povo. Aliás, isto pode ser facilmente compreendido: qualquer instituição tem a sua estrutura natural inevitavelmente determinada pelo conteúdo da sua acção. Por isso, pelas afirmações acima analisadas, o Rabótcheie Dielo consagra e legitima a estreiteza não só da acção política, mas também do trabalho de organização. Neste caso, como sempre, a consciência desse órgão inclina-se diante da espontaneidade. Ora, o culto das formas de organização que se elaboram espontaneamente, o facto de ignorar o quanto é estreito e primitivo o nosso trabalho de organização e até que ponto somos ainda "rudimentares" em relação a esse aspecto importante, o facto de ignorar tudo isto, digo, constitui uma verdadeira doença do nosso movimento. Não uma doença de decadência, mas, evidentemente, de crescimento. Porém, precisamente hoje que a onda de revolta espontânea se espraia — poder-se-ia dizer — até nós, dirigentes e organizadores do movimento, o que é preciso é sobretudo lutar intransigentemente contra a menor tentativa de defender o nosso atraso, de legitimar a estreiteza nesta matéria; é preciso sobretudo despertar entre todos aqueles que participam, ou apenas se dispõem a participar do trabalho prático, o descontentamento em relação ao trabalho artesanal, que reina entre nós, e a firme vontade de nos desembaraçarmos dele.

 

a) O que é o trabalho artesanal?

Tentemos responder a esta questão observando o quadro de actividade de um círculo social-democrata típico entre 1894 e 1901. Já assinalámos o entusiasmo geral pelo marxismo da juventude estudantil da época. Para ela, com efeito, o marxismo era mais a resposta à questão “que fazer?” do que uma teoria, um apelo para marchar contra o inimigo. E os novos combatentes iam para o campo de batalha com uma preparação e um equipamento dos mais primitivos, por vezes mesmo inexistentes. Ia-se para a guerra como os moujiks, simplesmente armados com um varapau. Sem ligação alguma com os círculos das outras cidades, nem mesmo dos outros bairros e escolas da sua própria cidade, sem coordenação alguma das diferentes partes do trabalho revolucionário, sem qualquer plano de acção, mesmo imediato, um círculo de estudantes entrava em contacto com os operários e põe-se ao trabalho. Desenvolve uma propaganda e uma agitação das mais intensas, conquistando assim a simpatia de um grande número de operários e de certos membros parte da sociedade culta que lhe fornecem dinheiro e novos recrutas. O prestígio do “comité” (ou da união de combate) aumenta ao mesmo tempo que o seu campo de acção se alarga espontaneamente. As pessoas que, há alguns meses, intervinham nos círculos de estudantes e decidiam “para onde ir”, que estabeleciam e possuíam relações com os operários, preparavam e editavam  folhas volantes, entram agora em contacto com outros grupos revolucionários, procuram literatura, empreendem a edição de um jornal local, começam a falar em organizar uma manifestação, passam enfim à declaração das hostilidades (uma primeira folha de agitação, o primeiro número de um jornal, ou uma primeira manifestação); mas então  e quase sempre, é a derrocada imediata e completo. Imediata e completa, porque estas operações militantes não eram o resultado de um plano minuciosamente estabelecido de luta encarniçada a longo termo, mas simplesmente o desenvolvimento normal de um trabalho de círculo tradicional; porque a polícia, conhecia quase sempre os principais dirigentes, que já tinham dado que falar nos bancos da universidade e que esperando o momento oportuno para uma vasta captura, tinha deixado o círculo desenvolver-se e alargar-se para ter um corpus delicti bem determinado, permitindo a liberdade a vária pessoas conhecidas “para reprodução (tanto quanto sei, termo técnico usado tanto pelo povo como pela polícia). Esta guerra lembra a marcha de um bando de camponeses armados de varapaus, contra um exército regular. E não podemos senão admirar a vitalidade de um movimento que crescia e obtinha vitórias, apesar da completa ausência de preparação dos combatentes. É verdade que o carácter primitivo do armamento era, historicamente, não apenas inevitável a princípio, mas até legítimo, visto que permitia atrair grande número de combatentes. Mas logo que começaram as operações a sério (quando das greves do Verão de 1896), as lacunas da nossa organização militante fizeram-se sentir cada vez mais. Após uma série de erros (como dirigir-se à opinião pública contando as malfeitorias dos socialistas, ou enviar inúmeros operários das capitais para os centros industriais da província), o governo, ainda que um pouco surpreendido a princípio, não demorou a adaptar-se às novas condições de luta e dispôs, nos pontos convenientes, os seus destacamentos de provocadores, de espiões e polícias, munidos de todos os aperfeiçoamentos da técnica. As prisões tornaram-se tão frequentes, atingiram uma tal quantidade de pessoas, desorganizaram em tão elevado grau os círculos locais, que a massa operária perdeu literalmente todos os seus dirigentes, o movimento tornou-se incrivelmente desordenado e foi impossível estabelecer alguma continuidade no trabalho. A extraordinária falta de ligação entre os militantes locais, a composição fortuita dos círculos, a falta de preparação e a estreiteza de visão nas questões teóricas, políticas e de organização, eram o resultado inevitável desta situação. Em certos locais, os operários, vendo a nossa falta de firmeza e de discrição, vieram por desconfiança, a afastar-se dos intelectuais cuja irreflexão, segundo diziam, conduz infalivelmente ao malogro do empreendimento!

Hoje qualquer militante, mesmo pouco iniciado no movimento, já sabe que esses métodos artesanais foram considerados pelos social-democratas sensatos como uma verdadeira doença. Mas, para o leitor não iniciado não pensar que "construímos" artificialmente uma determinada etapa ou uma determinada doença do movimento, recorreremos a um testemunho já uma vez invocado. Que nos perdoem a longa citação:

"Se a passagem gradual a uma acção prática mais ampla", escreve B-v no nº 6 do Rabótcheie Dielo, "passagem que está em função directa do período geral de transição que atravessa o movimento operário russo, é um traço característico... existe ainda, no conjunto do mecanismo da revolução operária russa, um outro traço não menos interessante. Queremos referir-nos à insuficiência de forças revolucionárias próprias para a acção, que se faz sentir não apenas em Petrogrado, mas em toda a Rússia. À medida que o movimento operário se acentua, que a massa operária se desenvolve, que as greves se tornam mais frequentes, que a luta de massas dos operários se faz de forma mais aberta, luta que reforça as perseguições governamentais, prisões, expulsões e deportações, essa falta de forças revolucionárias altamente qualificadas torna-se mais sensível e, sem dúvida, não deixa de influir na profundidade e no carácter geral do movimento. Muitas greves desenrolam-se sem que as organizações revolucionárias exerçam sobre elas uma acção directa e enérgica... Há falta de "folhas" de agitação e de publicações ilegais... os círculos operários ficam sem agitadores... Além disso, a falta de dinheiro faz-se sentir continuamente. Numa palavra, o crescimento do movimento operário ultrapassa o crescimento e o desenvolvimento das organizações revolucionárias. O efectivo de revolucionários em acção é demasiado insignificante para poder influenciar toda a massa operária em efervescência, para oferecer a todos os distúrbios ao menos uma sombra de coerência e de organização... Tais círculos, tais revolucionários não estão unidos, nem agrupados; não formam uma organização coerente, forte e disciplinada, com partes metodicamente desenvolvidas"... E após ter feito a reserva de que o aparecimento imediato de novos círculos em lugar daqueles que foram destruídos, "prova apenas a vitalidade do movimento... mas, não demonstra ainda a existência de uma quantidade suficiente de militantes revolucionários perfeitamente firmes", o autor conclui: "A falta de preparação prática dos revolucionários de Petrogrado repercute-se também sobre os resultados do seu trabalho. Os últimos processos, especialmente os dos grupos "Auto-libertação" e  "Luta do Trabalho Contra o Capital" mostraram nitidamente que um jovem agitador não familiarizado perfeitamente com as condições do trabalho e, por conseguinte, da agitação em determinada fábrica, ignorando os princípios da acção clandestina e tendo apreendido" (apreendido?) "apenas os princípios gerais da social-democracia, pode trabalhar uns quatro, cinco, seis meses. Depois vem a prisão que frequentemente ocasiona a derrocada de toda a organização, ou ao menos de uma parte. Pode um grupo trabalhar com proveito e êxito, quando a sua existência está limitada a uns poucos meses? É evidente que não seria possível atribuir inteiramente as falhas das organizações existentes ao período de transição... é evidente que a quantidade e sobretudo a qualidade do efectivo das organizações em actividade desempenham aqui um papel importante, e a primeira tarefa dos nossos social-democratas... deve ser a de unir de forma eficaz as organizações, com uma rigorosa selecção dos seus membros." 

 

 b) Trabalho artesanal e "economismo"

Vamos agora deter-nos numa questão que, certamente, já se colocou ao leitor. O trabalho artesanal, doença de crescimento que afecta todo o movimento, pode estar em conexão com o "economismo", considerado como uma das tendências da social-democracia russa? Cremos que sim. A falta de preparação prática, de habilidade no trabalho de organização é realmente comum a todos nós, mesmo àqueles que, desde o início, se mantiveram fiéis ao ponto de vista do marxismo revolucionário. E, certamente, ninguém poderia incriminar os práticos por essa falta de preparação. Mas, esses "métodos artesanais" não se encontram apenas na falta de preparação: estão também na estreiteza do conjunto do trabalho revolucionário em geral, na incompreensão do facto de que essa estreiteza impede a constituição de uma boa organização de revolucionários, enfim — e é o principal — encontram-se nas tentativas de justificar essa estreiteza e de erigi-la em "teoria" particular, isto é, no culto da espontaneidade também nesse campo. Desde as primeiras tentativas deste género, que se tornou evidente a ligação dos métodos artesanais ao "economismo" e que não nos livraríamos da nossa estreiteza no trabalho de organização antes de nos livrarmos do "economismo" em geral (isto é, da concepção estreita da teoria do marxismo, do papel da social-democracia e das suas tarefas políticas). Ora, essas tentativas foram feitas em duas direcções. Uns começaram a dizer: a massa operária não formulou ainda, ela própria, tarefas políticas tão extensas e tão manifestas como as que lhe "são impostas" pelos revolucionários; deve ainda lutar pelas reivindicações políticas imediatas, conduzir "a luta económica contra os patrões e o governo"[1] (e a esta luta "acessível" ao movimento de massas corresponde naturalmente uma organização "acessível" mesmo à juventude menos preparada). Outros, afastados de todo o "gradualismo" declararam: pode-se e deve-se "realizar a revolução política", mas, para isso, não há necessidade de se criar uma forte organização de revolucionários que eduquem o proletariado para uma luta firme e obstinada, basta que todos nós tomemos o bordão "acessível" e já conhecido. Para falar sem alegorias, é preciso organizar a greve geral[2] ou estimular através de "um terrorismo excitativo" o movimento operário "adormecido"[3]. Essas duas tendências, a oportunista e a "revolucionária", capitulam diante dos métodos artesanais dominantes, não crêem na possibilidade de se libertarem deles, não vêem a nossa primeira e mais urgente tarefa prática: criar uma organização de revolucionários, capaz de assegurar à luta política energia, firmeza e continuidade.

Acabámos de citar as palavras de B-v: "O crescimento do movimento operário ultrapassa o crescimento e o desenvolvimento das organizações revolucionárias". Essa "comunicação preciosa de um observador bem colocado" (opinião emitida pela redacção do Rabótcheie Dielo sobre o artigo de B-v) é para nós duplamente preciosa. Mostra que tínhamos razão de ver a causa fundamental da crise actual da social-democracia russa no atraso dos dirigentes ("ideólogos", revolucionários, social-democratas) em relação ao impulso espontâneo das massas. Mostra que existe apenas a defesa e a exaltação dos métodos artesanais em todos esses raciocínios dos autores da carta economista (Iskra, nº 12), B. Kritchévski e Martynov, sobre o perigo que existe em minimizar o papel do elemento espontâneo, da obscura luta quotidiana, da táctica-processo etc. Essas pessoas, que não podem pronunciar sem desdém a palavra "teórico", que denominam por "sentido das realidades" a sua idolatria perante a falta de preparação para as coisas da vida e a falta de desenvolvimento, mostram de facto a sua ignorância das nossas tarefas práticas mais prementes. Às pessoas que se atrasam, gritam: marquem passo! Não se adiantem! Àqueles que, no trabalho de organização, carecem de energia e de iniciativa, àqueles que carecem de "planos", de perspectivas amplas e corajosas, falam da "táctica-processo"! O nosso erro capital é rebaixar as nossas tarefas políticas e de organização ao nível dos interesses imediatos, "tangíveis", "concretos" da luta económica quotidiana, e não param de nos dizer: é preciso conferir à própria luta económica um carácter político! Mais uma vez repetimos: isto constitui exactamente um "senso das realidades" comparável ao do herói da epopeia popular, que exclamava à vista de um cortejo fúnebre, "muitos anos de vida".

Lembrem-se da incomparável presunção, verdadeiramente digna de Narciso, com a qual esses sábios repreendiam Plekhanov: "As tarefas políticas, no sentido real e prático da palavra, isto é, no sentido de uma luta prática, racional e vitoriosa para as reivindicações políticas, são em princípio (sic) inacessíveis aos círculos operários" ("Resposta da redacção do Rab. Dielo", p. 24). Existem círculos e círculos, senhores! Evidentemente, as tarefas políticas são inacessíveis a um círculo de "artesãos", enquanto estes não tomarem consciência de que os seus métodos são artesanais e não se livrarem deles. Mas se, além disso, esses artesãos estão enamorados dos seus métodos artesanais, se escrevem a palavra "prático" em itálico e imaginam que ser prático é rebaixar as nossas tarefas ao nível da compreensão pelas massas mais atrasadas, então, evidentemente, esses artesãos são incuráveis e as tarefas políticas em princípio são-lhes realmente inacessíveis. Mas, para um círculo de corifeus, como Alexeiev e Mychkine, Khalturine e Jeliabov, as tarefas políticas são inacessíveis no sentido mais verdadeiro, mais prático da palavra, e isto exactamente porque a sua ardente propaganda encontra eco na massa que desperta espontaneamente; porque a sua energia fervilhante é restabelecida e sustentada pela energia da classe revolucionária. Plekhanov tinha mil vezes razão não apenas quando assinalou a existência dessa classe revolucionária e provou que o seu despertar espontâneo para a acção era inelutável, infalível, mas, também quando designou para os "círculos operários", uma grandiosa e importante tarefa política. Quanto a vocês, invocam o movimento de massas que surgiu desde então para rebaixar essa tarefa, para restringir o campo de acção e de energia dos "círculos operários". O que é isso senão apego de artesão aos seus métodos artesanais? Vangloriam-se do seu espírito prático, e não vêem o facto conhecido de cada prático russo: que maravilhas pode realizar, em matéria revolucionária, a energia não apenas de um círculo, mas mesmo de um indivíduo isolado. Acreditam vocês, por acaso, que não podem existir no nosso movimento dirigentes como os da década de 1870? Porquê? Porque estamos pouco preparados? Mas nós preparámo-nos, continuaremos a preparar-nos e estaremos preparados! É verdade que à superfície dessa água estagnada, que é a "luta económica contra os patrões e o governo", infelizmente formou-se o limo; apareceram pessoas que se ajoelharam para adorar a espontaneidade, contemplando religiosamente (segundo a expressão de Plekhanov) o "traseiro" do proletariado russo. Mas, saberemos livrar-nos desse limo. Precisamente hoje, o revolucionário russo, orientado por uma teoria verdadeiramente revolucionária, apoiando-se numa classe verdadeiramente revolucionária que desperta espontaneamente para a acção, pode enfim — enfim! — reerguer-se em toda a sua estatura e empregar toda a sua força de gigante. Para isso é preciso apenas que, entre a massa dos práticos e a massa ainda mais numerosa de pessoas que sonham com a acção prática desde os bancos da escola, todas as tentativas de rebaixar as nossas tarefas políticas e de restringir a envergadura de nosso trabalho de organização sejam consideradas com desprezo e recebidas jocosamente. E fiquem tranquilos, senhores, chegaremos lá!

No artigo "Por Onde Começar?" escrevi contra o Rabótcheie Dielo: "Em 24 horas, pode-se modificar a táctica da agitação nalgum ponto especial, modificar um detalhe qualquer na actividade do Partido. Mas, para modificar, não direi em 24 horas, mas até em 24 meses, as suas concepções sobre a utilidade geral, permanente e absoluta de uma organização de combate e de uma agitação política nas massas, é preciso estar desprovido de qualquer princípio orientador." O Rabótcheie Dielo responde: "Essa acusação do Iskra, a única que pretende ter um carácter prático, está destituída de todo o fundamento. Os leitores do Rabótcheie Dielo sabem muito bem que desde o princípio não apenas exortámos à agitação política, sem esperar que aparecesse o Iskra "... (dizendo, então, que "não se pode colocar" aos círculos operários, "nem ao movimento operário de massa, como primeira tarefa, a derrubamento do absolutismo", mas apenas a luta pelas reivindicações políticas imediatas, e que "as reivindicações políticas imediatas só se tornam acessíveis às massas após uma, ou às vezes, numerosas greves")..." mas, através das nossas publicações, também fizemos chegar do estrangeiro aos camaradas militando na Rússia material social-democrata de agitação política único"... (acrescentamos que com esse material único não só fizeram agitação política maior do que a feita no campo da luta económica, mas também concluíram, enfim, que essa agitação limitada "é susceptível de ser a mais amplamente aplicada". E os senhores não repararam que a vossa argumentação prova justamente a necessidade do aparecimento do Iskra — dado esse material único — e a necessidade de o Iskra lutar contra o Rabótcheie Dielo ?)... "Por outro lado, a nossa actividade como editores preparou de facto a unidade táctica do partido"... (a unidade de convicção de que a táctica é um processo de crescimento das tarefas do partido, que crescem ao mesmo tempo que o Partido? Unidade preciosa!)... "e, por isso mesmo, a possibilidade de "uma organização de combate", para a criação daquela União, tornou em geral tudo isso acessível a uma organização residente no estrangeiro" (R. D., nº 10, p. 15). Vã tentativa para se sair do embaraço! Jamais pensei em contestar que tenham feito tudo o que lhes era acessível. Afirmei e ainda afirmo que os limites do que lhes é "acessível" encontram-se cerceados pela estreiteza da vossa compreensão. É ridículo falar de "organização de combate" para lutar em favor das "reivindicações políticas imediatas", ou para "a luta económica contra os patrões e o governo".

Mas, se o leitor quiser ver as pérolas do apego "economista" aos métodos artesanais, seria preciso naturalmente dirigir-se não ao Rabótcheie Dielo, eclético e instável, mas à Rabótchaia MysI, lógica e resoluta. "Duas palavras, agora, sobre o que se denomina, propriamente, a intelectualidade revolucionária", escrevia R. M. no Suplemento especial, p. 13; "provaram, é verdade, e mais de uma vez, que estão prontos a "integrar a luta decisiva contra o czarismo". Somente, o mal é que, perseguida sem tréguas pela polícia política, a nossa intelectualidade revolucionária tomou a luta contra essa polícia política por uma luta política contra a autocracia. Por isso, a questão, "Onde buscar forças para a luta contra a autocracia?", ainda não encontrou resposta.

Não é realmente admirável esse desprezo pela luta contra a polícia, da parte de um adorador (no sentido pejorativo da palavra) do movimento espontâneo? Está pronto a justificar a nossa imperícia na acção clandestina com o argumento de que,  num movimento espontâneo de massas, a luta contra a polícia, em suma, não tem importância para nós!! Muito poucos subscreverão essa conclusão mons­truosa, tal é o grau e a forma dolorosa em que são sentidas, por todos, as falhas das nossas organizações revolucionárias. Mas se Martynov, por exemplo, não a subscreve, é unicamente porque não sabe ir até ao fim do seu pensamento, ou não tem coragem para tanto. De facto, se as massas apresentam reivindicações concretas prometendo resultados tangíveis, constitui isso uma "tarefa" que exige uma preocupação particular com a criação de uma organização sólida, centralizada, combativa? As massas que não "lutam de modo algum contra a polícia política" não se incumbem, elas próprias, dessa "tarefa"? Mais ainda, essa tarefa seria executável se, com excepção de raros dirigentes, os operários (na sua grande maioria), que não são de forma alguma capazes de "lutar contra a polícia política", também não se encarregassem dela? Esses operários, os elementos médios das massas, são capazes de demonstrar uma energia e uma abnegação prodigiosas numa greve, num combate de rua com a polícia e as tropas policiais; são capazes (e são os únicos capazes) de decidir o resultado de todo o nosso movimento; porém, justamente a luta contra a polícia política exige qualidades especiais, exige revolucionários profissionais. E devemos estar vigilantes para que a massa operária não "apresente" apenas reivindicações concretas, mas que "apresente" um número cada vez maior desses revolucionários profissionais. Chegamos, assim, à questão da relação entre a organização dos revolucionários profissionais e o movimento puramente operário. Essa questão, pouco desenvol­vida na literatura, já nos ocupou bastante a nós, "políticos", nas nossas conversas e discussões com os camaradas que, de uma maneira ou de outra, tendem para o "economismo". Vale a pena que nos detenhamos nessa questão. Mas, antes, ter­minemos com outra citação, a ilustração da nossa tese sobre a ligação dos méto­dos artesanais ao "economismo".

"O grupo 'Libertação do Trabalho'", escrevia N.N. na sua "Resposta", "reclama a luta directa contra o governo sem buscar saber onde está a força material para essa luta, sem indicar o caminho que ela deve seguir". E sublinhando essas últimas palavras, o autor faz a seguinte observação a respeito da palavra "caminho": "Este facto não poderia ser explicado pelas necessidades da acção clandestina; de facto, no programa não se trata de uma conspiração, mas de um movimento de massa. Ora, a massa não pode seguir caminhos secretos. É possível uma greve secreta? São possíveis manifestações ou petições secretas?" (Vademecum, p. 59). O autor aborda de perto essa "força material" (organizadores de greves e de manifestações) e os "caminhos" luta, mas encontra-se confuso e perplexo, pois "inclina-se diante do movimento de massas, isto é, considera-o um factor que nos liberta da nossa actividade revolucionária, e não um factor destinado a encorajar e a estimular essa nossa actividade revolucionária. Uma greve secreta é impossível, tanto para os seus participantes como para aqueles a quem afecta directamente. Mas, para a massa dos operários russos, essa greve pode permanecer (e na maior parte dos casos permanece) "secreta", pois o governo tomará o cuidado de cortar todas as comunicações com os grevistas, tomará o cuidado de tornar impossível todas as informações sobre a greve. É então que se torna necessária uma "luta contra a polícia política", luta especial que jamais poderá ser conduzida activamente por uma massa tão grande como a que participa na greve. Essa luta deve ser organizada "segundo todas as regras da arte" por profissionais da acção revolucionária. E o facto de a massa estar espontaneamente integrada no movimento não torna menos necessária a organização dessa luta. Pelo contrário, torna ainda mais necessária; pois nós, socialistas, faltaríamos ao nosso primeiro dever para com as massas, se não soubéssemos impedir a polícia de tornar secreta (e se, por vezes, não nos preparássemos secretamente, nós mesmos) uma greve ou uma manifestação qualquer. Estamos em condições de fazê-lo, precisamente porque a massa, que desperta espontaneamente para a acção, fará surgir igualmente do seu seio um número cada vez maior de "revolucionários profissionais" (isto se não induzirmos todos os operários, de todas as maneiras, a permanecer no mesmo lugar).

 

IV Parte - 2

[1] Rabótchaia MysI e Rabótcheie Dielo, especialmente a resposta a Plekhanov – Lenine.

[2] Quem Fará a Revolução Política? brochura publicada na Rússia, na compilação A Luta Proletária, e reeditado pelo Comité de Kiev. – Lenine.

[3] Renascimento do Revolucionarismo e a revista Svoboda. – Lenine.


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publicado por portopctp às 17:58
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