A contradição principal e decisiva da sociedade portuguesa actual é a contradição entre a burguesia e o proletariado. A tarefa histórica fundamental dos verdadeiros marxistas-leninistas portugueses, organizados em partido revolucionário do proletariado, consiste em actuar revolucionariamente de forma a superar aquela contradição substituindo o capitalismo pelo socialismo e instaurando a ditadura do proletariado, sem a qual jamais será possível a sociedade sem classes – o comunismo.
O derrubamento da burguesia, o estabelecimento da ditadura do proletariado, a construção do socialismo e do comunismo não são, porém, abra de um só dia. Trata-se de uma revolução complexa, prolongada e ininterrupta. Compete à vanguarda organizada da classe operária, ao seu partido, estudar e aplicar as leis científicas da revolução e da luta de classes, de modo a determinar com justeza qual a fase da revolução em que nos encontramos, os objectivos que devemos prosseguir, a direcção do golpe principal a desencadear, quem são os nossos amigos e quem são os nossos inimigos, qual a disposição das forças revolucionárias.
O que tem caracterizado o movimento revolucionário português é precisamente a falta de uma direcção proletária do movimento. O proletariado não se tem revelado capaz de elaborar a sua própria linha política de classe. Tem vindo sempre a reboque do oportunismo, da tutela ideológica e política da burguesia radical. Uma direcção independente, verdadeiramente revolucionária do movimento proletário é coisa que não tem existido. A classe operária tem falado pela boca da burguesia.
O operariado, todavia, vem possuindo uma consciência cada vez mais clara desta situação. A amplitude assumida pela justa luta de libertação dos povos das colónias, o agravamento da exploração do capital monopolista, a venda de Portugal ao imperialismo, a extensão das lutas populares, particularmente em 1961/1962, ensinaram a classe operária a distinguir os interesses proletários dos interesses da burguesia radical.
A fase actual da Revolução em Portugal é a fase da Revolução Democrática Popular. Dentro desta fase coloca-se à classe operária a tarefa prioritária de reorganizar a sua vanguarda. Sem ela, sem um verdadeiro partido marxista-leninista do proletariado português, não é possível a elaboração duma linha política proletária, não é possível realizar e levar até ao fim a Revolução Democrática Popular e encarar as tarefas da Revolução Socialista. Só com um partido proletário poderá a classe operária começar a falar com a sua própria boca.
Lutemos pela emancipação definitiva do movimento revolucionário da tutela ideológica e política da burguesia radical.
A partir dos últimos anos da guerra de 1939/45, inicia-se na economia portuguesa um movimento acelerado de concentração da produção e do capital como consequência do investimento de elevados lucros acumulados durante o conflito, da penetração do imperialismo estrangeiro e da exploração cada vez mais desenfreada dos povos das colónias.
O resultado daquela concentração é que a nossa economia é hoje essencialmente dominada pelo capital monopolista.
Umas escassas dezenas de sociedades anónimas detêm ou controlam os principais ramos da produção nacional e da exploração colonial. Dessas sociedades algumas são directamente dirigidas pelo capitalismo estrangeiro, como sucede nos sectores das minas, comunicações e transportes; outras são administradas por grupos «portugueses» (CUF, Champalimaud, Sacor, Fonsecas & Burnay, Português do Atlântico, Espírito Santo, Borges & irmão e Nacional Ultramarino) dependentes financeira e politicamente dos grandes trusts internacionais, a soldo dos quais se encontram.
No que respeita ao sector agrícola, a penetração do capitalismo, acentuada em anos recentes, destruiu, no essencial, as relações de produção pré-capitalistas e semi-feudais aí dominantes, de tal sorte que o grau de concentração é provavelmente o mais elevado da Europa.
Assim, as relações capitalistas, a compra e venda da força de trabalho como mercadoria, são as relações de produção que de uma maneira absoluta predominam no nosso país. É o capitalismo monopolista, a realidade actual predominante da nossa economia.
O fascismo-salazarismo – forma que a ditadura da burguesia assumiu para, nas condições específicas da luta de classes em Portugal, poder realizar os interesses históricos do capital e dos seus possuidores – é o instrumento político que opera esta passagem do capitalismo pré-monopolista ao capitalismo dos monopólios. Assim como a versão marcelista daquela ditadura intenta completar a mudança, consolidar as posições do capital financeiro e negociar com o capitalismo internacional o lugar de lacaio que cabe ao capital da burguesia portuguesa.
A concentração, todavia, agravando as condições gerais de exploração das classes trabalhadoras, não fez mais do que agudizar as contradições da sociedade portuguesa e, em particular, a contradição principal.
Assim, o quantitativo da classe operária triplicou desde os começos do fenómeno da concentração, passando de 500 000 operários, em 1940, para cerca de 1 500 000 em 1970. Este crescimento explosivo transformou o proletariado na classe numericamente mais importante, e veio alterar radicalmente o panorama da luta de classes.
Além de ser a mais numerosa, a classe operária está densamente concentrada em redor de duas ou três zonas industriais nucleares, o que cria condições materiais particularmente favoráveis ao incremento da unidade, consciência e combatividade revolucionárias.
Por outro lado, o proletariado português – numa boa parte constituído por elementos recentemente chegados do campo – não se encontra disperso por uma multidão de oficinas e unidades artesanais mas, sim, na sua maioria, concentrado em grandes e médias unidades fabris.
O nível dos salários é muito baixo e os mais pequenos aumentos arrancados a ferro e fogo.
A penetração do capitalismo nos campos e a concentração que posteriormente aí se processa e vem processando, criam um verdadeiro exército de operários agrícolas cujo número constitui fracção maioritária do contingente do campesinato.
A estrutura capitalista portuguesa e a situação das classes no nosso país fazem de Portugal o elo mais fraco do capitalismo europeu. E é o levantamento insurreccional, vitorioso e irresistível dos povos das colónias que vai contribuir poderosamente para transformar o elo mais fraco do capitalismo na Europa num dos elos mais fracos da cadeia mundial do imperialismo.
A guerra colonial, na medida em que contribui para transformar as contradições da vida política portuguesa numa crise revolucionária, está a dar e dará cada vez mais um impulso formidável à Revolução.
Portugal insere-se decididamente na grande «zona das tempestades revolucionárias».
Na fase actual, a revolução que a crise da ditadura burguesa e as contradições da sociedade portuguesa reclamam, é a Revolução Democrática Popular.
Significa isto que, nesta sua primeira fase, a revolução portuguesa não é ainda uma revolução socialista proletária, mas uma revolução que terminará pela edificação duma sociedade de «democracia nova», colocada sob a ditadura conjunta de todas as classes revolucionárias, com o proletariado à frente em seu papel de direcção. Só então a revolução poderá progredir para a segunda fase, a fase da edificação da sociedade socialista.
Acrescente-se, contudo, que as duas fases não constituem, nem poderão nunca constituir, compartimentos estanques. «Na medida das nossas forças, isto é, das forças do proletariado consciente e organizado, começaremos – dizia Lenine – a passar da revolução democrática à revolução socialista. Nós somos pela revolução ininterrupta». («A atitude da social-democracia em face do movimento camponês» – 1905).
Mas a revolução, além de democrática, é também popular, o que significa que deve ser conduzida sob a direcção do proletariadoe das massas populares visando a instauração de uma ditadura democrático-popular que arranque pela raiz o poder da grande burguesia monopolista e latifundiária, que destrua o aparelho de estado militar – corporativo fascista, expulse o imperialismo e ponha termo à agressão colonialista, fazendo regressar imediatamente os soldados e imediatamente reconhecendo e proclamando o direito dos povos das colónias à independência e separação.
A Revolução Democrática Popular é assim uma revolução anti-fascista, anti-monopolista, anti-imperialista e anti-colonialista pela Democracia, pela Liberdade, pela Paz, pelo Pão, pela Terra e pela Independência Nacional (de Portugal e das colónias).
É claro que uma alteração tão profunda e radical da sociedade portuguesa actual não pode ser realizada senão pela insurreição popular, pela revolução violenta. Somente quem tenha perdido o senso comum pode pensar ou defender que a Revolução Democrática Popular possa efectuar-se pacificamente, no quadro da «democracia» burguesa, concebida exactamente para manter a hegemonia da burguesia.
Esta luta de classes complexa e violenta que é a revolução faz destacar com nitidez a necessidade absoluta e prioritária da existência de um verdadeiro partido marxista-leninista dos operários portugueses, e mostra-nos como, sem um instrumento político e militar próprio, as massas populares não a conseguirão levar ao fim.
O carácter democrático e popular e a natureza violenta e insurreccional não são as únicas características que distinguem a linha proletária da linha oportunista, no que respeita ao problema da Revolução em Portugal na actual fase.
Como ensinou Lenine, «a questão essencial da revolução é a questão do poder» («Sobre a dualidade do poder» – 1917).
A insurreição e a violência são meios absolutamente indispensáveis à tomada do poder. Mas a revolução não está terminada com a tomada do poder. A tomada do poder é apenas o começo da revolução. A vitória decisiva só se obtém com a instauração da ditadura democrática popular do proletariado e das outras classes populares revolucionárias.
Diz Lenine em «As duas tácticas…»: «E esta vitória será precisamente uma ditadura, o que quer dizer que deverá apoiar-se, com absoluta necessidade, sobre a força armada, sobre as massas armadas, sobre a insurreição e não sobre estas ou aquelas instituições constituídas, «legalmente», pela «via pacífica». Não poderá ser senão uma ditadura, porque as transformações absolutamente e imediatamente necessárias ao proletariado e ao campesinato provocarão da parte do latifundiário, dos grandes burgueses e do czarismo uma resistência desesperada. Sem ditadura será impossível quebrar esta resistência, repelir os ataques da contra-revolução. Todavia não se trata evidentemente de uma ditadura socialista, mas de uma ditadura democrática.»
A questão do poder na revolução democrática popular é o aspecto essencial, que distingue a linha proletária da linha contra-revolucionária, com os revisionistas à cabeça.
Também no que respeita à questão camponesa é nítida a demarcação entre a linha proletária e a linha oportunista no seio do movimento operário.
A questão camponesa é, no essencial, o problema da procura do principal aliado da classe operária na fase democrática da revolução. Em «As duas tácticas…» Lenine define do seguinte modo a linha política do partido bolchevista: «o proletariado deve realizar e levar até ao fim a revolução democrática, chamando a si a massa dos camponeses, a fim de esmagar pela força a resistência da autocracia e paralisar a burguesia instável».
Para derrubar o aparelho repressivo fascista e a grande burguesia monopolista e latifundiária, para expulsar definitivamente o imperialismo e pôr termo à guerra de agressão nas colónias, reconhecendo o direito dos seus povos à separação e independência, a classe operária tem necessidade absoluta dum aliado consequente, sob pena de não conseguir estabelecer a sua hegemonia e de sair derrotada da grande confrontação violente de classes que se avizinha.
Qual é esse aliado principal?
Para a linha oportunista e contra-revolucionária, com os revisionistas à cabeça, o aliado principal do proletariado na chamada «revolução democrática nacional» é o movimento democrático da burguesia liberal. Daí o pacifismo, o legalismo e o eleitoralismo de que tais oportunistas têm dado mostras.
Para a linha proletária, ao contrário, o aliado principal do proletariado na Revolução Democrática e Popular é o campesinato. Os interesses de classe do campesinato jamais se realizarão, a não ser no seio desta aliança revolucionária; os interesses de classe do proletariado só com ela poderão ser levados até ao fim.
No interior daquela aliança, o papel dirigente cabe ao proletariado, como única classe verdadeira e consequentemente revolucionária. Por isso, a classe operária deve ter bem presente os ensinamentos de Lenine a propósito da análise, em termos de classe, que deve ser feita do campesinato, a sua estrutura e interesses próprios.
«O campesinato engloba uma massa de elementos semi-proletários ao lado dos seus elementos pequeno-burgueses. Esta circunstância torna-o instável e obriga o proletariado a organizar-se num partido de classe estritamente definido. Porém a instabilidade do campesinato difere radicalmente da instabilidade da burguesia, porque o campesinato está menos interessado na conservação absoluta da propriedade privada do que na confiscação das terras do latifundiário, uma das formas principais desta propriedade. Sem se tornar por isso socialista, sem deixar de ser pequeno-burguês, o campesinato é capaz de ser um lutador decidido, e dos mais radicais, da revolução democrática. (…) Só uma revolução inteiramente vitoriosa poderá dar-lhe tudo no domínio das reformas agrárias, tudo o que o campesinato deseja, tudo quanto sonha e que lhe é verdadeiramente necessário (não para a supressão do capitalismo, como pensam os socialistas revolucionários) mas, para sair da abjecção, da semi-servidão, das trevas, do embrutecimento e do servilismo, para melhorar as suas condições de existência…».
A história recente tem mostrado como o abandono da aliança operário-camponesa pelos oportunistas tem conduzido a classe operária às maiores derrotas e aos maiores fracassos. A contra-revolução fascista na Indonésia e o aniquilamento físico de centenas de milhar de comunistas provam como o oportunismo na questão camponesa, como em todos os outros aspectos da teoria e da táctica revolucionárias, significa aliança clara com o inimigo de classe, aniquilamento dos verdadeiros marxistas-leninistas, negação da revolução.
Se o proletariado é a força principal, dirigente da Revolução, e o campesinato o seu principal aliado na fase actual da Revolução Democrática Popular, se o abandono da aliança operário-camponesa é um dos crimes mais graves cometidos pelos oportunistas, tal não significa que a classe operária deva desprezar, abandonar ou subestimar outras classes ou camadas do povo português.
É dever e tarefa revolucionária do proletariado unir todas as classes e camadas da população que possam e devam ser unidas.
Todos os grupos e classes exploradas, os sectores revolucionários da pequena-burguesia urbana, os estudantes e intelectuais revolucionários, são classes e camadas da população que podem e devem ser unidas.
O lugar próprio da aliança revolucionária de todos os explorados, o órgão que deve traduzir e selar essa aliança de todos os que podem e devem ser unidos é a frente revolucionária anti-fascista, anti-monopolista, anti-imperialista e anti-colonialista pela Democracia, pela Liberdade, pela Paz, pelo Pão, pela Terra e pela Independência Nacional.
No contexto actual da luta de classes, a questão colonial assume uma importância central. Ela é mesmo a contradição fulcral do capitalismo português e a pedra de toque com a qual se pode determinar quem são os reaccionários e quem são os revolucionários no nosso país.
Tal como em todas as questões importantes que se levantam ao movimento revolucionário em Portugal, a questão colonial tem uma resposta proletária e uma resposta oportunista.
Os oportunistas, com os revisionistas à cabeça, reproduzem alargadamente a traição da II Internacional nesta matéria, limitando-se a escassas, vagas e nebulosas referências ao «problema ultramarino», onde a questão da independência, separação e apoio militante à justa causa da libertação dos povos coloniais é inteiramente escamoteada. Os oportunistas passam sobre a questão colonial como gato sobre brasas.
Para a linha proletária, ao contrário, tudo é diferente e claro.
As colónias e os países submetidos que o capital financeiro explora constituem a principal reserva de forças do imperialismo.
A justa luta de libertação nacional dos povos das colónias e dos países oprimidos tem como consequência o enfraquecimento e isolamento do imperialismo, na medida em que destaca dele a sua principal reserva de forças.
No caso particular das colónias sob controlo da burguesia portuguesa, a insurreição popular armada não só contribui para o enfraquecimento do imperialismo internacional, acelerando a crise mundial do capitalismo, como vibra um golpe mortal no capitalismo português.
Os interesses do movimento revolucionário português, e em especial os interesses do proletariado, por um lado, e os interesses dos movimentos populares de libertação nacional das colónias, por outro exigem que os dois movimentos revolucionários constituem uma frente única contra o inimigo comum – o imperialismo, de que o capitalismo português é o seu lacaio menor.
Todavia, é preciso ter muito presente que «a formação de uma frente revolucionária comum, dizia Estaline, não é possível senão se o proletariado dos países opressores sustentar directa e resolutamente o movimento de independência nacional dos povos oprimidos contra o imperialismo da metrópole, pois ««um povo que oprime outro povo não poderá ser livre» (Marx)» (Em «As bases do leninismo»).
Os povos das colónias, ao pegarem em armas contra a exploração colonialista e imperialista, dão ao proletariado português, o exemplo de como se deve combater consequentemente o inimigo comum. Cabe ao proletariado português aprender com o exemplo e cumprir com toda a determinação o seu dever internacionalista militante.
O proletariado português e os povos das colónias são aliados naturais.
O grande Lenine ensinou que o «centro de gravidade da educação internacionalista dos operários dos países opressores deve residir na propaganda e defesa efectiva do direito dos povos oprimidos a se separarem da metrópole. Sem isso, não há internacionalismo possível. Nós podemos e devemos chamar de imperialista e de patife todo o socialista dum estado opressor que tal não faça». (Em «O balanço da discussão» – sublinhados nossos).
De imperialista e de patife… dizia Lenine!
Publicado no BANDEIRA VERMLHA N.º 1
em Dezembro de 1970
(início)
F
6.ª fase: de 1963 até hoje
De 1953 aos nossos dias a história do P«C»P tem sido o escorregar vertiginoso na decomposição orgânica, na degradação política oportunista, no rebaixamento ideológico, no abandalhamento liberal, etc.
Em 7 anos o direitismo ou, por vezes, o aventureirismo da direcção pequeno-burguesa, vieram progressivamente à superfície, ou seja, perderam completamente a máscara pseudo-proletária, manifestando hoje o P«C»P, novamente sem disfarce, o essencial das posições teóricas e práticas do direitismo desbragado do «desvio de direita» de 56-59. A diferença essencial relativamente a este período é que aos olhos das massas operárias e camponesas esclarecidas, este processo de traição é hoje claro e susceptível de ser perfeitamente compreendido; aos olhos das camadas avançadas das massas exploradas a solução não reside já em novas «correcções», «por dentro» ou «por fora» mas sim, e finalmente, na edificação de um verdadeiro partido marxista-leninista. Quer dizer: o P«C»P não conseguirá desta feita recompor-se da grande queda em que o seu direitismo o projectou e à luta popular: o novo fluxo da luta revolucionária em Portugal será necessariamente marcado pelo aparecimento de uma organização operário-camponesa revolucionária a conduzi-lo. O partido revisionista caminha inexoravelmente para a sua cada vez mais perfeita identificação com a pequena-burguesia, para o seu corte cada vez mais nítido com a classe operária e o campesinato, para a sua clara personificação, quer ao nível político, quer ao nível de métodos de trabalho e organização, quer ao nível de base social, como representante político da pequena-burguesia radical reformista.
Que novos condicionalismos impedem nesta fase o P«C»P de demagogicamente vir a retomar, como o fez em 1960-61, a direcção da luta popular? Que novos factores originaram que neste período de refluxo do movimento de massas se tenham gerado as condições para o surgimento de uma alternativa proletária para a luta e organização dos operários e camponeses?
Três tipos de factores se conjugaram para criar condições favoráveis nesse sentido:
1.º – a guerra colonial;
2.º – o corte do PC da China com o revisionismo soviético, acompanhado de atitudes idênticas por parte de vários partidos (ou suas fracções) e movimentos revolucionários;
3.º – a tentativa frustrada duma cisão revolucionária no interior do P«C»P e o início da denúncia teórica e prática à linha da direcção do P«C»P.
— A guerra colonial — criou as condições objectivas, materiais, para viabilizar a opção revolucionária: contribuindo para radicalizar o descontentamento popular e projectá-lo em lutas grandiosas e extremadas fez com que estas, como vimos, colocassem a direcção oportunista perante um impasse que ou resolvia em termos revolucionários, ou solucionava em termos reaccionários, denunciando-se. Mas tal radicalização da luta permitiu igualmente clarificar aos olhos de muitos quadros quais as saídas correctas para a luta e o significado oportunista do recuo da direcção do P«C»P. O agudizar da luta de classes projectou-se consequentemente no interior da própria organização que conduzia o movimento, fazendo estalar no seu seio as contradições latentes e mal encobertas pela «correcção» do desvio de direita. Para os militantes mais combativos e avançados, o grande refluxo a partir de 1963: a destruição maciça dos sectores operários da região de Lisboa e de outras cidades industriais, a vaga de prisões de funcionários de todos os escalões em 63, 64, 65 e 66 e o facto de quase todos (excepto alguns responsáveis) terem falado na polícia, o enorme recuo da luta operária em todo o país, o desmembramento das organizações do Alentejo e o apagamento da luta nessa região tradicionalmente combativa, o desaparecimento da influência nacional do P«C»P e a sua restrição a áreas urbanas localizadas, a degradação do já baixo nível ideológico, a implantação do liberalismo, o legalismo e o direitismo mal disfarçados por pequenos sobressaltos aventureiros, todo este refluxo, como dizíamos, deixou de ter explicação plausível. O descontentamento e a frustração ganham as fileiras mais militantes e jovens do P«C»P: os que não desertaram logo (e na altura foi a maioria) breve o viriam a fazer nos anos subsequentes;
— O corte do PC da China com o revisionismo soviético — será o elemento geral de consciencialização do descontentamento reinante. Apesar das teses chinesas terem sido histérica e demagogicamente combatidas pelo P«C»P, apesar da sua clara aceitação por vários quadros de vanguarda não ter sido nem rápida nem imediata, as críticas anti-revisionistas que elas consubstanciavam, a justeza das posições que defendiam progressivamente confirmadas pelos acontecimentos do movimento nacional e internacional, o facto de elas objectivamente virem responder às necessidades da luta proletária portuguesa, apontando a via que ela devia seguir, viabilizando a formulação da sua nova estratégia e tácticas revolucionárias, permite-nos apontar esta condição como o factor básico que vai dar conteúdo ideológico à tentativa de fracção no interior do P«C»P. Conteúdo ideológico só teoricamente apreendido e desvirtuado na prática. Mas é na base das posições revolucionárias do PC da China sobre a luta anti-imperialista no mundo e a denúncia do revisionismo, que em 63/64 se vão pretender fundamentar a 2.ª tentativa histórica de ruptura com a pequena burguesia dominante na direcção da luta operária e todos os subsequentes esforços que nos anos seguintes e com o mesmo objectivo se ensaiarão. Não nos esqueçamos que além do mais a direcção pequeno-burguesa que desde 60 casava em si mesma a tradição histórica libertária anarco-liberal e oportunista com o revisionismo tal como o apresentou o XX Congresso do P«C»US, tomara a intransigente defesa, desde 1962, das teses soviéticas. Aos olhos dos quadros, o revisionismo internacional e a desmobilização interna não podiam deixar de relacionar-se, tal como a saída revolucionária do impasse nacional e as teses chinesas necessariamente se ligavam;
— Tentativa de uma cisão revolucionária do P«C»P — apoiada num condicionalismo objectivo altamente favorável e na formulação a nível internacional de uma linha revolucionária anti-imperialista, um pequeno núcleo de militantes em fins de 1963-1964, tentou operar do P«C»P uma cisão marxista-leninista. Foi a 2.ª tentativa histórica de romper com a direcção pequeno-burguesa da luta proletária. Não é altura de analisarmos o significado da experiência da FAP que, objectivamente e na prática, se traduziu em mais uma aventura radical da pequena-burguesia, desta vez sob a bandeira do «anti-oportunismo». O que interessa reter para os efeitos desta parte do nosso trabalho é a enormíssima importância teórica da sua imprensa na desmontagem ideológica da linha e da prática do P«C»P e na formulação dos caminhos da Revolução em Portugal, consubstanciados nas etapas da Revolução Democrática e Popular e da Revolução Socialista, na definição do carácter de classe de tais etapas e no papel que nelas desempenha a aliança operário-camponesa. Apesar da sua degenerescência prática, a teoria elaborada pela imprensa central da FAP, constitui a 1.ª formulação proletária da opção anti-oportunista em Portugal e é um património muito valioso da teoria revolucionária portuguesa. É a ela que irá beber toda a luta anti-revisionista desde então travada no nosso país contra o P«C»P. Quer dizer: apesar de frustrada na prática, a tentativa da FAP vem abrir teoricamente o caminho da acção revolucionária contra o oportunismo. Saber adaptar tal teoria às novas condições do capitalismo, ou seja, actualizá-la de acordo com os caminhos que no nosso país a burguesia monopolista vai trilhando, eis o papel da ideologia revolucionária.
A partir de 1963/1964, sob o fogo da crítica marxista-leninista a nível internacional e de uma denúncia anti-oportunista a nível nacional feita por organizações que lhe são exteriores e que não pode recuperar, o P«C»P após uma atitude defensiva em que pretende reivindicar o seu papel «proletário», vai perdendo progressivamente tais veleidades: 1969 é o afundar definitivo e sem remissão no pântano da traição eleitoralista, legalista e de pactuação inter-classista.
Assim, em 1964 e 1965, para responder à perturbação das críticas da FAP o P«C»P vai apressadamente elaborar a sua «teoria da Revolução» em atraso.
Em 1964, pela primeira vez na história, procede a uma exaustiva análise do capitalismo português e da sua estrutura de classes para fundamentar a linha da «revolução democrática-nacional» que passa a substituir o «levantamento nacional» como lema estratégico. Também aí se tenta definir o carácter de classe da tal Revolução e o papel que nela desempenhará o proletariado. Tudo esto se consubstanciou num relatório apresentado por Cunhal ao CC e intitulado «Rumo à Vitória». O «Rumo à Vitória» é de facto o sumo da sujeição do proletariado aos interesses da burguesia média. «Desconhecendo» completamente o carácter monopolista industrial que a base do capitalismo português vinha acentuando desde o pós-guerra, em contraste com a sua natureza comercial, oligárquica e familiar anterior; recusando-se a tirar daqui as necessárias consequências sobre o papel de aliada da média-burguesia ao grande capital nesta nova fase do capitalismo e que a revolução «anti-monopolista», «liberal» e médio-burguesa era um mito historicamente ultrapassado; o P«C»P aponta como objectivo estratégico para a revolução médio-burguesa, de todas as classes «não-monopolistas», de todos os «homens honrados», pondo explicitamente a luta proletária a reboque dos objectivos burgueses e da direcção burguesa. No «Rumo à Vitória» sem dúvida que se define já a natureza de classe da «Revolução» do P«C»P e o papel nela do proletariado: a revolução não visa a democracia nova (?) dos explorados sob a direcção do proletariado revolucionário, como postula o marxismo-leninismo aplicado às condições portuguesas, mas sim as «liberdades fundamentais» e o «regime parlamentar» médio-burguês, em cujas instituições o P«C»P lutaria eleitoralmente por um belo programa de ousadas reformas! A «revolução», na prática, não realizando a aliança dos explorados em torno do seu programa, mas proclamando a unidade destes em torno do reformismo médio-burguês, será portanto conduzida pela burguesia liberal. De facto, o «Rumo à Vitória» adiantou alguma coisa relativamente às águas turvas do «levantamento nacional»: explicitou, a despeito da sua bela fraseologia «revolucionária», o conteúdo de classe burguês e de pactuação da linha política do P«C»P que naquele estava implícito, e que a sua longa prática comprovava.
Os «Estatutos» e o «Programa» do P«C»P, aprovados no VI Congresso de 1965, virão confirmar, mas ainda com menos ambiguidades «revolucionárias», o unitarismo médio-burguês e a sujeição da luta proletária aos objectivos da burguesia. No «Programa» surge a «unidade» da «passagem pacífica» ao socialismo como via possível a adoptar no futuro parlamentarismo burguês e «democrático». Mas repare-se que, tendo estes documentos respondido à pressão das bases sob o fogo de uma propaganda de esquerda eles não só revestem uma cuidadosa fraseologia «revolucionária» como evitam todo e qualquer «excesso» direitista. A via armada continua a ser imprescindível para derrubar o fascismo, o trabalho clandestino é o motor da luta das massas bem como o fortalecimento político da organização e, no «Rumo à Vitória, certas acções armadas de defesa e a auto-defesa são encaradas como possíveis de acordo com os níveis da sequência da luta popular. Isto a par da denúncia do direitismo («perigo não eminente»), e do esquerdismo, «perigo principal». E é nesta linha nitidamente defensiva e oportunista da direcção do P«C»P que se integram certos sobressaltos aventureiros de 1964: as palavras de ordem para o 1.º de Maio de 1964 em Lisboa apelando para a acção armada no meio de uma manifestação de massas, e pondo as organizações de massas e completamente impreparadas a tentar realizar acções de sabotagem, idênticas palavras de ordem na mesma fase na margem sul visando uma espécie de «golpe militar de mão» em Almada e noutros concelhos, o envolvimento da organização de massas em certas regiões em certas acções directas que não podiam realizar e que levaram à cadeia, etc.. Em suma: o querer «concorrer» com a FAP, a pendularidade reformismo-aventura típicas da pequena-burguesia radical e que são susceptíveis de verificar-se simultaneamente e em especial em momentos de refluxo e desespero em que a pequena-burguesia sente perder terreno e base social de apoio.
1966 e 1967 foram anos de grande recuo: prisões de muitos quadros, desagregação progressiva, traições na polícia, etc… A base social operária e camponesa do P«C»P começa a diminuir e a pequena-burguesia urbana toma um papel decisivo na direcção política da organização a nível local e regional.
O advento do marcelismo apanha a luta popular e a organização partidária em acentuada fase de declínio. Mas 1968 e o marcelismo são a luz verde para um novo surto de direitismo sem peias nem disfarces, em que o reformismo pequeno-burguês vem abertamente ao de cima retomando muitas das posições de 56/59.
Ainda que clamando que o marcelismo era o «salazarismo sem Salazar» e um mero «render de guardas de clãs fascistas», ainda que nada percebendo sobre o novo equilíbrio de forças que se gerava no seio do poder em favor da grande burguesia monopolista industrial, ainda que incapaz de compreender que uma nova fase política de tentativa de recuperação da média-burguesia e da pequena-burguesia para o «esforço do desenvolvimento» se abria, com as «descompressões» a certos níveis que isso implicava, o P«C»P vai aproveitar exactamente o novo condicionalismo para se lançar numa euforia legalista e pacifista sem precedentes.
A preparação das eleições em 1968, e as eleições em 1969, fizeram descolar o eixo da actividade do partido para a acção legal de «comissões» e «movimentos» que a despeito de desligados organicamente dos sociais-democratas faziam da sua plataforma de S. Pedro de Muel, das suas «liberdades fundamentais», da sua «solução pacífica do problema ultramarino após ampla consulta nacional» os objectivos de acção. Desmobilizando completamente as massas para uma denúncia revolucionária da farsa eleitoral, dando-lhes na prática a perspectiva de vitória nas urnas e centrando toda a acção no desprezo da luta clandestina e pelo primado do legalismo oportunista, o P«C»P em 68/69 retomou na prática e já sem subterfúgio em certos textos a solução da via pacífica para o derrubamento do fascismo: «ir às urnas para obrigar as pessoas a compreenderem a necessidade de se recensearem nas próximas eleições», «lutar por um grande movimento legal-democrático pós-eleitoral que combatesse pelas liberdades fundamentais de imprensa, de associação, etc…». Centrar a luta no legalismo eleitoralista, assumir objectivamente uma posição neo-colonialista quanto à guerra colonial, sabotar a acção radical de denúncia das eleições, pregar e defender (de braço dado com a burguesia «democrática» e tecnocrata) as «liberdades» como reivindicação praticamente exclusiva da luta, tentar na prática impor a legalidade do P«C»P desmantelando a sua clandestinidade e as suas defesas em «movimentos de oposição» completamente expostos e conhecidos da polícia, animar as massas para a vitória eleitoral: o que é isto senão o vir ao de cima do direitismo pequeno-burguês mais do que nunca implantado a todos os escalões na direcção do P«C»P? O que é isto senão o retomar nítido das teses de 56/59, aliás nunca repudiadas no essencial?
Note-se que 68, 69 e principalmente a grande desmobilização pós-eleitoral vêem surgir pela primeira vez, e espontaneamente, movimentos anti-revisionistas, grupos de contestação e surtos de ideologias trotskizantes e anarquizantes, sintomas do nítido perder de controlo pelo P«C»P da luta popular. O descarado atrelar da luta a objectivos degradantes de oportunismo e direitismo, o estalar do P«C»P por todas as costuras em matéria de segurança e organização, o liberalismo, a mexeriquice e a grupusculização interna, a deserção de sectores inteiros e de funcionários responsáveis, a perda completa de controlo de vários sectores da acção de massas, as denúncias públicas da linha do P«C»P, o rebentar do «trabalho unitário», tudo isto a par de um activíssimo e espontâneo surto de ideologias pseudo-esquerdistas bem como de correctas tentativas localizadas de luta anti-revisionista, tudo isto, dizíamos, permite-nos concluir que o período de refluxo em que o P«C»P mergulhou e o seu corte com as massas operárias e camponesas se tenderão a agudizar sem remissão. A agudização objectiva da luta de classes, conjugada com a aberta traição do P«C»P e a propagação internacional da luta anti-revisionista criaram as condições propícias para que o novo surto da luta popular em Portugal já veja à sua frente uma verdadeira direcção proletária. Direcção proletária que terá que fazer a síntese e a unidade das verdadeiras posições marxistas-leninistas, isolando-se dos frentismos pseudo-radicais, dos aventureirismos, dos anarquismos sem rumo e dos trostskismos, ou seja, permitindo que da dispersão reinante, o proletariado possa, pela primeira vez na história da sua luta, tomar nas mãos a direcção do combate.
No momento em que o P«C»P se afunda em cisões e depurações, no momento em que no desespero pela base popular que vê fugir-lhe dado o seu ultra-direitismo, a direcção pequeno-burguesa se sobressalta em actos aventureiros, neste momento podemos afirmar que o refluxo das condições subjectivas da luta, não tendo terminado, está porém a chegar ao seu fim. Dentro de algum tempo (meses, anos?) o isolamento do revisionismo e do oportunismo em geral, que com ele será arrastado, permitirá à vanguarda da luta operária tomar finalmente a direcção da luta ascendente.
Publicado no BANDEIRA VERMELHA n.º 1 em Dezembro de 1970
(início)
E
5.ª fase: de 1960 a 1962
Em 1959, atingida pelos golpes policiais a que o seu liberalismo abrira portas, internamente dividido, hesitante, sem capacidade de direcção nem popularidade entre as massas operárias e camponesas pode dizer-se que o P«C»P esteve à beira do colapso. Na sua ânsia de o transformar em instrumento de apoio aos objectivos da burguesia, a direcção fora ao ponto de quase o destruir. Ou seja, ao ponto de, retirando-lhe a base de apoio fulcral: a aliança dos operários e camponeses, retirar-lhe igualmente poder de negociação e pactuação interclassista. Um partido enquanto bastião oportunista no seio da classe operária, enquanto neutralizador do seu sector revolucionário precisa de simultaneamente ter penetração e gozar da confiança das massas trabalhadoras e oferecer garantias aos sectores da burguesia com quem pretende aliar-se. Se esta 2.ª condição fora zelosamente cumprida pela direcção, foi-o porém com tanta diligência que começou a fazer perigar a 1.ª; ao perder a base de apoio, o P«C»P tornava a fracção pequeno burguesa radical reformista dirigente isolada na arena da burguesia, retirava-lhe o poder de negociação que lhe advinha do apoio popular.
O oportunismo é neste caso uma ponte entre suas margens, entre duas classes: faltando uma delas, deixa de ter utilidade. Eis o que estava realmente a acontecer.
Isto é extremamente importante, pois é contra os «excessos» ultra-oportunistas, contra os erros mais escandalosos cometidos e contra as suas consequências no quase aniquilamento do P«C»P, como força de mediação interclassista que se vai voltar à «correcção» do desvio de direita. Não é um processo de luta de classes que se instala no seio do partido, mas uma série de correcções das consequências mais graves do direitismo, cujas raízes profundas não são afectadas. Não se tratou de impor uma direcção proletária, mas de rectificar os «absurdos» da direcção pequeno-burguesa podada nas suas posições com quadros novos como seus titulares.
Em que consistiu o processo de «correcção» do desvio de direita?
Fugido de Peniche com um grupo de dirigentes do partido, Cunhal vai liderar em 1960-1961 o processo de «correcção» do desvio de direita.
Em todo ele o que ressalta de forma patente é a recusa em aprofundar as causas dos factos, em os explicar em termos de classe, apontando-os como «ideias de certos camaradas» tal como no período da «política da transição». Atacam-se as manifestações, aborda-se por vezes a sua natureza de classe, mas tudo fica pela rama como se tivesse sucedido por acaso, na intenção deliberada de evitar uma ruptura e uma denúncia completa da direcção pequeno-burguesa. É extremamente sintomático que nas suas reuniões de Fevereiro e Dezembro de 1960, o P«C»P se tenha limitado à crítica nos aspectos organizativos e de estilo de trabalho, sem tocar na natureza política do desvio, que só veio a ser tratado enquanto tal em Março de 1961, e pelos documentos desta altura (ver nota1) se apercebe a verdadeira natureza da «correcção». A saber:
1.º – Quanto à «solução pacífica»: na sequência da «correcção» do desvio de direita espalhou-se a ideia de que o P«C»P a esta «solução» passaria a contrapor a via da Revolução Armada. Não foi isto de forma alguma que aconteceu. Não só se aderiu plenamente à tese do XX Congresso (possibilidade de passar ao socialismo pacificamente pela via parlamentar) como se considerou que tal tese conservava «completa validade e abriu aos partidos comunistas operários amplas e novas perspectivas» tendo simplesmente sido aplicada mecanicamente a Portugal. Aderiu-se ao pacifismo revisionista plenamente, só que se entendeu não ser ele aplicável às condições então existentes da ditadura fascista. De facto mesmo nas condições de ditadura fascista considerou-se que «em momentos muito especiais» tal «solução» era viável. Considerou-se mesmo terem tais condições existido em Maio-Junho de 1958 e que até à penúltima semana da Campanha eleitoral daquele ano «foi justo admitir-se e insistir-se na luta por uma solução pacífica». (o desvio de direita no P«C»P … pág. 20).
O uso do pacifismo, para tais correctores, não estava no pacifismo em si, no que ele representava enquanto conceito de pactuação e despolitização, mas no facto de se ter centrado a luta nessa perspectiva sem quase nunca ter havido condições para tal: «foi uma orientação que não teve em conta as realidades», nada mais! A sabotagem e traição da luta popular? O trabalho degradante e contra-revolucionário que paralisou o processo insurreccional? Tudo fruto de uma «orientação que não teve em conta as realidades…»‼
Sim, porque o partido continuava a ser pela solução pacífica: «O Partido deve insistir em que é seu desejo uma solução pacífica do problema político português e em que tal solução é possível em determinadas condições», (sublinhado nosso) (o desvio de direita no P«C»P … pág. 20), que tais condições devem ser procuradas e que há que «não desprezar quaisquer possibilidades de resolver o problema político sem um choque armado e violento». Só se o fascismo se não deixar derrubar, só se ele resistir, então é que terá de ser derrubado pelas armas. Na conjuntura de então era essa a perspectiva.
Quer dizer: não se atribui ao pacifismo uma natureza de classe, nem de forma alguma se nega o seu papel como via preferencial para a vitória do proletariado sobre ditadura de classe da burguesia, tal como defendia o desvio de direita. O nó da discordância está numa errada avaliação da situação (afinal o fascismo não estava a «desagregar-se») e, consequentemente, numa incorrecta aplicação táctica de uma palavra de ordem absolutamente válida (se o fascismo estivesse a desagregar-se). O facto de se dizer que «tudo indica o que o fascismo nos tempos mais próximos não virá a ceder pacificamente», em nada invalida o carácter anti-científico e anti-marxista da tese central que permanece válida, depois do desvio de direita: a via pacífica é possível, é desejável e é preferível; só se o fascismo não quiser é que não se aplicará. Para a nova direcção o erro residiu em se pensar que aquela, nas condições então vigentes, tinha sido possível: todos os desastres consequentes foram fruto deste «erro de apreciação» desta «aplicação mecânica» das teses do XX Congresso. Legalismo, golpismo, ultra-pacifismo, tudo resultaria deste «fechar os olhos à realidade». Repare-se portanto que a luta armada é na prática apresentada como o último e indesejável recurso da luta popular e não como uma via necessária e inevitável decorrente da própria natureza do estado fascista. «… o levantamento de toda a nação portuguesa que é de desejar imponha sem necessidade do recurso à violência a instauração das liberdades democráticas, mas que assumirá o carácter violento de um choque armado, caso o governo se lhe oponha pela violência» (o desvio de direita no P«C»P …). A porta do pacifismo continuou amplamente aberta: por ela, pouco mais tarde voltariam a entrar, é certo que melhor disfarçadas, todas as concepções e práticas legalistas e direitistas que os pequenos burgueses de então não tinham sabido disfarçar e comedir devidamente. Esse é o seu erro principal, para os cunhalistas.
2.º – quanto à reposição do conceito de «levantamento nacional»: a reposição do conceito de «levantamento nacional», «embora não seja de excluir a solução pacífica», não significa nunca na linha da nova direcção o reconhecimento da luta armada como via oposta à «solução pacífica» dos ultra-direitistas. Insistia-se, por oposição ao legalismo constitucionalista, na necessidade de «derrubar» o fascismo «através do levantamento em massa da nação», mas este «levantamento em massa» era e sempre foi algo de indefinido, uma «onda popular» de características vagas, que, a ser bem conduzida, viria mesmo a excluir, como vimos, o recurso à violência: «Essa orientação (o levantamento nacional) não afasta a possibilidade de uma solução pacífica, antes pode fazer desta uma real possibilidade. A solução pacífica do problema político português será tanto mais uma possibilidade quanto menos ilusões se criarem acerca da sua facilidade e viabilidade (?) (…) quanto mais ganharmos as massas populares para a ideia de que, para derrubar o governo fascista será necessário o levantamento de toda a nação portuguesa (…). Quanto mais o movimento popular ameace, pelo seu poder, derrubar (com a força se tal se impuser) a ditadura fascista, mais possibilidades há de surgirem condições para uma solução pacífica» (O desvio de direita no P«C»P. … pág. 20, sublinhados nossos). Para os cunhalistas a violência continua a não ser «parteira da história», mas a reserva a que os «comunistas», contrariamente, terão de recorrer se o fascismo resistir militarmente a um «avassalador» movimento popular, que nunca se explica, nem bem nem mal, em que consistirá.
Dizer: «devemos preparar as massas para derrubar o fascismo violentamente se não houver outro remédio, mas este surgirá (a solução pacífica) se ao legalismo opusermos a luta de massas» é o mesmo que afirmar: «a solução pacífica está certa, mas nas actuais condições tácticas o caminho de chegar lá não é a vitória eleitoral ou a campanha pacífica para derrubar o Salazar, mas sim a luta de massa». Ou seja: entre a nova e a antiga direcção está unicamente uma «errada avaliação» das condições tácticas. Objectivamente, isto indo à real natureza da «crítica» ao desvio de direita, independentemente da sua fraseologia esquerdizante e pseudo-revolucionária.
Vago quanto aos métodos, o «levantamento nacional» era-o num aspecto ainda mais grave: quanto à natureza de classe, quanto ao papel da aliança operário-camponesa na sua condução. Vejamos melhor este aspecto.
3.º – Quanto à política de unidade: como vimos a «política de unidade» dos ultra-direitistas traduzira-se no abandono puro e simples do papel dirigente da frente de classes por parte do bloco operário-camponês e sua entrega à burguesia liberal. Isto, dado o desprezo votado à condução da unidade popular, em troco da tentativa de praticar «uma unidade ainda mais ampla» (do «Informe Político» ao V Congresso do P«C»P, em 1956), dado que a base unitária de 1943-1949 (MUNAF e MUD) «tivera um carácter exclusivamente democrático» (‼) (de «A situação política actual e a posição do P«C»P, doc. Do CC, Outubro de 1956). Ou seja: tentar chamar à unidade os «elementos não democráticos» (ou seja, anti-democráticos!), os fascistas dissidentes, e colocar-se à trela de tais dissidências. Quer dizer: se era correcto ainda nesta altura organizar a luta unitária contra o fascismo na base de uma aliança de todas as classes não monopolistas, os ultra-oportunistas não acharam isto suficiente: na base da «desagregação irreversível» centraram todo o seu esforço unitário na sedução dos elementos reaccionários e fascistas descontentes com o salazarismo!
Mas que correcção fizeram os cunhalistas?
a) Não criticaram em si, antes pelo contrário, a ligação aos fascistas dissidentes, mas sim o seu excesso: «a ideia do alargamento da unidade é justa. A evolução da situação política criou condições nos últimos anos para atrair à luta pela instauração em Portugal da liberdade política sectores que antigamente mantinham uma atitude de reserva ou suspeição em relação ao movimento democrático. (…) O mal (…) foi pensar-se que o estímulo à acção dos elementos conservadores poderia substituir ou sobrepor-se à unidade das forças democráticas» («o desvio de direita do P«C»P…», pág. 22 – sublinhados nossos). Os cunhalistas deram conta de que alguma coisa mexia, em 1958-59 e a partir de aí, na tradicional base social do regime. Mas levaram tudo à conta, não da evolução do próprio capitalismo e do diferente equilíbrio de estratos dominantes que se começava a gerar, mas de «dissidências de opinião» que interessava meter no saco da unidade: o erro não estava em o P«C»P se aliar a um esboço nascente de uma nova fracção do irredutível inimigo de classe, o capital monopolista, mas em se aliar predominantemente a ele! Por isso mesmo:
b) Foram incapazes de traduzir em termos de uma análise marxista as transformações do capitalismo português a partir da década de 50 e sua consequência no esquema de alianças interclassistas: não souberam detectar o surto da base industrial e monopolista do capitalismo português, a substituição da oligarquia familiar monopolista-latifundiária por um capitalismo monopolista industrial altamente concentrado como forma dominante, cuja evolução anulava a etapa histórica da revolução conduzida pela média-burguesia, falida como classe «revolucionária» e que a partir de aí começava a jogar dentro do sistema para nele partilhar, como classe capitalista, da sua fatia na exploração. As eleições Delgado foram a última oportunidade de realizar a unidade dos explorados com todos aqueles que eram impedidos de explorar. Mas recusando a consequência política da restrição do esquema de alianças (pois se nem dos dissidentes do regime se quiseram desligar!) os cunhalistas continuam a meter no mesmo saco todas as forças «não-monopolistas», incluindo logicamente, as que a partir desta fase se começam a definir como inimigas dos objectivos unitários das classes exploradas.
c) Continuam a não definir o carácter de classe da unidade no «levantamento nacional» e a não afirmar relativamente a ela o papel dirigente do proletariado: se o «levantamento nacional», como vimos, como instrumento de luta é uma coisa totalmente indefinida, a unidade que ela pressupõe permanece estabelecida em critérios anti-científicos e oportunistas: não na base de uma análise de classes, das suas inter-relações e interesses, mas como «todos os partidos, agrupamentos e individualidades que representam os interesses das classes que se opõem aos monopólios» (O desvio de direita no P«C»P…, pág. 21). Em termos de «forças políticas», «correntes de opinião», mas não de classes, que aliás, de resto, se não analisam. E, se quanto ao papel do proletariado, o P«C» passou a reconhecer ter o desvio de direita conduzido à sua «subestimação», «redução» e «apagamento», dizendo que ele deve passar a ser «determinante», nunca se afirma, político-ideologicamente, como tinha de se fazer à luz do marxismo-leninismo, que este papel não é só determinante como dirigente da unidade popular e democrática.
Mas, repare-se, como o poderiam ter feito? Mantendo o proletariado à trela dos interesses reformistas da burguesia liberal, que nesta fase deixam de ser redutíveis a uma plataforma de unidade táctica com as classes exploradas, mantendo em luta o povo por objectivos que são essencialmente os de uma classe que deixa de ser sua aliada para o ser dos monopólios, como se poderia afirmar o papel dirigente da classe operária neste processo? Ficaram pelo «determinante»: mais coerente e menos assustador para os seus aliados «não-monopolistas».
4.º – Quanto à exploração colonialista: se, desde sempre, e em particular no «desvio de direita», a exploração dos povos coloniais nunca foi óbice para a direcção pequeno-burguesa confraternizar «democraticamente» com os estratos colonialistas da pequena e média burguesia, também os cunhalistas continuaram a fazer letra morta e a omitir completamente o papel do P«C»P e do seu dever de solidariedade internacionalista com os povos coloniais. Só com uma diferença: é que em 1961 estala a rebelião armada nas colónias. À pressa o P«C»P virá gritar o seu internacionalismo, na prática nada se alterará: não prejudicar o unitarismo médio-burguês com uma atitude internacionalista; melhor: trair a sua solidariedade com a luta revolucionária anti-colonialista em favor dos interesses coloniais consubstanciados na plataforma unitária imposta pela burguesia média e ao seu serviço.
A partir de 1961 a traição da solidariedade internacionalista tem uma cínica particularidade relativamente ao «desvio de direita»: tem de verbalmente, demagogicamente, apregoar-se de anti-colonialista. No fundo são os interesses neocolonialistas da média e pequena burguesia que se defendem.
5.º – Quanto ao estilo de trabalho e organização: neste campo pode dizer-se que a crítica, tendo sido mais completa, continua ao nível das manifestações externas e das explicações das coisas na base das «concepções erróneas». Vai-se no entanto operar um reforço da organização do P«C»P e os seus processos de trabalho. Bem cedo, fruto da demagogia e superficialidade de todo este processo crítico, a reposição dos princípios do «centralismo democrático», devidamente esvaziado do seu conteúdo ideológico revolucionário, vai servir como instrumento autoritarista de uma fracção oportunista, impedir a crítica de base e esmagar à nascença toda a tentativa de superação marxista-leninista do impasse.
6.º – Quanto ao trabalho teórico e baixo nível ideológico da organização: se bem que detectado, se bem que relacionado com o desvio de direita e com a sujeição do movimento operário à linha da burguesia, ele vai permanecer fundamentalmente inalterado. Se o desvio de direita «corrigido» não pelo processo de uma intensa e aprofundada luta ideológica, não pelo processo da luta de classes no seio do P«C»P, mas por intermédio de um compromisso resultando numa crítica frouxa e oportunista, de tal crítica não se poderia abrir caminho para um reforço do nível teórico e da vigilância revolucionária do P«C»P. Se ao oportunismo degradante e abertamente contra-revolucionário se substitui um outro só formalmente diferente mas melhor escondido, logicamente continua a não ser do interesse da nova direcção elevar a consciência política dos quadros e das organizações. A ausência de discussão política e de estudo e a impreparação teórica da esmagadora maioria dos quadros vão-se manter e, com a agudização das contradições, acentuar e alimentar: este é um dos sintomas mais nítidos e reveladores do carácter oportunista, superficial e ele próprio pequeno-burguês do que se chamou a «correcção do desvio de direita».
Podemos pois agora tirar algumas conclusões sobre tal «correcção»:
— A despeito de se ter traduzido num certo número de expulsões e despromoções a «correcção do desvio de direita» não acabou (nem isso pretendia) com o direitismo no P«C»P nem arrancou e eliminou as posições de direcção da pequena-burguesia radical-reformista no seio da organização: sem tocar, na maioria dos aspectos essenciais, na verdadeira raiz ideológica dos desvios, sem atentar contra a base das concepções direitistas, limitou-se a criticar e corrigir os excessos, o levar demasiado adiante de posições cuja natureza se aceita. Daí se ter a clara percepção de se pairar numa crítica demagógica e oportunista dos efeitos para disfarçar as causas;
— Isto significa que tal correcção foi, ela também, da direita oportunista: visou reforçar o P«C»P não para o afirmar como vanguarda proletária revolucionária, mas para impedir que, pelo ultra-direitismo, ela viesse a perder o apoio popular e a deixar de ter base de negociação com a burguesia a quem continua atrelado;
— A natureza da «correcção» do desvio de direita traduziu-se em última análise num reforço da pequena-burguesia na direcção do movimento: neutralizando, por uma crítica verbalista e formalmente esquerdizante, a radicalização do descontentamento das bases e suas consequências revolucionárias; radicando ainda mais fortemente o reformismo, posto que simulando formalmente a sua irradicação melhor e mais demagogicamente ele foi encoberto e disfarçado e instalado; melhorando a inserção das massas e aumentando, consequentemente, o poder de negociação com os restantes sectores da burguesia.
Com um novo figurino terminológico, com uma prática mais dinâmica e activista, tendo realizado no essencial uma certa unidade no P«C», a pequena-burguesia parte para nova caminhada: em breve os acontecimentos a ultrapassarão fazendo-a tirar a máscara…
Hoje, conhecida a experiência do período que sucedeu à «correcção» do desvio de direita é-nos possível sintetizar tal prática em certas conclusões teóricas, é-nos possível, nomeadamente, perceber como os acontecimentos posteriores vão, em boa parte, radicar no oportunismo da crítica de 1961. Nem sempre foi assim: a maioria (nem todos, como veremos) dos quadros que se lançaram à luta contra o direitismo, não se aperceberam da natureza oportunista de tal luta. Mais: representando ela em vários aspectos a denúncia de oportunismos escandalosos mais imediatamente sentidos e o reforço dos métodos do trabalho e organização, tal crítica mobilizou muitos quadros do P«C» num esforço reorganizativo que lhe permitiu retomar em boa medida a confiança popular e conduziu a um vasto incremento e alargamento da organização a níveis que talvez nunca tenha alcançado, nomeadamente nas grandes concentrações operárias. A «correcção do desvio de direita», apesar da sua índole reformista está na origem de um importante movimento de inserção do P«C» nas massas e dum reforço objectivo do seu papel dirigente da luta. Reforço politicamente assente em pés de barro: mas reforço efectivo que resultou da «correcção» de certas posições e métodos cujo desaparecimento (embora aparente) só por si e nesse momento fez crer a uma organização ideologicamente débil que o direitismo estava de facto morto. Reforço facilitado também pela própria evolução da situação do capitalismo português: no advento dos anos 60 assiste-se a um importante surto de industrialização e concentração de empresas nas regiões do Porto, de Lisboa e Setúbal. A diminuição decisiva do peso do artesanato industrial a favor das grandes unidades gera uma cintura proletária naqueles distritos numerosa e politizável, que, juntamente com o proletariado rural alentejano e ribatejano e certas camadas da pequena-burguesia urbana vão travar importantíssimas batalhas que originarão simultaneamente uma importante viragem no movimento revolucionário português. Por outro lado, com a eclosão da guerra colonial e o agravamento das condições de vida, a intensificação da exploração e o aumento constante da repressão, generaliza-se o descontentamento a largas massas populares, radicaliza-se e agudiza-se a luta de classes. Condições objectivas favoráveis, fortalecimento das possibilidades subjectivas, tudo se conjuga para se poder definir um nítido ascenso da luta popular que entra numa clara fase de fluxo.
As eleições para deputados em Novembro de 1961 foram o primeiro sintoma de tal ascenso: na linha unitária «ampla» e de direita da «correcção», o P«C»P concorreu em unidade com sectores liberais e burgueses manifestamente reaccionários e anti-populares, nomeadamente ligados a interesses colonialistas, monopolistas e de grandes agrários (Directório de Acção Democrato-Social). No entanto, tal participação, ainda que na plataforma médio-burguesa, teve um carácter de independência e autonomia que nunca tinha assumido desde 49. O P«C» manobrou com notória posição de força, e transformou as eleições numa importante luta de massas contra a farsa eleitoral e o fascismo, num processo em que a burguesia foi completamente marginalizada e ultrapassada: as manifestações de rua em Lisboa, sucedendo-se em rimo crescente e trazendo cada vez mais pessoas, e, principalmente as memoráveis mobilizações operárias da margem sul fizeram descer à rua milhares de trabalhadores em Almada, na Cova da Piedade, etc., num afrontamento directo com a GNR de que resultaram mortos, assaltando a esquadra de Almada da PSP, apedrejando os centros de votação, etc., foram sintoma certo do crescendo da luta popular.
Depois das manifestações de 31 de Janeiro e do 8 de Março no Porto, em Março de 1962, desencadeia-se e rapidamente se radicaliza e estende a todo o país a luta dos estudantes de Lisboa que a burguesia tenta desesperadamente manter isolada da luta popular, em parte sem êxito.
Com uma forte organização nacional o P«C» lança então as jornadas de Maio: no dia 1.º de Maio, em Lisboa, Setúbal, Almada, Porto, Aljustrel e todo o Baixo Alentejo, centenas de milhares de trabalhadores, recorrendo a processos de auto-defesa artesanais, enfrentam as forças da PSP, da GNR, da LP e da PM em verdadeiras batalhas de rua cuja intensidade e extensão ultrapassam em tudo as melhores previsões. Todo o mês de Maio de 1962 marca uma viragem decisiva da luta das massas: as lutas operárias nas concentrações industriais, as greves e manifestações estudantis, os levantamentos camponeses pelas 8 horas de trabalho atingem então o seu ponto máximo, desdobrando-se em acções espontâneas e não controladas. Se bem que não se tenha atingido um estado pré-insurreccional como em 1958 (em 1962 o poder estava firmemente coeso no esforço repressivo), atingiu-se sem dúvida o limiar de um certo tipo de luta que, note-se, não era já dirigida pela média-burguesia, como em 1958, mas indiscutivelmente pelo P«C». Deve notar-se, porém, que apesar da direcção residir no P«C» isso não significa que esta tenha sido revolucionária: que a radicalização da luta tenha sido dirigida ou desejada pela direcção daquele. O entusiasmo de uma organização em aparente ruptura com o direitismo, a existência de excelentes condições objectivas, fizeram as lutas atingir limites que ultrapassavam em tudo os interesses da pequena-burguesia dirigente do P«C» e ultrapassava porque a partir deste momento gera-se na organização, ou nos mais militantes sectores dela, a consciência da necessidade de se saltar qualitativamente nas formas de luta, de que se tinha atingido o limiar de um processo de luta e que para radicalizar o combate e mantê-lo em ascenso era preciso começar a conjugá-lo com a acção armada. Melhor: que o centro de gravidade da luta de classes começava a deslocar-se para a luta armada, ante as novas condições existentes. Mas desta conclusão fugia desesperadamente a direcção do P«C»: adoptá-la seria fazer estalar toda a estratégia de «levantamento nacional», toda a «política de unidade», ou seja, todo o compromisso com a média burguesia. Seria, em última análise, fazer enveredar o movimento pela via revolucionária e pela liquidação, a curto prazo, da fracção pequeno-burguesa dirigente.
Da solução a dar à continuidade das lutas dependeria o julgamento da própria utilidade futura que elas tivessem: o arranque para um surto revolucionário ou um salto no vazio cuja frustração e desmobilização lançariam fatalmente a luta popular num novo período de refluxo. As duas saídas não eram porém meramente tácticas. Como vimos, elas prendiam-se à própria estratégia da luta do proletariado e ao papel nela do P«C»; o seu confronto fazia pois surgir à luz do dia e com clareza a natureza reformista da direcção contra a fracção nesse momento revolucionária. Originar tal confronto e o fim das ambiguidades foi o fruto necessário da radicalização da luta de classes de 62. Mas a incipiência das posições revolucionárias, a fraca vigilância de classe do geral das organizações do Partido, o baixíssimo nível teórico dos quadros, a predominância teórica e prática das posições pequeno-burguesas reformistas não deixava ilusões sobre o desenlace da luta: a pequena-burguesia manteve as suas posições, frustrou as lutas e lançou o movimento num profundo refluxo político e organizativo. Pagas com uma grande desmobilização popular, as lutas de 62 terão o mérito de tirar a máscara à direcção reformista e de vir a viabilizar a 2.º tentativa histórica de ruptura com a pequena-burguesia na direcção do movimento operário.
(início)
D
4.ª fase: de 1956 a 1959
A luz verde para o despertar oportunista vai ser dada pelo XX Congresso do Partido «Comunista da URSS. Tendo esta reunião marcado o início do assenhoreamento da direcção do P«C»US por uma fracção revisionista que daí em diante irá iniciar o processo de reconstrução capitalista em vários países socialistas e originar o aparecimento de uma nova burguesia naqueles países, ela representa igualmente, a nível do movimento comunista internacional quer a sanção para o oportunismo já reinante nos principais partidos da Europa Ocidental e da América Latina, quer o incitamento ao revisionismo internacional para despertar do seu torpor disfarçado. A linha de pactuação com o imperialismo consubstanciada no entendimento e na prática revisionista da «coexistência pacífica» e na teoria das «soluções pacíficas» é o produto internacional de uma vasta ofensiva do direitismo, das pequenas burguesias radicais, das aristocracias operárias, etc., com vista a dominar as organizações proletárias nacionais.
Perante a favorável conjuntura internacional, e aproveitando a fraqueza estrutural e conjuntural do P«C»P, a pequena burguesia radical-reformista dominante passa, imediatamente a seguir ao termo do Congresso, à acção, assenhoreando-se rapidamente, sem a mais pequena dificuldade ou qualquer resistência séria, da completa e exclusiva direcção política do P«C»P o que atesta bem a insignificante vigilância ideológica e revolucionária existente na organização.
Logo em Maio de 1956, na 1.ª reunião do CC a seguir ao XX Congresso, se fala num amplo movimento de unidade antissalazarista que «criará condições para a solução pacífica do problema português». Seguidamente a «solução pacífica» é erigida em princípio oficial, em linha política oficial do P«C»P que expressamente a consagrou no V Congresso (III Ilegal) do partido.
A partir desta altura até aos nossos dias vamos pois assistir ao crescimento harmónico da tradição libertária, reformista ou anarquizante e da fraternidade inter-classista, característica do oportunismo histórico da pequena burguesia radical portuguesa, com as concepções revisionistas de pacifismo e pactuação com a burguesia, qua a partir de 1956 dimanam do P«C»US para grande número de partidos de todo o mundo. De características diferentes, estas concepções vão fundir-se em definitivo na linha de direcção do P«C»P, manifestando-se sem qualquer disfarce até 1959, em cambiantes e variações diferentes em torno da mesma raiz burguesa. A isto se chamou mais tarde o «desvio de direita». Aprofundemos um pouco este tema, cujos ensinamentos que fornece são enormemente pedagógicos para uma luta actual.
A linha política do «desvio de direita»
Tal como na «política de transição» o cerne do «desvio de direita» é a pretensão declarada de pôr a luta popular ao serviço dos interesses reformistas, legalistas ou golpistas da pequena e média burguesia, pela negação do papel condutor da aliança operário-camponesa na luta democrática e pela explícita sabotagem dos objectivos e interesses específicos do proletariado.
Se tal linha, aquando da «política de transição» não pôde ser imposta claramente pela pequena burguesia por circunstâncias que vimos, permanecendo no entanto sob disfarces verbais radicais, agora, ante condições novas, vai ser abertamente aplicada: o refluxo da luta popular, a fraqueza das concepções revolucionárias no seio do P«C»P, o aval revisionista internacional, fazem a pequena burguesia dirigente tirar a máscara e perder a vergonha…
Mas que teoria forjaram os direitistas neste seu eufórico despertar?
Com base nas decisões do XX Congresso do P«C»US (que preconizava possibilidade de passagem pacífica do capitalismo ao socialismo) a partir de Maio de 1956 e definitivamente com o V Congresso em 1957, a direcção do P«C»P passou a defender como linha oficial a tese da «solução pacífica para a substituição do regime». De início esta tese substitui a linha do «levantamento nacional». Para «justificar» tal «solução» os ultra-direitistas proclamaram a «desagregação irreversível» da ditadura fascista: uma «análise nova» da correlação de forças mundiais e nacionais, possibilitava concluir que o regime estava em vias de «completa desagregação» e que a tarefa central do partido se devia centrar, não na luta independente das massas, sob a direcção operário-camponesa, mas no esforço para «aprofundar as contradições internas do regime». Por essa via o salazarismo acabaria por cair pacificamente, toda a luta popular devendo ser orientada com vista a agravar esta «decomposição política irreversível». Esta tese fundamentalmente idêntica à da «teoria da transição» e da iniciativa dos mesmos quadros que então por ela se bateram levam igualmente, com idêntico despudor, à mesma traição escandalosa: «desligar do salazarismo os fascistas descontentes», «mobilizar os jovens da MP contra os dirigentes e estabelecer acordos com os legionários», «não fazer ataques frontais como atá aqui, à UN, à Legião Portuguesa, à Assembleia Nacional, mas sim aos elementos mais reaccionários que se encontrem aí», etc. …, etc. … (Proposta de «Ramiro», elemento da direcção, ao CC do P«C»P em Abril de 1956 «sobre a orientação política do partido», propostas essas essencialmente adoptadas no V Congresso em 1956).
Em vez de centrar a política de unidade, assente na aliança operária-camponesa, na unidade das forças democráticas não monopolistas, o que durante esta fase do capitalismo podia continuar a considerar-se correcto, os reformistas lutaram sim por obter o apoio dos «fascistas dissidentes» (‼!) com vista a piorar a «desagregação» e criar uma unidade numa «base ainda mais larga». O resultado desta «preocupação» foi colocar mais uma vez as lutas populares sob a direcção e ao serviço do poder de negociação da burguesia liberal que melhor as captou; foi pôr os operários e camponeses na esteira do constitucionalismo e reformismo burguês, ou dividi-los sabotando a sua aliança, dado o grande controlo ideológico que se deixou a burguesia obter sobre as massas, nomeadamente no campo. Eis a que limites de degradação levou o domínio pequeno-burguês, ainda sem os períodos de linguagem que hoje tem, forte do aval revisionista soviético e internacional. Portugal foi um dos exemplos típicos em que a «solução pacífica» do XX Congresso, reforçou e explicitou a passagem para a coexistência inter-classista, e, mais do que isso, para sujeição da luta proletária à direcção da burguesia.
A partir desta fase de traição aberta e vergonhosa da luta proletária, nunca mais a pequena burguesia abandonou o controlo estreito da direcção do P«C»P, ainda que para tal tenha tido que recorrer a «correcções» e a «denúncias» dos «excessos» nesta fase cometidos. Por seu intermédio, e a partir dela, se inculcaram na luta popular profundas marcas e vícios oportunistas de toda a ordem: o legalismo, o golpismo, o liberalismo, etc. … etc. … que ainda hoje pesam decisivamente na prática revolucionária e nova do proletariado. Isto, aliado ao cepticismo e à descrença que as miseráveis traições estão cometidas relativamente às grandes batalhas populares originaram nas massas, eis o balanço do controlo radical pequeno-burguês do P«C»P, eis o seu «contributo histórico» à luta do proletariado português, na altura em que os seus caciques preparam as comemorações gastronómicas e folclóricas do seu 50.º aniversário.
Três formas diferentes de oportunismo pacifista-revisionista marcaram este período:
1.º) o oportunismo legalista: campeou antes e durante as «eleições» presidenciais de 1958 e consistia na afirmação de que a «solução pacífica» possibilitada pela «desagregação» residiria num «triunfo eleitoral das forças democráticas» (?!): «na base da mais ampla unidade, as próximas eleições (tratam-se das eleições para deputados para a AN em 1957) permitirão a condução de uma campanha suficientemente poderosa para arrancar ao regime as liberdades fundamentais…» afirmava o CC explicando «que isto é possível mesmo dentro de um regime ditatorial e fascista prova-o a vitória da oposição na Grécia em Fevereiro deste ano…» (Resolução do CC do P«C»P de Maio de 1956). Tal foi a orientação dominante durante a campanha eleitoral de 1958: «concorrer à boca das urnas, sem condicionalismos prévios», determinou o V Congresso. Todas estas posições e linhas, que nada têm a ver com o marxismo-leninismo, ou mesmo com a mais elementar consciência política proletária, que não passavam de subprodutos ultra-oportunistas que só num partido sem qualquer espécie de vigilância revolucionária conseguiriam triunfar, levaram à completa castração e frustração das imensas batalhas populares desta época que conduziram o país a um estado pré-insurreccional. Cabe à direcção do P«C»P a responsabilidade histórica de ter intencionalmente abortado e traído um possível assalto insurreccional ao poder. Foi pois intencionalmente que não preparou, que sabotou, que desaconselhou de preparar formas superiores de luta que respondessem à burla eleitoral em que «não acreditava»: «… falar ao partido e às massas na necessidade de preparação de greves para depois do acto eleitoral seria admitir com antecedência a ideia de uma derrota…» dizia o CC (Relatório da Comissão Política do CC, apresentado na reunião do CC de Agosto de 1958).
Durante todo o período eleitoral, em que as massas foram muito mais sensibilizadas e dirigidas pelos «leaders» da oposição burguesa, foi esforço constante do P«C»P evitar todo o «excesso» que estragasse o arranjo com os interesses da burguesia liberal: os levantamentos de unidades militares foram abafados, as greves desaconselhadas (é sabido que na cintura de Lisboa, na margem Norte, foram-no, sob pressão de quadros do P«C»P, empresários e donos de fábricas (‼)), as acções radicais condenadas. Interessava, isso sim, ganhar as eleições! Depois da burla foi a desorientação, a desmobilização: as massas lançam-se para greve por iniciativas pessoais de grupos mais destacados ou de organizações locais do P«C»P. A direcção vem a reboque, atrás dos acontecimentos que não previra nem desejara. Desalentadas, sem perspectivas nem condução, conscientes da imensa fraude que tinham sido vitimas, as massas populares desmobilizam-se e recuam. O poder entretanto contra-ataca e retoma as suas posições.
2.º) o oportunismo golpista: surge após a «desilusão» eleitoralista e traduz-se na negação do papel motor da aliança operário-camponesa e das massas populares no derrubamento do fascismo e na atribuição desse papel aos «dissidentes do regime», neste caso, militares, oficiais «desiludidos» com a situação. Estes, na boa lógica da «desagregação irreversível», apeariam a ditadura por golpe militar, mas também «pacificamente», sem derramamento de sangue: uma revolta de palácio‼
Centrando as esperanças nos golpes militares dos sectores conservadores da burguesia, a direcção do P«C»P, a eles sujeitou a sua acção. O objectivo é o mesmo: evitar e castrar a iniciativa e os objectivos próprios da classe operária e seus aliados; pô-los a reboque, neste caso, do «putschismo» que substitui as urnas como «instrumento revolucionário»; evitar que as massas com as suas lutas radicais estragassem o belo arranjinho da pequena e média burguesia, cujos interesses seriam bem protegidos «na lei e na ordem» pela «disciplina e aprumo» das forças militares insurrectas. Chamava a isto o CC «a conjugação da acção das massas e das forças amadas…», «o movimento militar e popular» em que as «acções civis», da iniciativa do P«C»P , e estariam sujeitas e subordinadas em tudo ao Movimento Militar Independente, no qual o partido não participava e cujos planos até desconhecia! Ou seja: retomando a tradição golpista-anarquista profundamente enraizada no passado na classe operária e de novo amplamente espalhada nas massas, o P«C»P adoptou-a como linha táctica oficial em dado momento com a «particularidade» de todos os aspectos da condução do golpe fugirem completamente ao seu controlo para as mãos da burguesia conservadora. Em Março de 1959 o MMI falha o «putsch» (o golpe da Sé de Lisboa) e a direcção do P«C»P tem de arranjar nova «saída pacífica»…
3.º) o oportunismo ultra-pacifista: desiludida com os insucessos golpistas, a direcção do partido enceta então em Maio de 1959 a «Campanha para a demissão de Salazar» que culminaria como «expressão máxima» da «Jornada Nacional Pacífica para a demissão de Salazar» (‼!). tal «Jornada» que «forçaria Salazar a sair do Governo» (!?) revestiria a forma, à semelhança dos «irmãos» revisionistas espanhóis, duma «greve geral política de carácter pacífico». Tudo sempre na perspectiva de forçar a «desagregação irreversível» do regime que, evidentemente, continuava a acentuar-se sem cessar!
O oportunismo legalista desta fase dispensa comentários alongados: o inimigo não é uma classe, é Salazar (como aliás em todo o período); e o pacifismo vai ao ponto de considerar que as estruturas quebrariam por si numa altura de grande refluxo da luta popular e de forte incremento repressivo e recomposição das forças e grupos dominantes. Se, por natureza, as «saídas pacíficas» são teorias anti-científicas que fazem letra morta da análise marxista-leninista do carácter do estado capitalista, para pregar o pacifismo e a coexistência de classes antagónicas, no caso português, elas foram ao ponto de fazer carreira numa ditadura fascista e num período de terrorismo policial.
É por esta altura que, aproveitando a ambiguidade da linha do «levantamento nacional» a direcção entende poder reeditá-lo sem perigo de «equívocos» acrescentando-lhe a natureza de «pacífico».
Profundamente atingido nos seus quadros, impopular, desligado das massas operárias e camponesas, vemos surgir então todo o reportório terminológico, demagógico e triunfalista que, em vão, se pretendia esconder o desastre em que se afundava o movimento proletário.
O «desvio de direita» e o estilo de trabalho
É também extremamente importante para a futura compreensão de todo este processo, conhecermos o que foram 3 anos de estilo de trabalho ultra-liberal e oportunista.
A fracção pequeno-burguesa, em 1956, perante o descrito condicionalismo favorável, reforça facilmente a sua direcção do partido, mas sem que para tal, apesar de tudo, tenha podido prescindir do puro e simples esmagamento das normas fundamentais do trabalho partidário leninista. Rebentar com os métodos e os processos leninistas para se apoderar definitivamente do aparelho em 1956; utilizá-los formalmente nas suas manifestações exteriores e despidos de todo o conteúdo proletário, seguidamente, para impedir ser apeado pela base. Este foi o ciclo organizativo do controlo pequeno-burguês de direcção do P«C»P entre 1956 e 1962, como veremos: a partir de 1956 a pequena-burguesia deixa de correr o risco de ser apeada e reforça definitivamente o seu controlo da direcção.
Nesta fase, o taque cerrado pelo controlo da direcção é favorecido necessariamente pelo desmantelamento das suas defesas, dos seus métodos leninistas, ou seja, dos princípios do centralismo democrático.
Bebendo na «contribuição de inapreciável valor dada aos partidos comunistas de todo o mundo pelo XX Congresso» (como lhe chamou[1] quem viria a «corrigir» o desvio de direita) – «o desvio de direita no P«C»P nos anos de 1956-1959», doc. do CC, 1961, pág. 1 e seguintes – os ultra-direitistas lançaram a partir de 1956 luta contra o «culto da personalidade» dentro do P«C»P. O V Congresso descobre não só «cultos de personalidade individuais», como também «o culto da personalidade do Secretariado como organismo», e lança uma campanha pela «democratização» do P«C»P.
Fazendo renascer a tradição e o estilo anarquista e liberal na prática do movimento operário, a fracção pequeno-burguesa começa por impô-lo e generaliza-lo na vida do Partido, como forma de melhor abater a resistência revolucionária e a vigilância de classe. O anarco-liberalismo foi o processo organizativo necessário à pequena burguesia para impor politicamente o direitismo, o golpismo, o eleitoralismo, etc. …, para sujeitar a luta proletária aos seus interesses, para reforçar decisivamente a sua direcção do P«C»P.
Em que se manifestou a linha anarco-liberal no trabalho de organização?
a) O «nivelamento» e o «igualitarismo» pequeno-burgueses: com base no combate ao «culto da personalidade» radicado no desprezo anarquista pelos dirigentes, esta tendência impunha o nivelamento artificial dos quadros independentemente da sua competência, da sua dedicação e, das provas prestadas na luta. Numa luta contra as «hierarquias» que negava a importância da luta pelos mais valorosos, dedicados e aptos quadros revolucionários, que negava a exaltação do exemplo do heroísmo, coragem e apego à causa do proletariado, que visava objectivamente apagar nas massas o prestígio e a consideração pelos dirigentes revolucionários postos ao nível das personalidades da opinião burguesa. Era o método de ataque e desprestígio das tradições revolucionárias da luta do proletariado português que servia os interesses da pequena burguesia na destruição da firmeza comunista do Partido. E assim, isso levou às seguintes práticas
1. – uma política liberal e oportunista de recrutamento e promoção de quadros que abriu ainda mais a organização a oportunistas e provocadores;
2. – uma atitude de «compreensão» e de «maleabilidade» para com os quadros que levou a aceitar não só atitudes individualistas e comportamentos liberais de toda a ordem, como, e principalmente, a sapar a intransigente vigilância ante o porte na polícia: «menos rigidez» na avaliação dos comportamentos, condenação como «erros» da divulgação pública da traição, recusa como «culto da personalidade» da exaltação pública dos comportamentos corajosos, etc. ..., etc. …
3. – o obreirismo que idealística e espontaneamente pressuponha as qualidades inatas dos quadros operários e que levou a tomar a defesa dos bufos que aceitavam as direcções dos sindicatos fascistas: «salvo raras excepções (!), os dirigentes sindicais se são trabalhadores, estão relacionados com os interesses da classe operária e não da burguesia» (‼!) «explicava» o «Avante» em Maio de 1957, conduzindo igualmente à promoção à direcção do P«C»P de indivíduos que vieram a trair miseravelmente: Amador, Martinho, Candeias, Malaquias, L. Reis, etc.;
4. – guerra ao prestígio dos dirigentes passados e actuais do movimento operário, traduzida no seu desprestígio e apagamento aos olhos das massas, na recusa em defendê-los quando presos, no seu nivelamento ou apagamento ante os dirigentes da burguesia;
5. – a «democratização» e grande abertura do órgão como o CC onde se adopta a prática de que «todos os membros podem fazer tudo» e de que as funções devem rodar periodicamente por todos igualmente (o rotativismo), abrandando a compartimentação e a organização do trabalho, sapando a autoridade e o prestígio dos órgãos superiores mais restritos, abrindo totalmente a direcção central aos oportunistas provocadores e traidores, impedindo uma efectiva e regular condução centralizada da luta;
b) A desautorização e desprestígio do Secretariado do CC: como aspecto particular da luta contra o «culto da personalidade do Secretariado» e pelo «nivelamento». O Secretariado foi um dos alvos preferidos dos direitistas, pois nele repousava até aí o papel de vigilância ideológica e centralização política de quadros, como órgão supremo. O seu aniquilamento na prática, o seu desprestígio, a redução das suas tarefas ao nível do tarefismo, o retirar-lhe a função de órgão supremo central da vida do Partido, foi objectivo básico da Comissão Política do CC onde se acoitava o quartel-general da ofensiva da pequena-burguesia: Júlio Fogaça, Pedro Soares e outros. Tudo isto acompanhado de internas lutas intestinas e intrigas que ocupavam o grosso do tempo de trabalho e paralisavam politicamente a vida da direcção.
c) O «anti-centralismo», a «autonomia» e o liberalismo: retomando a bandeira democratista de todos os anti-leninistas na história do movimento operário e dos anarquistas em Portugal, negando o centralismo democrático e os princípios da disciplina revolucionária, os ultra-oportunistas foram nesta fase os campeões da «democracia interna». A tolerância perante a indisciplina, o aceitar como normal da desobediência às decisões dos órgãos superiores, a união de «feudos» «autónomos» no seio do Partido, o fazer estalar a unidade e coesão de uma direcção central e consequentemente toda a possibilidade de uma acção leninista e revolucionária, foi o caminho nítido que trilharam os ultra-direitistas para se encaixarem nas suas posições e reforçarem o seu controlo. Dividir, desarticular, quebrar, para mandar. Depois, para não serem corridos, repor todas as formalidades e aparências fazendo funcionar o autoritarismo, impedindo as discussões, neutralizando os opositores, tudo já em nome do «centralismo democrático»! A par disto, generalizou-se em todo o Partido, formulado pela sua direcção, um método de trabalho retintamente liberal: o desleixo, a inconfidência, a descompartimentação, o individualismo, a indisciplina, a irrealidade, o vedetismo, a imposição, etc. …, importados também do ambiente de «desagregação irreversível» do fascismo, tornaram o Partido mais num clube democrático do que numa organização proletária, abrindo as portas aos provocadores, aos oportunistas e aos carreiristas: a pequena-burguesia recrutava no fundo, a sua base social.
d) O desprezo e a sabotagem da luta ideológica e do trabalho teórico: é uma consequência lógica do domínio pequeno-burguês. Tornado este possível pela fraca capacidade de vigilância ideológica e classista do P«C»P, obviamente não iria fomentar o progresso da consciência política proletária. O praticismo, a total ausência de luta ideológica e de trabalho teórico foram, e são, características típicas do direitismo; desde então, nunca o P«C»P traduziu qualquer das obras fundamentais dos clássicos do marxismo, à excepção do «Esquerdismo» e falsificação grosseira do Manifesto Comunista. A pactuação com a burguesia pressupunha uma fraca consciência política generalizada, que aliás acentuou decisivamente.
Concluindo, podemos afirmar que o chamado «desvio de direita» não foi mais do que o reforço decisivo e definitivo da direcção radical pequeno-burguesa do aparelho do P«C»P. A partir desta altura ela moldará o partido organizativa e politicamente às suas necessidades, sem as peias, as ambiguidades, as dificuldades que lhe tinham imposto nos anos 40 um forte e radicalizado movimento popular, e um campo socialista vigilante e revolucionário. A partir desta altura deixa de haver possibilidade de superar revolucionariamente do interior do P«C»P a sua direcção direitista. Se a debilidade ideológica e a fraca vigilância proletária antes o tinham impedido, agora, são as próprias defesas organizativas e políticas da pequena-burguesia radical dominante que o impedirão. Todas as «concessões» posteriores à linha nesta fase não são mais do que adaptações da própria pequena-burguesia com vista a responder a necessidades novas, a «emendar erros tácticos», a reforçar no fundo o seu controlo exclusivo.
Do peso do seu oportunismo, do seu legalismo, do seu eleitoralismo, do seu golpismo, do seu pacifismo e do seu liberalismo, refinação de uma prática e teoria da direcção histórica da pequena-burguesia radical ao movimento operário, se ressente e ressentirá o movimento proletário, ao querer assumir uma linha revolucionária.
[1] Referimo-nos essencialmente aos seguintes documentos: – «O DESVIO DA DIREITA NO P«C»P nos anos 1956-1959» (Documento do CC de Março de 1961 e a resolução do CC da mesma data); – «A TENDÊNCIA ANARCO-LIBERAL NA ORGNIZAÇÃO DO TRABALHO DA DIRECÇÃO» (doc. do CC de 1966) e «O MILITANTE» n.º 111.
(início)
B
2.ª fase: de 1943 a 1949
A partir de 1942 nota-se um reforço das posições revolucionárias no trabalho da direcção do P«C»P. centrando a sua actividade essencialmente na organização, na defesa e no impulsionamento da luta de massas como objectivos centrais, 6 meses depois de estar à beira da desaparição, o Partido dirige (através do seu Secretariado) funcionando como Comité Nacional de Greve, as grandes greves de Julho e Agosto de 1943. Durante o período subsequente o P«C»P irá enraizar-se pela primeira vez profunda e duradouramente nas massas a nível nacional, conquistando um importante prestígio e um indiscutido papel de direcção na luta popular. Vive-se num período de predominância duma prática revolucionária, dum nítido reforço do papel do P«C»P e de fluxo das lutas populares: três meses depois das greves de 1943 realiza-se o 1.º congresso ilegal do P«C»P no interior, cria-se o 1.º Comité Central e adopta-se pela primeira vez uma orientação política global para a luta. Em 1944 o P«C»P está à frente das célebres greves de 8 e 9 de Maio, aumentando crescentemente os seus quadros e influência. Entre 1943 e 1948 importantíssimas lutas proletárias terão efeito sob a direcção do P«C»P. Este vive uma fase de ascenso caracterizada pelo predomínio facilitado por um favorável condicionalismo objectivo: desenvolvimento industrial e grande aumento da concentração da classe operária sujeita a intensa exploração, por um lado, e os êxitos da URSS e do socialismo no conflito mundial, por outro.
Mas predomínio, que, de forma alguma se traduziu num movimento tendente a desalojar o domínio político pequeno-burguês. Verificamos mesmo que a ala radical pequeno-burguesa só a partir de 1945 retomou a importância crescente e tentou mesmo impôr uma orientação ultra-direitista à linha do P«C»P. É a força derivada do fluxo do movimento popular e da sua radicalização e os efeitos que tal luta conseguira criar nos quadros do P«C»P que impedem, nesta fase, a adopção daquilo a que se chamou a «Linha Política de Transição».
Como foi possível, num período de fluxo da luta e de predomínio na prática (ainda que só na prática) da orientações de cariz proletário, que a pequena burguesia tentasse contra-atacar, reimpondo o seu controlo total, e uma linha ultra-direitista?
Há que não perder de ideia, neste processo, 3 pontos essenciais:
a) A debilidade endémica do movimento operário português continuava mesmo em 1945 (só três anos após 1942), a fazer sentir-se profundamente quer ao nível de organização, quer ao nível ideológico e teórico e não se formara ainda um verdadeiro e experimentado escol de proletários revolucionários profissionais bem preparados e conscientes politicamente;
b) A classe operária em crescimento e recém-chegada do campo era portadora das concepções pequeno-burguesas dos estratos mais explorados e consequentemente susceptível a elas;
c) Finalmente, e principalmente, com o terminar da segunda guerra, o reforço geral do movimento socialista e democrático e a crise aguda que atravessou o fascismo, generalizou-se na pequena e média burguesia a ilusão legalista e oportunista de que o regime poderia, pela sua «deterioração», transitar pacificamente para formas democráticas. O P«C»P, rebocado no trabalho unitário por tais classes, sem uma linha de independência política relativamente a elas, impreparado para uma vigilância revolucionária por parte do geral dos seus militantes, deixou que no seu seio quadros e concepções pequeno-burguesas se infiltrassem abundante e rapidamente, vindo reforçar posição da fracção pequeno-burguesa dominante, e travar o ascenso da ala proletária. É num período de grandes lutas populares que tendem para a radicalização, em 1945, que a ala oportunista se laça ao contra-ataque, não só sabotando o avanço duma luta que atingira grandes níveis, como tentando traí-la e impôr o pacifismo inter-classista.
Aliás repare-se que só no campo prático a pequena burguesia sentia fugir o controlo do P«C»P: o I Congresso de 1943 (ilegal) que marca um passo importante no reforço da organização, mantém absolutamente inalterável a linha unitária vigente, falando num «levantamento nacional» contra o fascismo, cuja natureza de classe não definia, cujo papel dirigente do proletariado é expressamente omitido, cujas características são propositadamente vagas e nebulosas. O I Congresso escamoteia a questão colonial e faz letra morta do chauvinismo colonialista médio e pequeno-burguês, na mira de salvaguardar a mística fraternidade dos «portugueses honrados», ou melhor, na mira de assegurar o controlo burguês do movimento anti-fascista.
A «política de transição» é unicamente o aprofundar e extremar desta linha, a cuja coerência não foge correspondendo igualmente à tentativa da burguesia da neutralizar a radicalização da luta proletária.
De facto, em Maio de 1945, a fracção pequeno-burguesa lança-se ao ataque, primeiramente no seio da direcção do partido, o CC, onde reforçara as suas posições, era designada como «as discordâncias dum importante número de camaradas». Posto em minoria nessa reunião, mas sempre aumentando a sua força organizativa, esse «forte núcleo de camaradas», regressaram ao assalto no II Congresso ilegal de 1946. Que pretendiam, em suma, estes «camaradas»?
Pretendiam com aquilo a que chamaram a «política de transição» que o «partido devia deixar de falar e agir para a movimentação geral do povo português, para a revolução nacional anti-fascista, e devia fundamentar toda a sua táctica na acção para a desagregação do fascismo, donde resultaria a queda, doce, suave de Salazar, um governo de transição» (!‼). A «suave transição» para a democracia pela «desagregação» da ditadura fascista «devíamos procurá-la:»
a) «declarando aceitar um governo (nomeadamente saído de um golpe militar), embora com elementos do fascismo, que realize um programa mínimo»;
b) «criando aa ideia que o fascismo está a ceder, animando assim as massas (…) e orientando toda a propaganda na imprensa e em diligências pela ideia da possibilidade de uma saída doce»;
c) «apoiando no Conselho Nacional de Unidade tudo o que tenda a tranquilizar e a mobilizar os não salazaristas, mesmo os fascistas»;
d) «não falando em movimentos populares, em insurreição, em ataque, etc.»;
e) «orientando a luta nas empresas de forma a que, em nenhum caso o patrão e os empregados não fascistas se aterrorizem e estejam contra os operários em luta»; (texto citado no relatório do CC do P«C»P, ao II Congresso Ilegal de 1946).
Esta tendência contra-revolucionária, anti-proletária e de aberta traição, cujo fim era a entrega despudorada da luta proletária dos desígnios pacifistas do reformismo burguês, foi derrotada no II Congresso Ilegal e considerada «direitista e oportunista». Mas não se pense que o processo da sua derrota correspondeu a qualquer reforço das concepções proletárias na teoria e na prática do P«C»P, acompanhado de uma irradiação e expulsão da fracção pequeno-burguesa dominante. Nada disso:
1.º) A «política de transição» não foi considerada nas suas origens de classe, nem relacionada com a linha unitarista do levantamento nacional, mas considerada superficialmente como «tendências que surgiram na ideia de alguns camaradas» (texto citado no relatório do CC do P«C»P ao II Congresso Ilegal de 1946). Nestes termos nem mesmo se encetou um processo de luta ideológica pelo reforço de uma luta revolucionária e pela expulsão dos oportunistas. Podados nos seus «excessos», os ultra-direitistas e a sua base de classe mantiveram intactas as suas posições, aguardando melhor ocasião. Nada disto se aproveitou no sentido de atiçar a chama da vigilância ideológica proletária pela denúncia exemplar do direitismo;
2.º) Não se lançou, com base no combate ao direitismo que se deveria ter encetado, uma definição nos caminhos da Revolução em Portugal e da natureza de classe do «levantamento nacional», da aliança de classes e do papel do bloco operário-camponês na frente inter-classista de tal levantamento e em que processos de luta ele se centraria. Criticou-se o facto de a «política de transição» centrar a actividade das massas na «desagregação» do regime pondo a reboque desta e não no levantamento nacional, sem se continuar a explicar o carácter classista e o papel do proletariado nesta etapa da revolução (nem sequer etapas estavam delineadas), mantendo-se, encoberto por uma terminologia grandiloquente, «unitária» e vaga, uma situação politicamente equívoca e propositadamente nebulosa. Mais: no Relatório político do II Congresso afirma-se mesmo que ao P«C»P não repugnavam certos métodos ultra-oportunistas utilizados («também o Partido procura tranquilizar e atrair os elementos conservadores»), desde que o cerne da luta não fosse para aí orientado, mas sim para o «levantamento nacional», o que, no essencial, nada altera à tese ultra-direitista.
Mas, repare-se, se nada disto se fez, tal não aconteceu por acaso, por «esquecimento» ou «erro» da direcção existente: a crítica ao ultra-direitismo ficou pela rama, limitou-se a coarctar os seus «excessos» mais escandalosos porque ela correspondeu, não à crítica do proletariado revolucionário, sem força política suficiente na direcção, mas sim ao ponto de vista da própria pequena-burguesia dominante.
Impossibilitada de impôr a sua linha num momento de grandes lutas populares e de pressão da sua organização, a pequena burguesia dirigente vai «condenar» os que propunham levar até ao fim a linha que ela própria defendia, com o fito de assegurar as suas posições de chefia e de não se desligar do movimento popular. A «crítica» daqui resultante saiu necessariamente frouxa e superficial, pois que a natureza, o essencial da linha criticada era perfilhada pela direcção do P«C»P.
Repare-se que se passa nesta altura exactamente o mesmo fenómeno a que mais tarde assistiremos na «correcção» do «desvio de direita»: o ataque demagógico a algumas das suas manifestações para preservar o essencial da sua natureza de classe e das posições desta última.
E que se demonstra pelo facto de, após grandes lutas em 1946, 1948 e 1949, que elevaram o P«C»P a um dos pontos mais altos da sua força em toda a sua história, na Campanha Eleitoral de 1949, o movimento proletário ter sido posto a reboque de um unitarismo médio-burguês, cuja liderança é da burguesia em torno de Norton de Matos, corifeu colonialista na base de objectivos reformistas e colonialistas que faziam letra morta dos interesses próprios da classe operária e da solidariedade internacionalista com os povos coloniais.
Assim, este período, caracterizado por importantes fases da radicalização da luta popular pela melhoria de condições objectivas e predominância na prática de concepções de luta proletárias, não vai afectar, no essencial, a direcção pequeno-burguesa, limitando-se a sabotar temporariamente a adopção do seu programa ultra-direitista e pacifista.
As grandes lutas então travadas, postas ao serviço do eleitoralismo, não com o fim de derrubar o fascismo, pela alteração qualitativa das formas de acção, mas para reforço do poder de negociação entre as várias alas da burguesia, vão entrar em declínio, a par de uma severa repressão a que a euforia legalista e oportunista de 49 pelo P«C»P, abrira as portas.
O movimento entra em refluxo, sem que a organização proletária tenha saído reforçada ao nível da sua vigilância da classe e ideológica e na sua consciência política revolucionária.
C
3.ª fase: de 1950 a 1955
Nos anos seguintes a 1949, vítima do liberalismo e da exposição originados no trabalho eleitoral, o movimento operário é sujeito a uma das mais violentas campanhas de perseguição de sempre (é o período do grande afrontamento entre o sistema socialista e o capitalista a nível internacional) entrando num acentuado período de refluxo: numerosos funcionários e quadros da direcção do P«C»P são presos, tendo 2 quadros do CC traído na polícia – em 1952, a organização tinha regressado a situação equivalente à de 1943. Assiste-se a um certo apagamento da influencia pequeno-burguesa na vida do P«C»P; entra-se numa fase do reforço do centralismo da defesa e da disciplina que levará à expulsão de vários quadros e a um novo predomínio das concepções proletárias não só na prática, como mesmo, única altura da história em que tal aconteceu, no campo da teoria.
É nesta época que parece estar mais acesa a chama da vigilância de classe: não só as depurações atingem certos sectores manifestamente revisionistas, como é durante este período, e unicamente durante ele, que o P«C»P ainda sem aprofundar a natureza do «levantamento nacional» adopta o conceito de «Revolução Democrática e Popular», o que parece ter significado uma posição diferente sobre o esquema de alianças, o carácter, os objectivos e os processos de tal «levantamento».
No entanto, ferido por uma repressão sem precedentes, numa fase de refluxo da luta das massas, o P«C»P passa por um período de profundo enfraquecimento: a pequena burguesia dominante, nunca essencialmente desalojada dos seus postos de comando, ainda que em estado letárgico, não foi realmente afectada por este curto período de endurecimento; não houve um processo interno de depuração anti-oportunista, nem no seio do P«C»P – debilitado e isolado – havia forças para tal.
Perante este estado de fraqueza política e orgânica e com o aparecimento de condições internacionais altamente favoráveis, a pequena burguesia vê chegada a altura de impor finalmente, sem peias nem subterfúgios, a sua linha ultra-direitista de pactuação interclassista, de sujeição da luta proletária aos interesses da burguesia liberal. E portanto desperta para retomar as rédeas de uma direcção que, temporariamente, lhe tinha em parte fugido.
(a seguir)
I
O QUE É O M.R.P.P.?
O MOVIMENTO REORGANIZATIVO DO PARTIDO DO PROLETARIADO (M.R.P.P.) é a organização embrionária do futuro Partido Revolucionário do Proletariado Português. Rege-se na sua linha política e nos seus métodos de organização pelos princípios do marxismo-leninismo e pela experiência histórica da luta proletária nacional e internacional contra o capitalismo e o imperialismo, contra o oportunismo e o revisionismo, pela construção do socialismo. O seu objectivo estratégico é conduzir a classe operária na conquista do poder pela Revolução Socialista, através da etapa da Revolução Popular. Mas para que tal condução seja possível e vitoriosa, põe-se-lhes como necessidade táctica central e primeira o reagrupamento e organização dos trabalhadores comunistas e de todos os marxistas-leninistas num verdadeiro e novo Partido Revolucionário do Proletariado. Tal objectivo tornou-se imprescindível pelo domínio da organização proletária existente (P«C»P) por uma fracção da burguesia que trai e paralisa a luta da classe operária e dos explorados pelos seus fins próprios, pondo-a a reboque dos interesses reformistas e oportunistas da pequena e média burguesia. O P«C»P não é mais que uma frente de penetração burguesa no seio do proletariado, para o amarrar e pôr ao seu serviço como tropa de choque. Não é uma organização ao serviço da classe operária, ainda que continue a ter (cada vez menos) uma base social em certa medida trabalhadora.
Por outro lado, desde 1964 que, em tentativas infrutíferas, procuraram várias forças reconstituir o Partido. Compreender o processo de controlo pela pequena burguesia da direcção do P«C»P desde a sua fundação, por um lado, estudar as razões políticas do falhanço de todas as tentativas para superar revolucionariamente o domínio reformista-revisionista, por outro, eis o caminho correcto para que possamos hoje finalmente progredir: sintetizar a experiência para fortalecer a nossa teoria por forma a que ela seja um verdadeiro agente de transformação da realidade.
Neste primeiro número do «BANDEIRA VERMELHA» vamos tratar essencialmente do primeiro aspecto.
II
PRECISA A CLASSE OPERÁRIA DE TER UMA VANGUARDA DIRIGENTE PARA TRIUNFAR?
1. É importante respondermos com clareza a esta pergunta, posto que a aparente evidência de uma resposta afirmativa tem abrigado, ao longo da história do movimento operário, posições radicalmente distintas e que envolvem a própria concepção sobre a natureza e fins da luta do proletariado. As discussões acerca do que seja a vanguarda da classe operária e sobre a necessidade da sua existência, puseram-se e põem-se com particular agudeza nos momentos de crise, de refluxo, de desagregação ou de embrião do movimento operário, quando nele não existe uma direcção firme e correcta, quando a dúvida e a desorientação campeiam. Então, ciclicamente, as velhas concepções, os velhos oportunismos renascem dos túmulos onde só aparentemente estavam enterrados: o cerco da classe que os gera não desapareceu e o contra-ataque da sua ideologia retoma alento perante o fraquejar das forças revolucionárias. O oportunismo não é uma «teoria» esmagável por uma outra «teoria» não oportunista num dado momento histórico e para sempre. É o produto ideológico de uma classe. No seio do movimento operário, é o produto ideológico da pequena burguesia radical nele infiltrada. O seu aniquilamento prende-se pois, à própria dinâmica da luta de classes. Só o proletariado revolucionário pelo reforço das suas posições à luz de uma teoria revolucionária, pela sua prática por ela correctamente orientada, pode expurgar as degenerescências burguesas no seu seio e denunciar as suas «teorias» e posições. Por isso os momentos de refluxo da luta são momentos de desorientação e de reedição oportunista.
É numa altura de dispersão e fraqueza do movimento socialista russo, em 1901-1902, que as concepções espontaneístas negadoras do papel de vanguarda e dirigente político do Partido do Proletariado dominam no movimento operário daquele país. É numa altura de refluxo da luta de classes em Portugal que ressurgem à tona, com colorações diversas e disfarces pouco enganadores, as posições imediatistas e «trade-unionistas», hoje dominantes na luta operária portuguesa, e as suas tentativas de «superação» anarquizantes e anarco-sindicalistas.
A reorganização da vanguarda política do proletariado português passa necessariamente pela explicação, detecção e isolamento destas duas tendências inimigas dos interesses revolucionários dos trabalhadores. Chegaremos lá começando por ver qual a posição marxista-leninista sobre esse problema.
2. Decorre da própria concepção materialista da História a constatação que, na fase do capitalismo e do seu estádio supremo, o imperialismo, de todas as classes que combatem tal sistema ou por ele exploradas, a única verdadeira e consequentemente revolucionária é o proletariado. Marx explicou-o dizendo que «de todas as classes que se opõem actualmente à burguesia só o proletariado é uma classe verdadeiramente revolucionária. As outras classes declinam e perecem com a grande indústria; o proletariado ao contrário é o seu produto mais autêntico». De facto, o proletariado é a classe trabalhadora ligada à forma mais avançada da economia, a grande produção. Cresce e desenvolve-se com a sua concentração, contrariamente ao campesinato e aos estratos arruinados da burguesia cuja decomposição é o produto directo de tal desenvolvimento e que lhe resistem «procurando fazer andar para trás a roda da História». A concentração cada vez maior da indústria e do seu «produto mais autêntico», o proletariado, permite a este um rápido desenvolvimento da consciência de classe e propicia-lhe, pelas próprias condições do trabalho, uma especial aptidão para a resistência à exploração e organização na defesa dos seus interesses e na luta pela sua libertação. Fruto do desenvolvimento capitalista, ele integra a sua primeira contradição. É a única classe naturalmente apta a superá-la, a única que com a revolução «só tem a perder as suas cadeias».
Mas enquanto classe, subjectivamente, o proletariado não gera espontaneamente a consciência da sua missão histórica e do seu papel revolucionário no processo de produção e na luta de classes. Não gera por si próprio, pela sua situação social, uma consciência socialista que lhe permita a interpretação global da sua posição relativamente às outras classes e à luz da qual possa forjar os instrumentos teóricos e práticos da sua libertação. «A história de todos os países, diz Lenine, atesta que unicamente com as suas forças, a classe operária não pode chegar senão à consciência tradeunionista, ou seja, à convicção de que é preciso unir-se em sindicatos, travar a luta contra o patronato, reclamar do governo estas ou aquelas leis necessárias aos operários, etc…». (Lenine: Que fazer?). Por seu turno, a doutrina socialista, a consciência socialista, «nasceu de teorias filosóficas, históricas e económicas elaboradas pelos representantes instruídos das classes dominantes, os intelectuais», (idem) (os únicos estratos com acesso ao conhecimento científico, dada a sua posição social e a repartição de trabalho existente na sociedade capitalista) e desenvolveu-se «de uma forma completamente independente do crescimento espontâneo do movimento operário», não se engendrando uma na outra mutuamente. Por isso, conclui Lenine, «a consciência política de classe não pode ser levada ao operário senão do exterior, quer dizer, do exterior da luta económica, do exterior da esfera de relações entre operários e patrões». Esta importação da ideologia socialista no proletariado e a sua firme condução política, na teoria e na prática, só pode ser realizada pela constituição de um destacamento de vanguarda relativamente à própria classe. Uma organização que, mergulhando profundamente nas aspirações do proletariado, agrupe os seus mais firmes e experientes elementos e os seus quadros revolucionários, numa vanguarda, como sua fracção mais consciente, como seu estado-maior: «Só o partido revolucionário do proletariado PODE SER ESSE ESTADO-MAIOR» (Estaline: Princípios do Leninismo). O Partido está à cabeça da classe operária, vê mais longe que a classe operária, fá-la subir da espontânea consciência trade-unionista à consciência socialista e existe enquanto existir a luta de classes para defesa de posições do proletariado, e para a efectivação do seu papel histórico. Só dirigida pelo seu Partido a classe operária conquistará o poder. Defender o contrário, defender como fizeram os economistas-espontaneístas, que o proletariado pela sua luta imediatista e puramente económica é espontaneamente conduzido à consciência política e que, por isso, só é desejável a luta que é possível a este nível primário de consciência de classe, não devendo os revolucionários «forçar» ou «impor de fora» objectivos que a classe é incapaz de atingir, representa, como Lenine o denunciou, uma diminuição do papel da ideologia revolucionária na luta de classes, uma subordinação do movimento operário à ideologia burguesa, um rebaixamento da política socialista à política trade-unionista, sendo que «a política trade-unionista da classe operária é precisamente a política burguesa da classe operária».
Nesta linha, historicamente, o espontaneísmo economista negou a necessidade da existência de uma vanguarda destacada da classe como seu «elemento consciente» e dirigente, confundindo a natureza da luta sindical e dos sindicatos com a da luta partidária e do Partido, pondo esta a reboque daquela. De braço dado com este oportunismo direitista anda um outro esquerdista: o «revolucionarismo» anarquista, pregando a luta política, entendia que ela não tinha nem devia ser conduzida «do exterior» da classe operária por uma organização revolucionária, mas sim pelas próprias organizações trabalhadoras de massas, visando a «greve geral política» ou o «terrorismo excitativo» que fizesse despertar o proletariado do seu «torpor». Economismo e anarco-sindicalismo foram e são as duas vestes diferentes do oportunismo pequeno-burguês contrário ao papel do partido como organização de vanguarda e consequentemente contrário à libertação da classe operária. A edificação do Partido do Proletariado passou e terá de passar pelo isolamento e destruição de tais bolsas oportunistas no seio da classe operária.
Vejamos a manifestação actual de tais tendências no nosso país.
3. Sossegam-se os revisionistas afirmando que falar em economismo no movimento operário português actual é uma enormidade sem pés nem cabeça: não existe o P«C»P como vanguarda da classe operária? Não se reconhece a necessidade da luta política distinta da económica e importada no proletariado por tal partido como forma de elevar a sua consciência a um nível superior?
Claro que para nós, marxistas-leninistas, esta «argumentação» não nos cega, posto que toma o economismo como uma forma, ou seja, como um conjunto de manifestações organizativas desligadas da sua raiz de classe, da sua verdadeira natureza política. O espontaneísmo, como tendência burguesa no seio do proletariado, caracteriza-se pelo bloqueamento da luta deste no imediatismo das suas reivindicações espontâneas. Impede objectivamente a classe operária de, por uma politização e direcção conduzidas pela sua vanguarda consciente, se aperceber do seu papel no conjunto das relações sociais e do processo produtivo e consequentemente de se lançar numa luta pela destruição do sistema capitalista. Quer dizer: restringe a luta do proletariado aos limites necessários à preservação da estrutura e da exploração capitalista. Historicamente este resultado pode ser conseguido por caminhos, por formas diversas: quer negando o papel partidário de vanguarda distinta das massas ao seu destacamento mais consciente e combativo, quer, após a sua organização, pelo assenhoreamento dele por uma fracção direitista e pequeno-burguesa que imprima ao partido uma orientação que se traduza no efectivo bloqueio e sabotagem da luta revolucionária, alienando o movimento aos interesses classistas da burguesia, impedindo-o de, no seu crescimento os atingir.
Dum lado trai-se, recusando como princípio o papel de vanguarda do Partido; do outro trai-se igualmente negando na prática ao Partido constituído um papel de vanguarda e transformando-o num bastião burguês no seio da classe operária. As Uniões Socialistas espontaneístas da Rússia, em 1903, negavam como posição política o carácter vanguardista do Partido. A direcção do P«C»P defendendo na teoria essa natureza, na prática aproveita-se do Partido como instrumento de manutenção do carácter primário da luta proletária, pondo-a à trela do reformismo burguês. Duas concepções de Partido só aparentemente diferentes: duas formas de manifestar o mesmo controlo da burguesia no movimento operário.
As posições anarco-sindicalistas, por seu turno, levam igualmente a água ao mesmo moinho do capitalismo. Com fortes tradições na luta operária em Portugal, esta concepção pequeno-burguesa e o domínio ideológico pequeno-burguês em geral, é um dos principais responsáveis pelas derrotas da classe operária portuguesa na sua luta antifascista e anticapitalista. Tendo deixado fortes raízes ideológicas e políticas no movimento comunista aquando da sua constituição em Portugal, pode dizer-se que a ele foram beber todos os oportunistas, todas as tentativas da pequena burguesia portuguesa para se assenhorear (com êxito) do movimento operário. Se, mercê de condicionalismos que adiante veremos, foi a facção radical-reformista daquele estrato que de há longa data se apoderou da direcção da luta proletária e a pôs ao seu serviço, é todavia a sua ala radical-revolucionarista que, no geral, tem encabeçado politicamente as tentativas de «superação» do revisionismo. A acção «anti-revisionista» visível, politicamente organizada, no nosso país, salvo poucas excepções, objectivamente não tem sido mais do que a tentativa de uma fracção da pequena-burguesia para expulsar outra na direcção do movimento operário. Isto independentemente da intenção e da coragem individual de alguns dos seus promotores; isto como resultado global e objectivo: verdadeiros marxistas-leninistas, eminentes teóricos do proletariado português estiveram ligados a tais tentativas, mas a sua influência pessoal não conseguiu impôr um cunho verdadeiramente revolucionário a tal acção. É isto que explica que à prática eminentemente aventureira e pequeno-burguesa do geral dessas movimentações estejam ligados vários documentos históricos de ruptura teórica com o revisionismo, que constituem património valiosíssimo da teoria revolucionária portuguesa. Negando na prática a necessidade do partido e pretendendo substituí-lo quer pelo próprio movimento das massas enquanto tal, quer por acções de «terrorismo excitativo» completamente desligado da organização do partido e das massas, quer por eclécticas e empíricas «Frentes» pluriclassistas, anarquismo e anarco-sindicalismo satisfazem as necessidades da burguesia: manter desorganizada a vanguarda revolucionária do proletariado ou suicidá-la em aventuras desesperadas.
Revisionismo economista e anarquismo são as mordaças da mesma classe, que têm paralisado a reorganização marxista-leninista do Partido do Proletariado. Até agora.
O Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado representa o esforço ainda embrionário do proletariado para tomar finalmente as rédeas da luta nas suas mãos, antes de mais pela reconstituição da sua vanguarda. Mas para o poder fazer com êxito, tem de saber sintetizar a experiência passada do movimento operário.
É isso que passamos a fazer, analisando mais detalhadamente as experiências oportunistas na acção do proletariado português, começando, neste primeiro artigo, pelo estudo da experiência mais significativa e prolongada no tempo: o controlo do P«C»P pela pequena burguesia radical, com predomínio permanente e claro desde 1956, da ala reformista e revisionista.
Vamos historiar nos seus aspectos fundamentais a evolução do P«C»P até aos nossos dias, pois nela se reúne, pelo menos até 1964, o essencial da direcção da luta proletária portuguesa.
III
QUAL A RAZÃO DO PREDOMÍNIO POLÍTICO DA PEQUENA-BURGUESIA NA DIRECÇÃO DO MOVIMENTO OPERÁRIO PORTUGUÊS DESDE O SEU APARECIMENTO?
O movimento operário português foi ao longo da sua história uma presa normalmente fácil da direcção oportunista da pequena-burguesia radical. O motivo desta debilidade endémica da luta proletária portuguesa tem de ser encontrada em razões particulares, inerentes às características do capitalismo português. Assim constatamos que:
1.º) A base social do movimento operário, a classe operária, reflectiu a incipiência e o atraso do capitalismo português até à segunda guerra, com uma diminuta base industrial, assente numa estrutura empresarial artesanal e dispersa. A classe operária encontrava-se consequentemente dispersa, apresentando características mais de artesanato industrial: não existia um proletariado antigo, numeroso e concentrado, acumulado de experiências passadas, temperado numa luta histórica que tivesse permitido forjar as armas de uma organização, de quadros e de uma consciência verdadeiramente revolucionárias. País economicamente dependente, de indústria inexistente ou artesanal, com um colonialismo de herança, serôdio e não correspondendo às necessidades de exportação de capitais da fase imperialista de então, eis a imagem do capitalismo português no início deste século, e que não vai sofrer alterações estruturais profundas até à Segunda Guerra mundial.
2.º) A fraqueza daqui resultante par o movimento operário, veio permitir que a direcção da sua luta, desde as suas primeiras manifestações politicamente organizadas (fundação do Partido dos Operários Socialistas Portugueses em 1875), tenha pertencido à pequena-burguesia radical, que alternativamente, lhe foi dando um cunho reformista social-democrata ou anarquista e libertário.
No século XX, e a partir da 1.ª guerra, as grandes lutas operárias caem sob a direcção política do anarquismo e do anarco-sindicalismo pequeno-burgueses. Esta posição amplamente dominante na luta proletária portuguesa desde o princípio do século até aos primórdios dos anos 30, não só conduzirá o movimento operário a grandes derrotas e desmobilizações que permitirão o advento do fascismo, como deixará raízes e vícios oportunistas de toda a espécie na prática e na teoria da luta, dos quais o P«C»P nunca se conseguirá libertar.
Nascido sob a tutela oportunista da pequena burguesia radical, experimentado no seu reformismo direitista ou no seu aventureirismo anarquista, o movimento operário até aos nossos dias não se conseguiu libertar da dependência ideológica e política daquela fracção da burguesia.
Não quer isto significar que ao longo de todo este período de sujeição não tenha o proletariado português travado grandiosas e corajosas lutas revolucionárias, lutas que constituem um património indiscutível do movimento revolucionário. Quer sim significar que tais lutas foram normalmente traídas ou desperdiçadas pela direcção pequeno-burguesa, não foram levadas frequentemente às suas últimas consequências saldando-se em derrotas e desmobilizações. Deve aliás notar-se que os períodos de fluxo revolucionário na história da luta proletária portuguesa correspondem normalmente a momentos de maior pressão da base e dos quadros mais militantes das organizações que, fruto de condicionalismos favoráveis, conseguem temporariamente forçar o movimento em determinado sentido, sem nunca se conseguirem apossar da sua direcção ou mudar a sua linha política no essencial. Os períodos de grandes lutas operárias e camponesas têm correspondido portanto a pressões ou a tentativas de ruptura de fracções ou da base, cujo êxito foi limitado no tempo e que não lograram qualquer continuidade revolucionária.
É neste sentido que se deve interpretar a fundação do P«C»P em 1921, como uma tentativa frustrada de ruptura marxista-leninista com o domínio pequeno-burguês no movimento proletário.
IV.O QUE SIGNIFICAM PARA O PROLETARIADO PORTUGUÊS, 50 ANOS DE DIRECÇÃO POR PARTE DO P«C»P?
A fundação do P«C»P foi a primeira tentativa histórica de romper com a direcção pequeno-burguesa do movimento operário. Tentativa que desde o seu início se frustrou, que nunca possibilitou o enraizamento de um verdadeiro controlo marxista-leninista: sem uma classe operária concentrada, numerosa e experimentada por gerações de luta; sem uma teoria revolucionária minimamente elaborada que permitisse o isolamento e a denúncia do predomínio até aí existente das concepções oportunistas; com um nível ideológico baixíssimo vogando no empirismo e sujeito a uma férrea repressão, o P«C»P nasceu sem força política, sem organização e sem uma clara linha de ruptura revolucionária com o oportunismo radical pequeno-burguês.
A sua histttória vai ser o longo itinerário do controlo da pequena burguesia que se consegue instalar desde a fundação no seio do partido pendendo ciclicamente para a aventura ou para o direitismo, com certos períodos de predomínio da prática proletária onde quase sempre se nota um recrudescimento da luta popular. Períodos em que fracções revolucionárias ou de base, apoiadas em favoráveis condições objectivas, conseguem provisoriamente imprimir uma prática proletária: uma prática, pois mesmo nestes intervalos a direcção e a linha política permanecem essencialmente inalteráveis, retomando o controlo oportunista das lutas, fazendo o movimento recuar, reinstalando rapidamente a sua efectiva direcção.
Deve notar-se que, se bem que globalmente possamos detectar na história do P«C»P desvios aventureiros anarquizantes e desvios direitistas, é o direitismo sob a forma da «concórdia» inter-classista, da pactuação com a média burguesia, da renúncia aos interesses próprios do proletariado, que desde os anos 30, com um pequeno intervalo entre 1950 e 1956, domina na teoria política, na linha do P«C»P. Na teoria desde esta época, e na prática principalmente desde 1956 até hoje. Isto dado que na prática de luta dos anos 30 e entre 1943 e 1949, como veremos, revela-se por vezes, com características revolucionárias e de independência relativamente aos interesses dos vários estratos da burguesia.
Porque entre 1929 e os nossos dias a força dominante na direcção da luta operária vai ser o P«C»P, porque, mal ou bem, será essencialmente sob o seu enquadramento que durante todos estes anos as massas populares travarão as suas principais batalhas; porque este longo período de domínio da direcção pequeno-burguesa de tais lutas conduziu o proletariado a um acentuadíssimo estado de desmobilização, lhe imprimiu concepções práticas oportunistas, lhe boicotou a sua consciencialização revolucionária; porque hoje queremos sintetizar a experiência passada para podermos avançar sob a bandeira do marxismo-leninismo, por tudo isto há que estudar atentamente o que significou para o proletariado esta longa caminhada do oportunismo na sua luta e dela retirar as devidas lições.
É isso que, nos seus traços essenciais, iremos fazer neste primeiro artigo, analisando as diversas fases da história do P«C»P no que têm de politicamente mais significado.
A
1.º fase: de 1929 a 1942
Extremamente débil, como vimos, desde a sua nascença, o P«C»P, fundado em 1921, não teve praticamente existência até 1929, ano em que se realiza a Conferência Nacional do P«C»P onde se lançou a sua organização, com um pequeno punhado de unicamente 30 quadros, no essencial de origem e formação anarco-sindicalista.
Em toda esta fase se vai sentir no P«C»P vogando sem uma linha política global táctica e estratégica, definida aos sabor do empirismo, numa nítida influência de golpismo radical pequeno-burguês. Vários dos seus quadros estão envolvidos em golpes e revoltas dessa altura e relacionados com a maçonaria. A sua organização é diminuta, assentando praticamente nos artesãos, operários, camponeses pobres, marinheiros, intelectuais e estudantes da região de Lisboa e do Sado, estando exactamente devido ao seu pendor anarquizante e golpista, sujeita a uma constante repressão que impediu na prática, durante este período, qualquer enraizamento autêntico nas massas populares: 1935 a 1942 o P«C»P terá um Secretariado todos os seis meses e não possui um Comité Central; em 1942 está reduzido a 5 funcionários, 2 casas ilegais, uma tipografia e sem fundos.
Esta debilidade organizativa e o predomínio de orientações anarquizantes durante esta fase, fazem o P«C»P cair no esquerdismo sectário (até 1935, desvio corrigido no 7.º Congresso da Internacional Comunista) ou tornam-no permeável à provocação (em 1937 a organização de Lisboa é dominada por grupo de provocadores), impedem o seu enraizamento e a instalação duma efectiva direcção marxista-leninista. É tudo isto que motivará nesta altura a sua expulsão da Internacional Comunista onde só mais tarde (194?) será readmitido.
Saliente-se, no entanto, que o P«C»P vai estar à frente de importantes batalhas populares nesta fase, algumas porém, nítido reflexo da referida orientação golpista. Esta fase tem todavia a característica de uma elevada militância e espírito de sacrifício por parte dos quadros do P«C»P, única organização estruturada a resistir clandestinamente ao fascismo e que encabeçou, a despeito dos referidos desvios, algumas lutas objectivamente revolucionárias e independentes: a revolta dos marinheiros de 1936, a grande agitação de 1937 a 1938, com o «Avante» saindo semanalmente, importantes lutas estudantis, etc..
É extremamente importante notar, que simultaneamente com o empirismo político e organizativo e a tendência golpista, o domínio ideológico radical pequeno-burguês a partir de 1933 começou a manifestar-se, quanto ao trabalho unitário, já com nítidas características de pactuação inter-classista. A «restituição ao povo português de todas as liberdades democráticas conquistadas pelos nossos antepassados desde 1820 a 1910 e que a ditadura lhes arrancou» (in «Contestação à secretaria do Tribunal Militar especial» de Bento Gonçalves em 1936) pedida por Bento Gonçalves já ultrapassava no seu significado a pura e simples defesa (aliás correcta) da unidade anti-fascista: dissolvia nessa unidade os interesses do proletariado nascente, nos dos seus «antepassados» da burguesia liberal, omitia o carácter chauvinista e colonialista dos interesses passados e actuais de tal burguesia, afirmando mesmo o P«C»P, na continuidade de tais interesses: «…Nós vimos desse povo que criou a «Portuguesa» onde se encerra mais a ideia da Nação, do que tudo o que poderá conter a este respeito toda a Torre do Tombo dos decretos e das notas oficiosas do Estado Novo» (in citada «Contestação…» de B. Gonçalves).
Aqui reside o cerne ideológico da direcção pequeno-burguesa radical do P«C»P, até hoje a «concórdia e fraternidade» anti-fascista, o sacrifício dos interesses próprios do proletariado.
(a seguir)
«Como ligar uma à outra a teoria marxista-leninista e a realidade da revolução chinesa? É preciso, para utilizar uma expressão corrente, «disparar a sua flecha visando o alvo». O marxismo-leninismo está para a revolução chinesa como a flecha para o alvo. Ora, alguns dos nossos camaradas «disparam a sua flecha sem visar o alvo», disparam ao acaso. Tais camaradas correm o risco de comprometer a causa da revolução. Outros contentam-se em mirar e remirar a flecha entre os dedos exclamando: «que bela flecha! Que bela flecha!» mas não têm a mínima intenção de a disparar. Não são, no fundo, mais do que simples apreciadores de quinquilharias que não querem saber da revolução para nada. Devemos lançar a flecha do marxismo-leninismo tendo por objectivo a revolução chinesa, se este ponto não for esclarecido, o método teórico do nosso Partido jamais poderá elevar-se e a revolução chinesa triunfar.»[1]
1. O «BANDEIRA VERMELHA» cujo 1.º número vê a luz do dia neste ano do centenário de Lenine, é o órgão teórico central do M. R. P. P. (Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado), é o instrumento com que daqui para o futuro os marxistas-leninistas portugueses na sua tarefa de reorganizar revolucionariamente o Partido vão lançar as bases para o aprofundamento e criação da teoria da revolução portuguesa assente nos três pontos seguintes, decorrentes dos princípios fundamentais do trabalho teórico marxista-leninista:
-- estudo sistemático e profundo da realidade actual portuguesa e do estado actual da luta de classes em Portugal, ou seja, como diz o camarada Mao Tsé-tung, «conhecer a situação tal como ela é e saber bem aplicar a política, quer dizer, conhecer o mundo e transformá-lo»[2];
-- estudo organizado e científico da história de Portugal desde o advento do capitalismo, em particular do movimento operário;
-- estudo do marxismo-leninismo à luz do princípio da relação dialéctica entre a teoria e a prática, ou seja, assentando o trabalho teórico sobe os principais aspectos práticos de experiência da luta, recusando o dogmatismo estático e abstracto.
Neste jornal, bem como nas edições «BANDEIRA VERMELHA», eis os princípios que guiarão a nossa luta teórica. E é precisamente o respeito por tais princípios, o entendimento dialéctico da teoria como síntese da prática e agente da sua transformação, que nos permitirá brandir o «BANDEIRA VERMELHA» como a arma da luta ideológica que a partir de hoje, e sem tréguas, travaremos contra dois inimigos que têm paralisado decisivamente a reorganização revolucionária do proletariado: o praticismo cego e o dogmatismo esclerosado.
O praticismo, o empirismo, o culto da prática pela prática, têm sido utilizados pelos revisionistas e reformistas para sabotar a consciencialização política da classe operária e dos camponeses, para colocar docilmente e sem problemas a luta dos trabalhadores ao serviço da fracção radical pequeno-burguesa dirigente do P«C», para enquadrar sem oposição nem resistências os movimentos populares sob a tutela do eleitoralismo, do reformismo e do pacifismo da grande «confraternização democrática» da burguesia. A direcção do P«C»P, sabotando de há longa data e intencionalmente a criação de uma verdadeira consciência revolucionária na classe operária, originou no proletariado português um estado de profunda desmobilização e atraso políticos, de grande permeabilidade aos oportunismos reformistas ou pseudo-radicais, de falta de vigilância política de classe, condições necessárias para atrelar, como até aqui facilmente conseguiu, a luta do proletariado aos interesses da pequena e média burguesia.
Lutar contra o empirismo pela elevação da espontânea consciência de classe à consciência marxista-leninista, lutar contra o culto da prática pela divulgação do método concreto de a interpretar e transformar, lutar contra o praticismo cego e pelo estudo do marxismo-leninismo à luz das experiências passadas e actuais da luta, enfim, lançar mãos a um grande trabalho de estudo teórico e de formação dos quadros políticos proletários da revolução é tarefa urgente e principal, absolutamente indissociável da luta pela denúncia e isolamento do reformismo e do revisionismo.
Mas na experiência já rica das tentativas de superação do revisionismo do P«C»P um novo e relativamente latente perigo se divisa no culto da teoria pela teoria, o do culto da «análise marxista» abstracta, da interpretação apriorística que parte não da verdade mas de ideias teóricas desligadas da experiência concreta da luta. Pegar nas obras de Marx, Engels, Lenine, Estaline e Mao Tsé-tunge recitá-las sabiamente de uma ponta à outra, mas com total incapacidade de transformar tais ideias em instrumentos de luta, em factores de acção sobre a realidade é uma atitude subjectivista contrária ao método marxista-leninista, porque «o marxismo-leninismo é a teoria que Marx, Engels, Lenine e Estaline criaram na base da prática, a conclusão geral que tiraram da realidade histórica e revolucionária»[3]. Pode um grupo de pessoas, distantes da realidade da luta, apregoar a sua adesão ao marxismo-leninismo, demonstrar por escrito que os seus princípios são formalmente bem conhecidos, declarar que na base deles se vão erguer grandes e belos partidos… que, ao fim de 2, 3, 6 anos nada se continuará a ver, nada de novo se poderá sentir. É que um elemento essencial foi «esquecido»: o marxismo-leninismo e a teoria táctica e estratégica da Revolução são o resumo constante da prática da luta quotidiana, a sua interpretação à luz da experiência acumulada com a finalidade de abrir constantemente novos caminhos na acção. É preciso estar na luta ou começar por estar na luta, para encontrar as vias correctas de a conduzir e de, na base dela, reconstruir o Partido. Os que começam a pontificar de fora dela, «explicando» depois como devia ter sido mas nunca conseguindo nem tentando pôr-se à sua cabeça, à espera que as «condições» para tal apareçam, não só desconhecem o marxismo-leninismo no seu aspecto essencial, o método dialéctico, como morrerão à espera que as tais «condições» surjam, dando sempre belas lições dogmáticas de «marxismo-leninismo» completamente desligadas da realidade e raramente respondendo às reais necessidades da luta.
Se insistimos no perigo do dogmatismo é porque ele pode vir a tornar-se uma ameaça real no trabalho reorganizativo do Partido Revolucionário do Proletariado, dado o estado embrionário da organização e o controlo ainda superficial de alguns importantes centros de luta. O camarada Mao Tsé-tung, em 1942, no seu discurso «Por um estilo de trabalho correcto no Partido», apontava que das duas formas de subjectivismo, o praticismo e o dogmatismo, este era então o mais perigoso porque «… com efeito é fácil aos dogmáticos darem-se ares de marxistas para impressionar, subjugar e sujeitar os quadros de origem operária e camponesa, aos quais é difícil desmascarar a verdadeira face daqueles. Os dogmáticos podem também impressionar a juventude ingénua e inexperiente mantendo-a sob sua influência».
Se no momento actual a luta contra o praticismo revisionista é o objectivo central da nossa luta ideológica e é a tarefa teórica básica do trabalho de reorganização marxista-leninista do Partido, devemos estar atentos ao perigo que nesta fase pode constituir o subjectivismo dogmático na teoria e na prática, com as suas grandes frases, grandes «análises» e igualmente com a sua grande paralisia.
O remédio certo contra qualquer destes desvios é a constante ligação da organização embrionária à luta, é a reflexão e o fortalecimento assentes nos dados que ela fornece, é a recusa do idealismo metafísico e mecanicista: «organizar primeiro lutar depois», ou do praticismo cego, oportunista e igualmente idealista: «lutar primeiro e só depois virá a organização», pela definição do único caminho correcto e dialéctico: «organizarmo-nos na luta para podermos dirigir a luta». É este o método que seguirá e segue o M. R. P. P..
2. Sabemos a que levou o praticismo, a desmobilização e o reformismo da direcção pequeno-burguesa do P«C»: a um acentuado refluxo da luta popular desde 1962, refluxo em que se geraram condições para surgirem as primeiras tentativas de reconstruir o Partido do Proletariado em bases revolucionárias. Não foram muito mais longe tais experiências: umas morreram em novas formas de praticismo aventureirista e radical-pequeno-burguês, outras para lá caminham, outras ainda estiolam no dogmatismo de estufa de certos «sábios» do «marxismo-leninismo».
Noutra altura (n.º 2 do «BANDEIRA VERMELHA») melhor analisaremos a natureza de tais experiências e o motivo porque falharam ou estão a falhar.
Interessa sim aqui referir que o M. R. P. P. surge na base da ruptura essencial com o reformismo revisionista e da denúncia das formas aventureiras e dogmáticas de superar o direitismo.
Interessa realmente aqui referir que na base da experiência acumulada da luta proletária portuguesa e internacional e dos ensinamentos actuais dessa luta assente nos princípios do marxismo-leninismo, um núcleo de operários, camponeses, jovens e intelectuais comunistas ousaram meter ombros à tarefa de vir a constituir o Partido Revolucionário do Proletariado Português, que para esse fim criaram uma organização marxista-leninista embrionária: o Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado – M. R. P. P. – em contacto directo no interior do país com a luta quotidiana dos explorados; e que, a partir da teoria proletária recente e já elaborada sobre a revolução portuguesa, pelo seu aprofundamento e pela investigação própria esboçaram uma definição estratégica das fases daquela revolução e definiram prioridades de actuação táctica. É esta luta que o «BANDEIRA VERMELHA» continuará a travar desbravando o caminho revolucionário a percorrer e afastando os escolhos do oportunismo.
3. Também a guerra que agora iniciamos pela reorganização revolucionária do proletariado é prolongada e difícil.
Não faltarão os demissionistas e os cépticos; não faltarão os inimigos e sabotadores; não faltarão os oportunistas à espera de «ver o que isto dá» para então aderir; não faltarão os que fiquem pelo caminho que a luta é dura e prolongada e o inimigo não perdoa. Para nós, proletários de vanguarda, para nós marxistas-leninistas, só há porém um caminho justo quando o proletariado é traído, quando a luta declina sem direcção, quando o inimigo triunfa: é colocarmo-nos à frente dos acontecimentos, é darmos o primeiro e decisivo passo, é forçarmos o caminho da história. Não interessa saber se somos muitos ou poucos no momento de começar: interessa saber se a nossa linha é a mais justa e correcta, se os nossos métodos são os verdadeiramente leninistas. Se assim for e se soubermos aplicar a primeira e praticar os segundos, em breve cresceremos e connosco a luta.
Hoje e aqui, o M. R. P. P., núcleo embrionário dos comunistas, representa a ala mais avançada do proletariado português, que recusando a traição revisionista, a aventura pseudo-radical ou o dogmatismo estéril, resolveu tomar nas suas mãos a organização revolucionária dos operários e camponeses, visando a Revolução Popular e seguidamente a socialista.
OUSÁMOS COMEÇAR
OUSAREMOS TRIUNFAR
Dezembro de 1970
Decisão do Comité Lenine sobre a luta contra a influência corruptora da ideologia, da moral e dos costumes burgueses na ideologia, na moral e nos costumes dos comunistas.
Outono de 1972
1. ATÉ muito recentemente e durante cerca de dez meses, um quadro do nosso Movimento entreteve relações pessoais ínvias com uma camarada casada, aproveitando-se do facto de, pelas tarefas políticas e de organização que lhe estão atribuídas, exercer face a essa camarada uma função de direcção e controlo e da circunstância de estar autorizado a usar, com frequência, a casa dessa camarada para o desenvolvimento da actividade revolucionária.
Reciprocamente, a camarada em questão entreteve com ele o mesmo tipo de relações íntimas tortuosas, aproveitando-se também do referido facto e circunstância, enquanto continuava a manter com o marido as habituais relações familiares e lhe dissimulava as realidades, servindo-se do trabalho político como capa.
2. COLOCADO ao corrente desta situação extremamente degradante e corrupta, em absoluto estranha à moral e aos costumes dos comunistas, o Comité Lenine não logrou, todavia, estabelecer a respeito dela uma discussão e uma luta ideológica firmes na base dos princípios e, em consequência, as medidas que decidiu tomar revelaram-se insuficientes para pôr termo ao caso e extirpar as raízes desse comportamento.
Porém – e para além da insuficiência das medidas adoptadas – reside no seu boicote reiterado e sistemático, por parte dos camaradas em questão – alvos destinatários dessas medidas – a razão principal da demora em regular correctamente o assunto.
3.RETORNANDO sobre os seus próprios passos, o Comité Lenine reconheceu a necessidade de reexaminar o problema duma maneira mais adequada, aprofundada e multilateral.
Efectivamente, o que aqui está principalmente em causa, não é a questão – sem dúvida importante e necessária – das medidas disciplinares a adoptar em relação aos camaradas responsáveis por aqueles factos anti-proletários. Os meios disciplinares agem directamente sobre os portadores das concepções erróneas e dão ao Movimento a possibilidade de reforçar-se, nomeadamente expurgando-os.
Mas, só por si, esses meios não são suficientes para combater as manifestações da ideologia, da moral e dos costumes burgueses no seio das colectividades revolucionárias.
4.O CAMARADA MAO ensina-nos que «em condições determinadas, qualquer coisa má pode conduzir a bons resultados e, por outro lado, qualquer coisa boa conduzir a maus resultados».
No nosso caso concreto, precisamos saber extrair duma coisa má – que é uma manifestação prática da ideologia, da moral e dos costumes burgueses no seio do nosso Movimento – as lições que ela comporta, de modo a obtermos resultados bons – os quais consistirão não apenas em eliminar imediatamente essa mesma manifestação prática, mas principalmente em elevar o nível político, ideológico e moral das nossas fileiras, a fim de que sejam cada vez mais raras as coisas más e aberrantes desse tipo.
5. ACASO existe uma moral comunista? Sem dúvida que sim! Num discurso de 1920, o grande Lenine explicava à juventude russa: «Pensa-se frequentemente que nós não temos uma moral nossa e aa burguesia acusa-nos também frequentemente, a nós, comunistas, de negarmos toda a moral. Esta é uma maneira de escamotear as ideias, de lançar pó aos olhos dos operários e camponeses».
Nós, marxistas-leninistas, negamos a moral considerada fora e acima da sociedade e das classes sociais, dizemos por conseguinte, que toda a moral tem um carácter de classe e serve os interesses duma classe social determinada. Os ideólogos da burguesia – bem como os ideólogos de todas as classes exploradoras anteriores a ela – sempre procuraram embrutecer e dominar o Povo em nome duma moral pretensamente eterna. Essa moral eterna ou divina, de facto, não existe e, por isso, nós negamo-la.
Mas nós, comunistas, temos uma moral nossa: a moral proletária. Essa moral está inteiramente subordinada aos interesses da luta da classe operária e os seus princípios elevados deduzem-se todos dos interesses dessa luta
6. A CLASSE OPERÁRIA não está separada da sociedade por nenhuma Grande Muralha. Nas condições da ditadura da burguesia – e mesmo, numa certa medida, nas condições da ditadura do proletariado – a ideologia, a moral e os costumes corruptos dos capitalistas e latifundiários, a despeito de serem objectivamente estranhos aos interesses e à concepção proletária do mundo, alcançam deixar nos operários as suas marcas profundas.
Por outro lado, a moral e os costumes da burguesia assentam num dado sistema de forças produtivas e de relações sociais de produção burguesas; e não é senão, quando o proletariado arranca ao seu inimigo de classe o poder político e começa a transformar essa base económica, que a moral actualmente dominante sofre os seus primeiros golpes mortais.
7.TODAVIA, para além deste assalto directo à consciência da classe operária movido pela burguesia – seja através do simples contágio, seja através da constante e múltipla actividade de deformação ideológica das massas – um outro assalto telecomandado decorre paralelamente e é efectuado pelos agentes revisionistas.
Todos nós conhecemos uma multidão de exemplos de degradação moral, da abjecção e baixeza mais vis de que foram actores, não apenas os simples elementos da base, mas também os mais qualificados responsáveis da canalha cunhalista.
Recordaremos apenas um caso do domínio público e pelas semelhanças que tem com o comportamento anti-comunista dos nossos dois camaradas: o caso do lacaio Pedro Ramos de Almeida, membro do Comité Central do P«C»P e que se entregou à Pide, no ano passado. Este vende-obreiros, sob o pretexto que precisava efectuar determinadas reuniões políticas em casa dum seu «colega» de partido, convencia-o, em nome da segurança e da conspiratividade, a desaparecer. Seguidamente, entrava na casa com a própria mulher do «desaparecido» e servia-se, à uma, da cama e da mulher…
8.CRESCE que no seio do nosso Movimento – como no seio de qualquer partido – contam-se alguns elementos de extracção social pequeno-burguesa, nomeadamente saídos das fileiras dos intelectuais revolucionários.
Embora não seja este o caso dos camaradas que motivaram a presente decisão do Comité Lenine, o certo é que os costumes e as concepções morais da burguesia encontram muitas vezes nesses elementos, na prática da sua vida passada, uma porta possível, um terreno propício por onde buscam insinuar-se no nosso Movimento e contaminar toda a organização.
9.EM CONSEQUÊNCIA das razões apontadas, os micróbios da corrupção moral burguesa atacam também os comunistas e infecta-los-ão irremediavelmente, se o partido, entretanto, não tiver tomado as medidas profilácticas que se impõem para isolar a moléstia e obstar à sua propagação e desenvolvimento epidémicos. É por isso que os meios cirúrgicos – leia-se disciplinares – indispensáveis, sem dúvida para atacar os portadores conhecidos dos bacilos pestíferos, só por si são insuficientes para erradicar a doença.
Nestas condições de ataque coordenado e simultâneo, em várias frentes, à consciência proletária, a vigilância dos comunistas tem de estar em permanente estado de alerta, não só no sentido de que devemos denunciar e criticar a tempo, no lugar e pelas formas apropriadas os menores indícios de corrupção ideológica e moral, mas também no sentido de que é preciso realizar, ainda e outrossim neste campo, um cuidadoso, múltiplo e planificado trabalho de educação marxista-leninista-maoista dos quadros do nosso movimento.
10. A LUTA contra a influência corruptora da ideologia, da moral e dos costumes burgueses na ideologia, na moral e nos costumes dos comunistas é uma das frentes em que se desenrola o combate de classe que opõe irredutivelmente o proletariado à burguesia e os marxistas-leninistas aos revisionistas. Por outro lado, essa luta constitui uma forma concreta da luta entre as duas linhas no seio do nosso Movimento.
Eis porque são completamente erróneos e, em última análise, perigosamente desagregadores da nossa unidade e firmeza revolucionárias, os pontos de vista liberais daqueles camaradas que tendem a subestimar a importância desta luta ou a considerar como casos meramente pessoais e insignificantes as manifestações aberrativas do tipo das que temos vindo a analisar.
No Plenum do COMITÉ central, de Julho de 1964, os camaradas do Partido do Trabalho da Albânia, examinando o problema da educação comunista dos trabalhadores, chegaram à seguinte conclusão (que nós, marxistas-leninistas portugueses, jamais deveremos esquecer): «a experiência mostrou que apenas um passo separa a degenerescência moral da degenerescência política».
11.CASOS como os que vimos a analisar na presente decisão constituem uma preciosa vitória para as forças reaccionárias e anti-partido e, reciprocamente, uma pesada derrota para as forças revolucionárias, marxistas-leninistas. Tais casos separam-nos inexoravelmente do proletariado e das massas populares, isolam-nos e impedem-nos de prosseguir no nosso caminho, por mais correctas que sejam a estratégia e a táctica do nosso Movimento.
Ao mesmo tempo, essas manifestações estranhas à moral e aos costumes proletários socavam perigosamente a nossa unidade, adulteram o elevado espírito de camaradagem que deve existir entre os comunistas, suscitam toda a espécie de querelas, disputas e rancores, atacam e desvirtuam o princípio de organização do Partido, que é o centralismo democrático.
Sem um combate firme, intransigente e sem quartel contra essas ideias deletérias e contra os seus portadores no seio do nosso Movimento, jamais estaremos preparados para cumprir a nossa missão histórica na fase actual: a fundação do Partido marxista-leninista-maoísta do proletariado português.
12.TODOS os marinheiros sabem, através de uma longa experiência acumulada, que a parte visível dos icebergs é incomparavelmente mais pequena e menos receável do que a sua parte invisível, submersa. Em consequência, eles não regulam a navegação tendo em conta apenas o bloco de gelo visível, mas, principalmente, tendo em conta aquele bloco que sabem existir e não vêem imediatamente. Por outro lado, se se trata de destruir o iceberg, nenhum quebra-gelos se limitará a atacar-lhe a crista, mas, principalmente, a demolir-lhe a base oculta pelas ondas.
Da mesma maneira, nós também devemos estar prevenidos para o facto que as manifestações visíveis de corrupção moral têm, em regra, uma base oculta mais perigosa ainda – e que é a base política e ideológica de que constituem uma primeira emanação. Por outro lado, destruir essas manifestações impõem que se trave o combate não apenas no campo em que elas são visíveis, mas também nos campos submersos onde escondem as raízes: nos terrenos político, ideológico e de organização, nos campos da teoria e da prática.
Tratar os problemas com ligeireza e de modo superficial nunca dá bons resultados.
13. QUAL é o princípio segundo o qual – política, ideológica e moralmente – o nosso Movimento deve educar-se e deve educar os seus quadros e também os seus simpatizantes?
Esse princípio é o de que todos os comunistas devem «PENSAR, AGIR E VIVER COMO REVOLUCIONÁRIOS»
E em quem nos devemos apoiar para lutar correctamente contra a influência corrupta da ideologia, da moral e dos costumes burgueses na ideologia, na moral e nos costumes dos comunistas?
Devemo-nos apoiar fundamentalmente, por igual e ao mesmo tempo, nos princípios e métodos do marxismo-leninismo-maoísmo, na nossa linha política e nas altas virtudes do Povo.
14. A ESTE RESPEITO, o camarada Enver Hoxha, no seu notável discurso «Como reforçar o partido do ponto de vista organizacional e como educá-lo ideologicamente», pronunciado em 21 de Abril de 1967, disse:
«Para combater as sobrevivências perniciosas na consciência das pessoas, o Partido apoia-se sobre as altas virtudes do Povo. Também os comunistas – e, antes de tudo, os comunistas – devem ser os vectores destas virtudes na sua vida e no seu trabalho, devem ser os que materializam em política e em ideologia esta essência da educação, a qual deve servir como remédio para a cura das doenças que existem ou que se manifestam e repetem na consciência dos homens».
15.QUAIS são as armas mais eficazes de que devemos dispor – e que devemos saber manejar – neste trabalho de educação comunista dos quadros do nosso Movimento?
Essas armas são, ainda e sempre, a crítica e a auto-crítica, isto é, a luta ideológica activa, o exemplo positivo, a opinião das massas e o empenhamento total e sem reservas no caminho da Revolução.
16.AS CONTRADIÇÕES que existem entre as classes no seio da sociedade reflectem-se inevitavelmente no interior do nosso Movimento – como se reflecte no interior de qualquer partido proletário. Esse reflexo consiste aí na oposição e na luta entre ideias de natureza diferente.
Nós devemos compreender que a vida do nosso Movimento cessaria, se não existissem no interior dele contradições e se não houvesse lutas ideológicas para resolvê-las.
Por outro lado, nós devemos compreender também que a luta ideológica activa é uma arma poderosa para atingir a unidade interna do nosso Movimento e que, em consequência, cada revolucionário tem o dever de empunhar decididamente essa arma.
17.O CAMARADA Mao Tsé-tung disse: «Numa sociedade de classes, cada indivíduo existe como membro duma classe determinada e cada forma de pensamento está invariavelmente marcada com o selo duma classe»
É por isso que aqueles elementos que, no seio do nosso Movimento, se fazem eco da ideologia, da moral e dos costumes da burguesia, actuam como agentes – conscientes ou inconscientes – do inimigo de classe e contribuem, em grau maior ou menor, para a realização dos sinistros desígnios desse inimigo em relação a nós: impedir por todos os meios que o nosso Movimento se constitua num partido marxista-leninista-maoista do proletariado português.
O COMITÉ LENINE, em sua Sessão Plenária de Outono de 1972, apreciando os diversos aspectos dos problemas focados acima:
DECIDIU:
I
LANÇAR, sob a palavra de ordem «PENSAR, AGIR E VIVER COMO REVOLUCIONÁRIOS», uma vasta e enérgica CAMPANHA de crítica e auto-crítica, na qual devem participar, sem excepção, todos os quadros e militantes do MRPP, da Federação dos Estudantes Marxistas-Leninistas (FEML) e da Organização dos Portugueses Emigrados e Exilados (Marxistas-Leninistas) – esta designação é provisória.
II
(…)
III
OS OBJECTIVOS da campanha de crítica e de auto-crítica são os seguintes: submeter a um ataque implacável e erradicar das nossas fileiras as manifestações de corrupção ideológica, moral e política do tipo das que analisámos atrás ou com elas aparentadas; isolar ou expulsar resolutamente um ou outro elementos incorrigível que, a despeito de se encontrar no nosso Movimento, segue todavia a ideologia, a moral e os costumes decadentes e corruptos da burguesia e dos seus lacaios revisionistas.
IV
AS FINALIDADES da campanha de crítica e auto-crítica são as seguintes: educar os nossos militantes na concepção proletária do mundo; elevar a sua consciência política, moral e ideológica, através do estudo e da aplicação prática do marxismo-leninismo-maoísmo, seus princípios e seus métodos; rectificar os erros cometidos; consolidar e desenvolver o nosso Movimento nos campos politico, ideológico e de organização, de forma que o MRPP possa cumprir com firmeza e audácia as condições para a criação do partido.
V
SE BEM QUE, por virtude das imposições da clandestinidade, segurança e conspiratividade, a campanha de crítica e auto-crítica não deva tornar público – a não ser com expressa autorização do Comité Lenine – o nome das pessoas que hajam cometido erros graves; tal não significa que não possamos (e que não devamos) aplicar, também nesta matéria, uma correcta linha de massas, estimulando a crítica de massas sobre a nossa actividade e sobre o comportamento dos nossos militantes e recolhendo e analisando cuidadosamente todas as suas opiniões a nosso respeito.
VI
NA CRÍTICA E NA AUTO-CRÍTICA é necessário observar sempre uma posição de princípio correcta e firme, apoiar-se sobre os factos e não sobre simples suspeições, formular as críticas aberta e francamente, face a face, em tempo e local próprios.
Por outro lado, a crítica e a auto-crítica devem, em todas as circunstâncias, caracterizar-se por um objectivo político, moral e ideológico elevados e ter uma função educativa tanto para o indivíduo como para a colectividade revolucionária.
VII
EM RELAÇÃO aos casos de corrupção moral e ideológica, do tipo dos referidos no n.º 1 da presente decisão, o Comité Lenine entende que a organização do Movimento no respectivo escalão deve aplicar uma sanção que, em princípio, não poderá ser inferior à destituição do cargo.
VIII
A ACTUAL campanha de crítica e auto-crítica terá de haver-se com resistências tenazes e deparará com toda a espécie de sabotagens e boicotes, vindos muitas vezes donde menos se esperaria.
Isto é assim, porque a presente campanha de crítica e auto-crítica constitui um novo desenvolvimento da luta entre as duas linhas no seio do nosso Movimento: a linha reaccionária burguesa e revisionista (que, em geral, se mantém todavia oculta) e a linha revolucionária marxista-leninista-maoísta.
A esmagadora maioria dos quadros, que integra e sustenta firmemente a linha revolucionária marxista-leninista-maoísta, deve estar prevenida e preparada para fazer frente e derrotar, ousada e resolutamente, todas as manobras ardilosas visando impedir o triunfo da actual campanha de crítica e auto-crítica.
IX
TEMOS de estar extremamente vigilantes, durante esta vasta e enérgica campanha de crítica e auto-crítica contra dois «aproveitamentos» oportunistas, perfeitamente previsíveis: 1.º o daqueles que invocando as necessidades do trabalho prático, político e de organização, pretendem sabotar e boicotar o desenvolvimento da campanha de crítica e auto-crítica; 2.º o daqueles que, invocando a necessidade da campanha de crítica e de auto-crítica, pretendem sabotar e boicotar a realização das restantes tarefas teóricas e práticas, políticas e de organização do nosso Movimento.
O critério para conhecer do triunfo da campanha de crítica e de auto-crítica reside, precisamente, nos resultados vitoriosos obtidos na realização e cumprimento de todas as tarefas, objectivos e actividades programadas.
Inversamente, tais resultados só serão atingidos se todos e cada um dos quadros PENSAR, AGIR E VIVER COMO REVOLUCIONÁRIO.
COMITÉ LENINE
(Órgão Central do MRPP)
“Numa palavra, devemos aprender a examinar as questões sob todos os seus aspectos, a distinguir não só a face mas também o reverso das coisas e dos fenómenos. Em certas condições, uma coisa má pode dar bons resultados e, por seu lado, qualquer coisa boa pode dar maus resultados. Há mais de 2000 anos Lao Tse dizia já: “sobre a infelicidade apoia-se a felicidade e na felicidade esconde-se a infelicidade”. Quando os japoneses invadiram a China, qualificaram-no como uma vitória. E os chineses qualificaram como derrota a conquista pelo agressor de vastos territórios da China. Todavia na derrota da China estava contido o gérmen da vitória e a vitória do Japão encerrava a sua derrota. A história confirmou isto” (Mao Tsé-tung Ed. Bandeira Vermelha do MRPP, pág. 15).
1—Isto nos ensina o camarada Mao Tsé-tung ao explicar que para o marxismo uma coisa má se pode transformar em boa, uma derrota pode encerrar em si própria os germens de uma vitória. Um facto determinado contém sempre uma contradição entre polos opostos e em luta: “em determinadas condições cada um dos dois aspectos opostos de uma contradição transforma-se infalivelmente no seu contrário, como consequência da luta entre eles. Aqui as condições são importantes. Sem que se verifiquem determinadas condições nenhum dos dois ASPECTOS em luta se pode transformas no seu contrário.” (idem, sublinhados nossos).
2—Recentemente o movimento popular anti-colonial e indirectamente a Federação de Estudantes Marxistas-Leninistas sofreu uma derrota no seu confronto com a polícia fascista. Uma derrota localizada, pequena em extensão e em consequências organizativas, mas politicamente grave no seu significado: dois estudantes militantes anti-coloniais falaram na pide, denunciando ao inimigo aspectos da sua actividade clandestina e das suas ligações orgânicas, atingindo parte do movimento anti-colonial, traindo e pondo em risco companheiros e camaradas que com eles militavam, com a agravante de terem gravemente negligenciado a informação imediata para o exterior do seu comportamento e de, pelo menos num caso, se demonstrar uma completa ausência de sentido autocrítico relativamente ao comportamento assumido.
Para os nossos inimigos, para a burguesia monopolista e para os esbirros, para os revisionistas e todos os oportunistas igualmente apostados na destruição e desprestígio das forças proletárias e dos seus aliados, foi uma pequena vitória. Golpeou-se (ainda que não gravemente) o movimento popular anti-colonial; lançou-se mais uma acha para o fogacho da campanha de calúnias e denúncias com que se tenta desprestigiar aos olhos da classe operária a luta anti-revisionista; tentar-se-á fazer hesitar a determinação militante e revolucionária dos nossos camaradas e companheiros de prosseguir com firmeza e confiança inabaláveis.
Para nós comunistas e para os nossos companheiros estudantes anti-revisionistas empenhados nessa luta, foi um revés. Um golpe, mais político que organizativo, desferido numa movimentação que bem alto tem levantado a bandeira anti-colonialista e anti-revisionista e em que todos os seus militantes devem levar até ao fim, directamente perante a violência do inimigo, na polícia, o espírito de decisão, a coragem, a militância revolucionária de que deram provas nas jornadas de Fevereiro.
Mas nesta derrota localizada pode estar contida quer uma derrota muito mais grave e profunda, mesmo totalmente destruidora, quer o gérmen da nossa vitória nos confrontos com o inimigo, e princípio de uma gloriosa tradição de afrontamento da polícia fascista, cujo exemplo será dado pelos comunistas e firmemente seguido por todos os militantes revolucionários. Como nos ensina o camarada Mao tudo depende da forma como encararmos e resolvermos os diversos aspectos deste facto. Se o soubermos estudar criticamente e a partir dele proceder a uma profunda, ampla e generalizada discussão sobre os aspectos políticos e práticos do porte na polícia, se com essa e outras discussões cimentarmos nos nossos camaradas e nos nossos aliados revolucionários uma férrea consciência de classe capaz de resistir às piores provocações dos terroristas das polícias burguesas, então sim teremos criado as condições para transformar esta pequena derrota numa vitória cem vezes maior!
Se o deixarmos passar em branco, se com chavões dogmáticos, com ares arrogantes, superficialidade e outras banalidades impedirmos os camaradas de o analisarem profundamente à luz dos firmes princípios da militância comunista; se não descermos à prática, do estudo dos exemplos concretos, as belas frases ficarão no tinteiro, todos as saberão de cor para as esquecer nas primeiras noites de tortura do sono ou às primeiras bofetadas. É este tratamento dogmático e oportunista do porte na polícia que fazem os revisionistas; no fundo encerra o receio, a impreparação, a hesitação, a falta de espírito de classe de tais quadros, eloquentemente expressa nas traições em massa, na aceitação geral como normal (e na desculpa) de se falar na pide. Se caíssemos nesta linha estaríamos a criar todas as condições para preparar derrotas muitíssimo mais graves, atingindo não só as forças unitárias e periféricas como a própria organização partidária corroída por ideias falsas e por concepções oportunistas nesta matéria. Mas não será assim!
Saibamos transformar este revés numa grande vitória da preparação revolucionária e da consciência de classe dos comunistas e dos seus aliados, perante todas as violências dos esbirros da burguesia!
3—Nas esquadras, nos postos da G.N.R., na pide, nas cadeias, a luta de classes continua mais implacável do que nunca!
Na dura faina da luta de classes a prisão é um incidente vulgar para o qual todos os camaradas devem estar constantemente preparados. Porque se bem que seja acontecimento normal do nosso combate clandestino e revolucionário, corresponde a um afrontamento especial com o inimigo em que o militante é posto à prova de forma decisiva, completa e profunda. Na cadeia, na pide, directamente perante a violência da classe inimiga e exploradora, a luta da classe operária continua a um nível superior, de uma forma particularmente aguda em que a consciência política, a determinação, a honestidade, em toda a formação revolucionária proletária dum camarada é duramente experimentada.
Para os militantes que caem nas mãos do inimigo e que perante os seus lacaios devem continuar a manter bem alto a Bandeira da Revolução, a luta é a mesma, o inimigo é o mesmo, o objectivo é também o mesmo: defender contra tudo e contra todos a causa do comunismo e da classe operária.
Mas defender atacando! Lá dentro como cá fora, a certeza da vitória reside não numa atitude defensiva e fatalista mas numa posição de ataque decidida e corajosa. Perante a burguesia, perante a pide os nossos camaradas defendem a revolução atacando o inimigo: não falar, além de ser um dever indeclinável dos comunistas é uma grande vitória da nossa ofensiva revolucionária contra o inimigo que o desmoraliza e paralisa. Na cadeia continuamos ao ataque dos grandes bastiões da burguesia.
A batalha pode ser mais dura que nunca, o inimigo aparentemente mais forte, e a única arma em que podemos confiar para vencer é a certeza no triunfo final da nossa luta, é a firmeza férrea nas nossas convicções, é a disposição de tudo sacrificar pela defesa do nosso movimento. E contra esta arma que é a consciência dum militante comunista, que é a sua vontade, que é a sua coragem quotidiana, não houve torturas ao longo da gloriosa história da luta operária mundial capazes de a abater.
Para um comunista, para um militante revolucionário, só existe um comportamento quando a frente da luta de classes se desloca para as masmorras da pide: NÃO TRAIR, NÃO DENUNCIAR, NÃO CONFIRMAR OU FORNECER QUAISQUER PISTAS OU ELEMENTOS AO INIMIGO SOBRE SEJA QUE ASPECTO FÔR DA ACTIVIDADE ILEGAL OU SEMI-LEGAL (UNITÁRIA OU PARTIDÁRIA).
Cada camarada tem à sua conta perante o inimigo, uma fracção maior ou menor da luta a defender. Não chega, porém, conhecer e compreender os princípios que regem tal defesa na polícia. É preciso vivê-los, é preciso que eles componham como parte integrante a nossa formação de militantes revolucionários. É preciso que no momento em que sózinhos estivermos perante os esbirros do inimigo, na tortura do sono, na estátua, nos espancamentos, nunca nos passe pela cabeça, nem como longínqua hipótese, que trair é solução.
Para um revolucionário nada disto é transcendente: é uma questão de princípio essencial que surge com simplicidade e clareza. Difícil, duro, perigoso, este é o único caminho possível à luta dos princípios marxistas-leninistas para a organização do proletariado e dos seus aliados. Quem não compreende ou não aceita tais normas não pode MILITAR NAS FILEIRAS da Revolução, é indigno de permanecer nelas e deve sofrer o correspondente castigo das massas.
A organização que aceita uns ou outros não é uma organização proletária: é uma associação de amigos burgueses que gostam de falar de política, onde campeia o ecletismo, a “compreensão”, a falta de vigilância revolucionária, a ausência dum forte espírito de classe perante os inimigos e os traidores, é uma organização que a polícia neutralizará sem dificuldade. O exemplo que neste campo nos estão a dar os revisionistas do P“C”P ilustra bem na prática o caminho que não devemos trilhar.
Para nós militantes anti-revisionistas que chamámos às nossas organizações unitárias e partidárias a responsabilidade de pela luta diária desmistificar a traição do P“C”P; que é no exemplo e nas vitórias alcançadas nas frentes legais, semi-legais e ilegais de tal combate que estamos reconstruindo um verdadeiro partido revolucionário do proletariado, que defrontamos constantemente o caudal de calúnias e de provocações com que os revisionistas ajudam a repressão policial contra nós virada, e tentam cortar-nos o apoio das massas; para nós, no actual momento táctico mais do que nunca, esta questão de porte na polícia é absolutamente vital.
Só na base duma prática em todos os aspectos revolucionária poderemos construir uma linha correcta, manter o apoio e prestígio entre as massas, neutralizar e desmistificar os bastiões revisionistas e oportunistas. Temos de demonstrar uma total coerência de princípios principalmente nas situações mais difíceis e mais decisivas. Aí onde o revisionismo falha nós temos de mostrar como e porquê vencemos, porque em todas as ocasiões, em todas as frentes de luta, somos o sector mais avançado, consciente e combativo do proletariado. E não só nem principalmente em palavras: estas só se tornarão verdades para as massas se os nossos actos e o nosso comportamento forem, caso a caso, a aplicação dos princípios do marxismo-leninismo às fábricas, aos campos, aos quartéis, nas escolas e na polícia perante o inimigo.
E a firmeza perante o inimigo na polícia educa-se e constrói-se na coerência da nossa actuação política diária contra todas as outras faces da burguesia em todos os sectores da sociedade, em todos os campos da luta de classes.
4— Uma forte consciência política proletária é a base da firme disposição de vencer. Criêmo-la e desenvolvamo-la nas fileiras do nosso movimento, nas organizações aliadas e nos movimentos de unidade revolucionária. É preciso criar em todos os militantes revolucionários uma firme disposição de não querer falar na polícia. Mas não basta afirmar “na polícia só fala quem quer”. Isto é verdade, mas só por si é uma noção simplista e abstracta. É imprescindível ensinar os nossos camaradas a não querer falar, ou seja, dar um conteúdo de classe a este “não querer”. É necessário fornecer-lhes as armas teóricas e práticas de não querer falar na polícia. E o “segredo” de não querer, contra tudo e contra todos, prestar informações ao inimigo é a criação a todos os níveis da nossa organização duma sólida consciência proletária e uma confiança inabalável na nossa luta, no nosso Movimento e na sua linha política. Cimentar pela prática quotidiana do trabalho político, pelo estudo teórico à luz dessa prática, pela discussão e informação das experiências vividas, um verdadeiro espírito proletário perante a luta e a vida, uma formação revolucionária e comunista cada vez mais firme e coerente em todos os campos, criar companheiros e companheiras dispostos a dar se necessário a vida pela defesa do seu partido, eis a base política dum porte revolucionário na polícia, do porte dos verdadeiros militantes da classe operária. É por isso que numa organização realmente proletária o bom comportamento na polícia pode ser a regra enquanto o contrário se passa nos partidos revisionistas; a atitude perante o inimigo não pode ser oportunista nuns casos e revolucionária noutros.
A uma prática revisionista tende a associar-se de forma cada vez mais geral a denúncia e a traição na polícia. O P“C”P aí está a demonstrá-lo.
Mas em muitos camaradas surgem ideias erróneas, dogmáticas, sobre o que seja e como se cria uma consciência política proletária. Estas concepções erróneas conduzirão necessariamente a visões simplistas, perigosas e alheias ao marxismo-leninismo sobre o comportamento na polícia. Vejamos melhor esta questão. Para certas pessoas consciência política é sinónimo de grande “cultura” marxista, de vastos conhecimentos livrescos. “Sabe-se muito”, “lê-se muito”, tem-se um certo desprezo pelos “praticistas”, faz-se a apologia da “investigação etérica” em si mesma: “como poderemos lutar sindicalmente sem termos estudado e definido em todos os seus aspectos o papel do trabalho sindical como questão prévia teórica?”. Nada disto, naturalmente, tem alguma coisa a ver com uma consciência proletária. A cultura livresca e desligada da prática da luta e da vida diária, é um conceito dogmático que servirá para o seu detentor fazer grande alarde de si e dos seus conhecimentos, mas não para enfrentar os inimigos da classe operária. É um monte de inutilidades burguesas que corresponde a uma atitude idealista e reaccionária perante o mundo e a luta. Um certo número de “intelectuais” ditos revolucionários enfileira bem nesta categoria ao lado de um número mais restrito de elementos da classe operária, da sua aristocracia, assimilada pela prática pequeno-burguesa no trabalho político. Na polícia pouco ou nada há a esperar de tais “teóricos” embalsamados. Há sim que fazer em relação às camadas bem intencionadas e sinceras de tais pessoas em chamamento à luta política.
Também a atitude contrária é errada; aos que reagindo contra o teoricismo livresco e burguês fazem a apologia do empirismo, da prática (muitas vezes verdadeiramente dedicada e militante) cega e sem rumo, há que dizer que também tal atitude é reaccionária e idealista; que também ela desarmará os comunistas perante o inimigo minando-lhes a confiança e a certeza científica da sua razão.
Temos que tornar bem claro que a consciência revolucionária nasce e fortalece-se na interacção da teoria e da prática sendo esta o elemento fulcral: uma atitude militante em todas as frentes da luta só o poderá ser, se assumida à luz dos princípios do marxismo-leninismo, mas estes princípios por seu turno não passarão de adornos inúteis se não se possuírem com o fim de agir sobre a realidade. Estudemos muito para que a nossa atitude e a nossa luta sejam cada vez mais exemplares e firmes: é no estudo cuja necessidade é criada pela prática que iremos forjando a férrea determinação e militância da nossa organização comunista.
Esta questão tem extrema importância para o porte na polícia dos quadros de origem burguesa e pequeno-burguesa, intelectuais, estudantes, etc.. Tem-se verificado ultimamente que o comportamento dos estudantes ante o inimigo tem mostrado graves fraquezas. Temos que criar nos estudantes e intelectuais comunistas uma sólida disposição revolucionária de não quebrar ante o inimigo. Mas para isso há que fazer com estas camadas um constante e profundo trabalho de crítica e auto-crítica à sua prática, ao seu trabalho, ao seu comportamento nas suas lutas e na vida diária.
O cerco pequeno-burguês, o meio em que vivem, a propensão para um certo intelectualismo, o liberalismo e o democratismo que importam do seu trabalho legal e sindical para a vida partidária, a grave subestimação táctica que fazem do inimigo crendo que o seu estatuto social lhes confere ilimitada impunidade, tudo são factores que contrariam a criação de um forte espírito militante. Cria-se a ideia que na polícia se escapa “por golpe” ou “por cunha”, que se “embarreta” o inimigo, acredita-se nos ditos e não na firmeza ideológica de não ter falado na polícia, dá-se mostras de arrogância e de total falta de sentido autocrítico. Os estudantes e intelectuais fazem uma grande falta ao nosso movimento. Devemos fazer um sério esforço no sentido de os conquistar e organizar nas fileiras do marxismo-leninismo. Mas tendo em atenção que o meio social em que actuam, à sobrevalorização que do seu papel faz o revisionismo, os vícios que a sua prática por vezes arrasta, têm de ser profunda e minuciosamente criticados em cada caso, fazendo uma cuidadosa selecção dos verdadeiros estudantes e intelectuais de vanguarda, não os hostilizando quando possam vir a ser nossos companheiros, trazendo-os à aliança com a classe operária através da crítica e da auto-crítica.
Os quadros da classe operária, temperados desde sempre na dureza da exploração, da violência burguesa, estão naturalmente mais aptos ao choque com a polícia. Mas há que não ter ideias simplistas ou mecanicistas neste campo. A classe operária sofre um apertado cerco da ideologia burguesa e as suas fileiras estão ainda bem marcadas pela longa prática das concepções revisionistas e oportunistas amolecedoras da firmeza e determinação. Eis porque neste ambiente minado um trabalhador ideologicamente desarmado ante o inimigo é presa fácil para os seus ardis. Um trabalhador que não vive verdadeiramente na prática a justiça da luta da sua classe cairá, tal como um estudante que não se libertou verdadeiramente da ideologia da sua classe. Não nos esqueçamos que estrategicamente o inimigo tem os pés de barro, mas que tacticamente possui uma longa experiência de torturas físicas e psicológicas a todos os níveis e a determinação profunda de vencer. E no nosso movimento, bem como nas organizações periféricas, criámos e criaremos cada vez mais pela nossa luta e pelo nosso estudo um sólido corpo de homens e mulheres comunistas dispostos a vencer contra todos os obstáculos.
Generalizar mais e mais as discussões sobre este tema, aprofundar a luta ideológica e política no seio do movimento e no combate revolucionário, detectar e combater as concepções derrotistas ou de tolerância pequeno-burguesas porventura existentes nas nossas fileiras, eis como gerar a todos os níveis um forte espírito militante, uma autêntica consciência comunista, uma barreira de ferro ante os torturadores fascistas.
5 – Estudemos e critiquemos os casos concretos. Preparemo-nos na prática para enfrentar o inimigo e vencer.
Para além dos aspectos políticos da questão, que são os aspectos essenciais pois se prendem à definição de uma posição de classe, da posição do proletariado, quanto ao porte na polícia, assumem, nesta matéria uma grande importância as questões práticas e concretas.
Nas fileiras revisionistas, nesta matéria, como forma de pôr a discussão à superfície, como forma de fugir às consequências que se têm de tirar duma já longa e quase constante prática de mau porte ante o inimigo, consequências que nos levam a decretar a natureza de classe pequeno-burguesa da política dos dirigentes do PCP, o comportamento na polícia recebeu um tratamento formal e abstracto: decoram-se frases onde não se aprofunda sobre a natureza de classe do problema. Os quadros sentem-se pouco à vontade para ultrapassar os grandes mitos. Paralelamente criam-se uma série de mitos, pessoas a conceber situações muito longe da realidade.
Impreparadas politicamente as pessoas são surpreendidas pela prática aparentemente desconcertante e contraditória do contacto concreto com o inimigo. Temos que ultrapassar este problema: a surpresa pode desorientar. Também certas pessoas não sabem que atitude tomar de acordo com as circunstâncias concretas que revestiu a prisão, podendo ser levadas a cometer erros por vezes dificilmente reparáveis. Como actua a polícia, o que são e como decorrem os interrogatórios, qual a atitude táctica a assumir de acordo com as circunstâncias da prisão, qual a melhor defesa ante os vários tipos de tortura, quais os cuidados a ter ante as manhas e ardis da pide para enfraquecer a nossa vigilância, que formas de luta adoptar durante os interrogatórios, nos vários casos, etc., são questões muito importantes e complementares da posição de fundo. Temos de fomentar uma ampla e crítica troca de experiências, debater os vários casos possíveis, estudar, antes de cada reunião, de cada deslocação, qual a defesa a adoptar em caso de prisão. Os camaradas que já passaram pela pide devem relatar com minúcia os pormenores das várias operações policiais: assalto às casas, buscas, interrogatórios, etc.. Devemos penetrar o mais fundo possível na realidade da repressão para aí nos podermos defender com mais segurança e confiança. Devemos realmente encarar a prisão como uma séria contingência do nosso trabalho e estarmos na teoria e na prática preparados para vencer.
Lancemos, a par da discussão política do porte na polícia, uma ampla informação e debate sobre as questões práticas e concretas da luta na pide.
6 – Decisões finais
Tendo em atenção a necessidade de aproveitar a recente derrota sofrida na pide por forma a transformá-la numa vitória da nossa resistência revolucionária à repressão, bem como os princípios que devem reger os militantes comunistas no seu afrontamento com a polícia, o Comité Lenine decidiu:
1.º ) Apelar para uma intensificação da luta ideológica e de trabalho teórico no nosso Movimento, centrado no estudo da nossa imprensa e com a preocupação de a tornar um instrumento da intensificação e aperfeiçoamento da luta;
2.º ) Reforçar as nossas tarefas de actividade política, o nosso espírito militante e a nossa vigilância revolucionária pelo sistemático recurso no trabalho à crítica e à autocrítica;
3.º ) Proceder a um debate geral sobre a linha proletária do porte na polícia centrado neste documento, completando essa discussão com a informação e crítica da experiências conhecidas, fomentando a participação activa de todos os camaradas que permita uma ampla apreciação dos pontos de vista e das dúvidas que possam existir;
4.º ) Iniciar os trabalhos de preparação duma brochura que à luz dos princípios aqui citados, refira qual a realidade concreta da prisão e quais as formas concretas de resistência e de luta a adoptar com vista à vitória sobre o inimigo.
CRIEMOS UMA BARREIRA DE FERRO ANTE OS TORTURADORES DA BURGUESIA!
CRIEMOS UM VERDADEIRO PORTE COMUNISTA NA POLÍCIA!
NA PRISÃO OU CÁ FORA A LUTA CONTINUA: NA DEFESA DA CLASSE OPERÁRIA VENCER CONTRA TUDO E CONTRA TODOS!
NO M.R.P.P. E NAS ORGANIZAÇÕES POPULARES REVOLUCIONÁRIAS NINGUÉM FALA!
Comité Lenine
1 -- O DIA 5 de março do próximo ano de 1973 marca o vigésimo aniversário da morte do grande Estaline.
É com o mais profundo respeito pelo eminente camarada J. V. Estaline que a classe operária portuguesa, os marxistas-leninistas, o proletariado e os povos revolucionários de todo o mundo vivem essa data, exprimem a sua imensa dor pela perda de um dos seus maiores líderes e assumem a determinação inabalável de lutar, seguindo o caminho, o exemplo e a bandeira de Estaline, até à vitória final.
2 -- ESTALINE foi, após a morte de Marx, de Engels e de Lenine, o grande dirigente do movimento comunista internacional, o grande educador do proletariado e dos povos oprimidos do mundo inteiro.
Estaline salvaguardou, desenvolveu e continuou a causa do leninismo na luta sem quartel contra os inimigos de classe, tanto do interior como do exterior da União Soviética, e contra os oportunistas de direita e de «esquerda» no seio do Partido Bolchevique.
3 -- FOI sob a direcção de Estaline que o povo soviético avançou vitoriosamente na via do socialismo e erigiu o primeiro Estado socialista do mundo;
Foi sob a direcção de Estaline que o povo soviético pôs de pé uma formidável indústria pesada e realizou a colectivização da agricultura;
Foi sob a direcção de Estaline que o povo soviético, fazendo prova dum heroísmo lendário, se tornou, durante a Segunda Guerra Mundial, o principal obreiro da vitória sobre a agressão fascista e nazi e obteve magníficos sucessos que ficarão para sempre imortais na história da humanidade;
Foi sob a direcção de Estaline que o povo soviético transformou a sua pátria, relativamente atrasada do ponto de vista do desenvolvimento económico, numa força colossal;
Foi sob a direcção de Estaline que se criou o poderoso campo socialista.
4 -- AINDA em vida do grande J. V. Estaline, o camarada Mao Tsé-tung, aplicando a teoria marxista-leninista, resolveu de maneira criadora os problemas fundamentais da revolução chinesa e dirigiu o povo chinês nas lutas e guerras evolucionárias mais longas, mais encarniçadas, mais duras e mais complexas da história da revolução mundial proletária e conduziu a revolução popular à vitória num grande país do Oriente, como é a China. Essa é a maior vitória da revolução mundial proletária, depois da revolução de Outubro.
5 -- A HISTÓRIA, porém, é plena de vicissitudes; e o caminho da Revolução não é nem recto nem plano, mas sinuoso, semeado de obstáculos, cheio de curvas e contracurvas.
É assim que hoje – 55 anos após o triunfo da grande Revolução Socialista de Outubro; 50 anos após a fundação da grande União Soviética e 20 anos após a morte do grande Estaline – é assim que hoje, o proletariado e o povo soviético, explorados, amordaçados e oprimidos, espoliados de todas as suas conquistas revolucionárias, assumem a determinação de celebrar Estaline, ainda que o tenham de fazer, tal como o proletariado e o povo português, nas condições de uma luta ilegal e clandestina.
6 -- NO XX CONGRESSO do Partido Comunista da União Soviética, que se realizou em Fevereiro de 1956, o grupo de Krouchtchev, após três anos de preparativos, lançou um violento ataque de surpresa contra os princípios fundamentais do marxismo-leninismo e contra a linha geral marxista-leninista seguida pelo Partido Comunista da União Soviética sob a direcção de Estaline.
7 -- RECORRENDO às invenções e calúnias mais torpes e baseando-se em «documentos» e declarações de elementos hostis ao socialismo, Krouchtchev, através do seu famigerado «relatório secreto» – que ele, em breve, faria chegar discretamente às mãos da CIA, para que o publicasse! – Krouchtchev denegria a via gloriosa seguida pelo Partido Bolchevique depois da morte de Vladimir Ilitch Lenine, definindo-a como uma via «esmaltada de erros, de graves alterações e de crimes monstruosos».
Ao mesmo tempo, atribuía a Estaline a responsabilidade desses pretensos erros, crimes e alterações, acusando-o de «arbitrariedade feroz», de «ruptura com a vida e a realidade», etc., e qualificando-o, entre outras injúrias, de «déspota», de «terrorista» e de «inculto». Enquanto isto, Krouchtchev expulsara e encarcerara os autênticos quadros bolcheviques do Partido e reabilitava os inimigos do regime socialista, já condenados como agentes notórios do imperialismo.
8 -- ANALISANDO este pérfido ataque de Krouchtchev, numa altura em que a verdadeira face deste renegado apenas começava a desenhar-se à luz do dia, o camarada Mao Tsé-tung indicou duma maneira penetrante, na sua Alocução perante a Segunda Sessão Plenária do Comité Central do Partido Comunista da China, em 15 de Novembro de 1956: «Na minha opinião há duas “espadas”: uma é Lenine, e a outra é Estaline. Essa espada que é Estaline, os russos rejeitaram-na agora. Essa espada que é Lenine não foi também algo rejeitada por certos dirigentes soviéticos? Penso que ela o foi em larga medida».
9 -- DE FACTO, o XX Congresso e o «relatório secreto» constituem o último acto, o coroamento dum golpe de Estado contra-revolucionário preparado desde a morte de Estaline, golpe que transformou a ditadura do proletariado em ditadura da burguesia e que, substituindo o socialismo, restaurou o capitalismo na União Soviética.
Krouchtchev – um responsável que, dissimulado no seio do partido Comunista da União Soviética, seguia a via capitalista – é, conjuntamente com outros elementos revisionistas, o executor-chefe deste golpe, pelo qual a burguesia logrou usurpar a direcção do Partido e do Estado soviéticos.
10 -- DO PONTO de vista da luta de classes ao nível mundial e, nomeadamente, no que concerne à contradição que opõe os países socialistas aos países imperialistas, a restauração do capitalismo e da ditadura da burguesia na União Soviética, representa uma derrota temporária para as forças do socialismo e uma vitória, também temporária, para as forças do imperialismo e da reacção.
O proletariado, porém, instruído pelos erros e reveses do passado e orientado pela doutrina sempre jovem do marxismo-leninismo, está apto a criar as condições que transformam uma derrota passageira numa vitória duradoira e de significado ainda maior.
11 -- O OBJECTIVO confessado do imperialismo em relação ao País dos Sovietes sempre foi, desde o triunfo da grande Revolução Socialista de Outubro, o de destruir aí a ditadura do proletariado e restaurar a ditadura do capital. Para alcançar este objectivo, os imperialistas começaram por seguir uma política de intervenção e agressão militar directas.
Mas a União Soviética, sob a direcção de Lenine e de Estaline, era uma fortaleza inexpugnável. Nem a intervenção armada de catorze países, nem a rebelião da guarda branca, nem os ataques de milhões de soldados das hordas hitlerianas, nem as inumeráveis sabotagens e tentativas de subversão, nem o bloqueio e cerco dos imperialistas foi capaz de tomar essa fortaleza.
12 -- O TERMO da Segunda Grande Guerra trouxe uma modificação radical na relação de forças no mundo, com vantagem para o socialismo. As contradições entre o campo imperialista e reaccionário, por um lado, e o campo socialista e democrático, por outro, agudizaram-se como nunca.
A União Soviética, a despeito de ter sofrido perdas humanas e materiais mais pesadas do que qualquer outro país, saiu, todavia, daquela guerra politicamente e militarmente mais poderosa. A sua autoridade e o seu prestígio internacional haviam-se acrescido consideravelmente.
O objectivo final do imperialismo – agora capitaneado pelo imperialismo americano – continuou a ser o mesmo de sempre em relação aos países socialistas e, em particular, em relação à União Soviética.
13 -- PORÉM, o camarada Mao Tsé-tung, fazendo o balanço da situação mundial à saída da Segunda Grande Guerra e analisando a política do imperialismo, afirmou, numa entrevista concedida em Agosto de 1946: «Os Estados Unidos e a União Soviética estão separados por uma zona muito vasta, que engloba numerosos países capitalistas, coloniais e semi-coloniais na Europa, na Ásia e na África. Enquanto os reaccionários americanos não tiverem submetido estes países, um ataque contra a União Soviética está fora de questão».
E, na verdade, o imperialismo americano servia-se da «cruzada» anti-soviética como duma cortina de fumo, atrás da qual ia agredindo e submetendo os povos da vasta zona intermédia.
14 -- AO MESMO TEMPO que punha em prática esta linha de agressão e sujeição económica, política e militar, o imperialismo mundial, após a morte de Estaline, prosseguiu na União Soviética uma política de «evolução pacífica» por intermédio da clique dos renegados revisionistas, julgando assim poder escapar à sua perda.
O golpe de Estado contra-revolucionário de Krouchtchev e respectiva camarilha constitui o coroamento desta política imperialista de «evolução pacífica».
Tal como Estaline disse – na história do Partido Comunista (bolchevique) da URSS –, «é do interior que mais facilmente se tomam as fortalezas». E, de facto, o golpe de Krouchtchev desempenhou um papel que os imperialistas, por si sós, não podiam nunca desempenhar.
15 -- COMO é que o capitalismo pôde ser restaurado na União Soviética, primeiro Estado socialista do mundo?
É à luz do maoísmo – o marxismo-leninismo da nossa época, da época em que o imperialismo se precipita para a ruína total e o socialismo avança para a vitória no mundo inteiro –, é à luz do maoísmo que devemos examinar e resolver esta e outras questões de transcendente importância e actualidade para a classe operária de todos os países.
O camarada Mao Tsé-tung procedeu a um balanço completo da experiência histórica da ditadura do proletariado nos seus aspectos positivos e negativos, herdou, defendeu e desenvolveu a teoria marxista-leninista da revolução proletária e da ditadura do proletariado, formulou a grande teoria da continuação da revolução sob a ditadura do proletariado e resolveu, assim, teórica e praticamente, o mais importante problema da nossa época, a saber: a consolidação da ditadura do proletariado e a prevenção da restauração do capitalismo, de modo a levar até ao fim a revolução proletária.
16 -- «A SOCIEDADE socialista estende-se por um assaz longo período histórico, no decurso do qual continuam a existir classes, contradições de classes e luta de classes, da mesma maneira que a luta entre a via socialista e a via capitalista e bem assim o perigo duma restauração do capitalismo» – disse o camarada Mao Tsé-tung em 1962.
Na sociedade socialista também o centro da luta de classes continua a ser a questão do poder político. A este respeito, o camarada Mao salientou: «Os representantes da burguesia que se infiltraram no Partido, no governo, no exército e nos diferentes sectores do domínio cultural, constituem uma súcia de revisionistas contra-revolucionários. Se a ocasião se lhes apresentasse, eles arrancariam o poder e transformariam a ditadura do proletariado em ditadura da burguesia».
17 -- É ASSIM QUE, na União Soviética, mesmo após a revolução de Outubro que arrancou o poder à burguesia e instaurou o poder proletário, as classes, as contradições de classes e a luta de classes não deixaram nunca de existir.
Tanto no tempo de Lenine como no tempo de Estaline, essa luta de classes sob a ditadura do proletariado assumiu, por vezes, formas extremamente encarniçadas. Um certo número de elementos contra-revolucionários, representantes da burguesia destronada e do imperialismo, infiltrou-se no seio do Partido Bolchevique e na direcção do Estado soviético e procedia aí a toda uma espécie de preparativos e de manobras no sentido de – tal como Lenine o havia previsto em «A Revolução Proletária e o Renegado Kaustsky» – transformar a «esperança duma restauração» do capitalismo em «tentativas de restauração».
18 -- É CERTO que o glorioso Partido Bolchevique, sob a direcção do camarada Estaline, eliminou pronta e resolutamente os principais representantes dessa camarilha contra-revolucionária, tais como Trostsky, Zinoviev, Kamenev, Bukarine e Rykov.
Todavia a União Soviética, porque era o primeiro país de ditadura do proletariado, não dispunha ainda de suficiente experiência para resolver correcta e completamente, tanto do ponto de vista teórico como do ponto de vista prático, a magna questão de saber consolidar a ditadura do proletariado, prevenir a restauração do capitalismo e levar a revolução socialista até ao fim.
Foi nestas circunstâncias que Krouchtchev e respectiva clique revisionista lograram, após a morte de Estaline, usurpar a direcção do Partido e do Estado e converter as suas esperanças de restauração do capitalismo em realidade de facto.
19 -- MAS a classe operária aprende tanto com as suas derrotas como com as suas vitórias e, num certo sentido, aprende mesmo mais com os seus reveses do que com os seus êxitos.
Extraindo as lições da História, o maoismo ensinou aos operários de todos os países que, para consolidar a ditadura do proletariado e prevenir a restauração do capitalismo, a classe operária deve fazer a revolução socialista tanto na frente económica como na frente política, ideológica e cultural e exercer em toda a linha uma ditadura sobre a burguesia também nos domínios da superestrutura, incluindo os vários sectores da cultura.
20 -- POR OUTRO LADO, na continuação da revolução sob a ditadura do proletariado é absolutamente indispensável que, não apenas os militantes e quadros do partido, mas também as amplas massas do povo assimilem o marxismo-leninismo-maoísmo e saibam manejar eles próprios essa arma poderosíssima, de modo a serem capazes de distinguir por si mesmos o certo do errado, a linha revolucionária da linha revisionista, a via socialista da via capitalista, o verdadeiro marxismo-leninismo-maoísmo do pseudo «marxismo-leninismo-maoísmo» – e isto para garantir que o país avance sempre pela linha revolucionária.
21 -- A GRANDE Revolução Cultural Proletária, iniciada e dirigida pessoalmente pelo camarada Mao Tsé-tung, representou uma nova etapa, ainda mais profunda e mais ampla, do desenvolvimento da revolução socialista na China. Porém, a sua significação não é meramente local, mas verdadeiramente universal. A Grande Revolução Cultural Proletária da China constitui uma aplicação e confirmação práticas, de transcendente significado histórico, da correcção e verdade científicas das brilhantes teses do camarada Mao Tsé-tung para todo o período em que durar a ditadura do proletariado.
22 -- APÓS o golpe de Estado contra-revolucionário da camarilha dos renegados revisionistas soviéticos, Krouchtchev, ao mesmo tempo que se dedicava à tarefa interna de consolidar o poder político e económico da burguesia soviética, procura impor aos demais partidos comunistas as teses peçonhentas e anti-proletárias aprovadas no XX Congresso do PCUS.
Para este efeito, Krouchtchev contava beneficiar tanto do efeito de surpresa com que tinha desferido o seu golpe, como do imenso caudal de simpatia, prestígio e autoridade de que justamente gozavam o Partido Bolchevique e a União Soviética sob a direcção de Lenine e Estaline.
23 -- CONTUDO, os verdadeiros comunistas de todos os países não se deixaram colher pela surpresa do ataque de Krouchtchev nem se atemorizaram com o facto de terem de desmascarar os traidores infiltrados no glorioso partido de Lenine e Estaline.
A tarefa inadiável que se colocou aos verdadeiros comunistas de todo o mundo, no seio do Movimento Comunista Internacional e no seio dos seus próprios partidos, era a de salvaguardar e continuar o marxismo-leninismo e combater com determinação o revisionismo da renegada camarilha soviética. Ao fazê-lo, os marxistas-leninistas de todos os países prestavam – e prestaram – um sincero, internacionalista e fraternal apoio ao proletariado e ao povo soviéticos.
24 -- O PARTIDO do Trabalho da Albânia, dirigido pelo camarada Enver Hoxha e o Partido Comunista da China, sob a direcção do camarada Mao Tsé-tung constituíram desde logo a vanguarda do proletariado mundial nesta batalha histórica contra o revisionismo moderno.
Daí para cá, os êxitos obtidos pela linha revolucionária marxista-leninista são magníficos e a situação actual é excelente. O carácter e a natureza de classe reaccionária do revisionismo, do social-fascismo e do social-imperialismo foi posto a nu aos olhos das massas trabalhadoras de todo o mundo. O isolamento da renegada camarilha revisionista soviética, bem como das suas agências no estrangeiro, é absolutamente irreversível.
25 -- SIMULTANEAMENTE reforçou-se como nunca a frente mundial anti-imperialista, com a China como base vermelha da Revolução; alcançou-se uma unidade nova e superior no seio do movimento comunista internacional, na base dos princípios e dos métodos do marxismo-leninismo-maoísmo; fortaleceu-se o poder político, económico e militar do conjunto dos países socialistas.
Por outro lado, em todos os países existem já, ou estão em vias de constituir-se, autênticos partidos revolucionários do proletariado, partidos fiéis ao marxismo-leninismo e dignos da Grande Revolução Cultural Proletária. E isto, inclusive, no próprio país social-imperialista.
26 -- VIMOS, portanto, que em relação aos genuínos partidos comunistas, marxistas-leninistas, as teses revisionistas do XX Congresso não conseguiram penetrar. Tais teses contra-revolucionárias não só foram firmemente recusadas pelos autênticos partidos comunistas como, em resultado do combate puro que foi necessário opor-lhes, acabaram por fortalecer ainda mais as suas fileiras.
Contudo, em relação a certos partidos ditos comunistas o mesmo não se verificou. Esses partidos não só não combateram, no mínimo que fosse, o «novo curso» revisionista, como se apressaram até a exibir imediatamente nas suas próprias montras a «nova» encomenda despachada de Moscovo.
No número destes últimos, conta-se o chamado Partido Comunista Português.
27 -- POR CONSEGUINTE, em relação à mercadoria revisionista posta à venda no XX Congresso do PCUS pelo magarefe Krouchtchev, os diversos partidos comunistas existentes dividiram-se em dois grupos radicalmente antagónicos: o grupo dos que consideram a mercadoria excelente e se fizeram dela clientes e revendedores, a retalho e por grosso; e o grupo dos que consideram, muito justamente, que jamais se deveria deixar passar semelhante mercadoria na alfândega do proletariado e que, portanto, era seu dever queimá-la na praça pública.
Ao primeiro grupo pertence – entre outros – o Partido dito Comunista Português.
28 -- É EVIDENTE que a atitude que adoptaram face ao revisionismo destilado no XX Congresso e a posição que tomaram na luta que subsequentemente se travou serviam, antes e além de mais, para revelar na prática quais os partidos comunistas que tinham e seguiam uma linha proletária e quais os partidos que, embora sob o nome de comunistas, tinham e seguiam já uma linha burguesa e reaccionária.
De facto, não foi por terem «comprado» a mercadoria vendida no XX Congresso que os partidos do tipo do Partido «Comunista» Português se transformaram em revisionistas. Ao contrário – foi porque os partidos do tipo do Partido «Comunista» Português tinham já há muito degenerado em partidos revisionistas que eles se apressaram a «comprar» a mercadoria vendida no XX Congresso.
29 -- SÃO duas coisas radicalmente diferentes no seu significado e alcance, tanto teórico como prático: uma, o dizer-se que o Partido «Comunista» Português se tornou revisionista, porque adoptou as teses do XX Congresso; outra, o dizer-se que ele adoptou as teses do XX Congresso porque já era revisionista.
Como são duas coisas completamente distintas no seu significado e alcance, tanto teórico como prático: uma, o determinar o momento em que um partido comunista – supondo que o P«C»P alguma vez o fosse – se transformou em revisionista; outra, o determinar o momento em que os comunistas tomaram consciência dessa transformação.
É óbvio que entre os dois momentos – o da transformação objectiva e o momento do conhecimento subjectivo dessa transformação – pode mediar um intervalo de tempo maior ou menor.
30 -- A IMPORTÂNCIA prática desta questão liga-se ao problema das cisões que tiveram lugar no seio dos antigos partidos comunistas, cujas direcções se mantiveram fiéis à súcia dos renegados revisionistas soviéticos.
Assim que os marxistas-leninistas dos respectivos países se tornaram conscientes do triunfo político, ideológico e organizativo do revisionismo nos seus próprios partidos; e uma vez que se aperceberam de que a ruptura com o revisionismo era não só inevitável como imprescindível para poder fazer-se a revolução e construir o socialismo – a reorganização do Partido do Proletariado passou a ser para eles um dever inadiável e a sua tarefa central.
31 -- MAS para começar e executar a tarefa urgente da reorganização do partido, os elementos mais conscientes e avançados do proletariado têm de definir, previamente e no fundamental, duas coisas: a linha política, ideológica e organizativa que deve presidir à reorganização; e a demarcação clara dos marxistas-leninistas face aos revisionistas do antigo partido.
Para obter esta demarcação clara é indispensável determinar o momento a partir do qual o antigo partido comunista se transformou objectivamente no seu contrário, isto é, num partido revisionista moderno; e, além disso, encontrar as causas e as condições que explicam essa transformação.
32 -- ISTO implica que toda a teoria e a prática passadas do antigo partido comunista sejam submetidas a uma análise materialista e a uma crítica em termos marxistas-leninistas.
Mas a crítica ao antigo partido comunista, na medida em que é encabeçado por elementos marxistas-leninistas saídos do seu seio, é absolutamente indissociável da auto-crítica desses mesmos elementos – os quais são também responsáveis pela transformação revisionista que se operou no partido onde sempre militaram.
33 -- EM ALGUNS países, porém – como são os casos de Portugal e da Itália, por exemplo – os elementos que, membros do antigo partido comunista tomaram a seu cargo a tarefa de reorganizar as fileiras dos marxistas-leninistas, não foram capazes, por virtude do oportunismo a que se atasquinhavam, de levar até às últimas consequências a análise crítica e a auto-crítica que se impunham.
A moral da história é a de que, nas fileiras de um partido revisionista, até os elementos anti-revisionistas estão marcados com o selo do revisionismo.
34 -- AGARRARAM-SE, então, esses elementos a uma suprema mistificação, através da qual julgaram poder escamotear aos olhos das massas a quota-parte de responsabilidade pesada e própria que tiveram no processo de degenerescência revisionista do «seu» partido.
Essa mistificação ideológica consistiu em considerarem que o antigo partido comunista – do qual sempre fizeram parte e com o qual sempre estiveram em «coexistência pacífica» – se transformara em partido revisionista, no momento em que eles tiveram consciência da dita transformação.
35 -- COLOCADAS as coisas neste pé, eles apenas teriam de «auto-criticar-se» pelo facto de não terem tido mais cedo consciência do fenómeno. Mas é evidente que esta pseudo-auto-crítica é um verdadeiro auto-elogio, na medida em que, ainda assim e apesar de tudo, eles teriam sido os primeiros a aperceberem-se do mal… As massas não tinham mais do que renderem-se à «clarividência desses líderes, ainda que pensassem lá para si que em terra de cegos quem tem um olho é rei!
Para que aquela mistificação tivesse uma certa aparência de verdade, faltava ainda explicar o seguinte: qual a causa, ou as causas reais da transformação meteórica do partido comunista em partido revisionista?
36 -- AQUI, esses elementos «marxistas-leninistas» vêem-se apanhados na sua fraude ideológica. E, para esconde-la, recorrem a uma segunda fraude, verdadeiramente delirante. Ouçamos a «explicação» da confraria neo-revisionista:
«O Partido Comunista cessara de existir como tal em 1956».
Então porquê? – perguntamos nós. E esses pândegos da lúmpen-emigração, baralhando a mão direita com a mão esquerda, confundindo o branco com o preto e a causa com o efeito, respondem-nos: por virtude de «o afastamento por doença do camarada José Gregório» e do «advento do revisionismo na URSS» – Informe ao V Congresso (Reconstitutivo) do P «C» de P, pág. 18 .
37 -- EM RELAÇÃO ao processo de desenvolvimento do Partido dito Comunista Português, o triunfo do revisionismo na União Soviética e o afastamento por doença do «camarada» José Gregório, têm o carácter de factores externos e funcionam apenas como tal, quer dizer, funcionam apenas nessa qualidade de factores ou causas externas.
Por maior que seja a sua importância e alcance, esses factores só podem exercê-los no processo de desenvolvimento e transformação do partido dito comunista através de causas internas. O que é essencial é encontrar estas causas internas, sendo absolutamente secundário – embora necessário – o conhecimento dos factores externos.
38 -- TODOS os marxistas-leninistas sabem que «a causa fundamental do desenvolvimento dos fenómenos não é externa, mas interna; ela reside no contraditório do interior dos próprios fenómenos». E sabem que as causas externas «são apenas capazes de provocar o movimento mecânico dos fenómenos, isto é, modificações de volume, de quantidade, não podendo explicar porque os fenómenos são duma diversidade qualitativa infinita, a razão por que passam duma qualidade a outa» (da Contradição).
Nesse sentido, tanto o triunfo do revisionismo na União Soviética exerceu uma influência indirecta no processo de degenerescência dos velhos partidos comunistas, como a degerenescência dos velhos partidos comunistas exerceu uma influência indirecta no triunfo do revisionismo na União Soviética.
39 -- O NOSSO movimento foi o primeiro – e o único – a proceder a um balanço crítico do conjunto, na base dos princípios e métodos do marxismo-leninismo-maoismo, dos cinquenta anos de actividade do Partido «Comunista» Português (ver Bandeira Vermelha n.º 1) – cumprindo assim, no essencial, uma das condições necessárias e prévias à reorganização das hostes comunistas nas condições concretas da revolução em Portugal.
A conclusão geral extraída desse balanço é a seguinte: o Partido «Comunista» Português, a despeito do nome que desde o princípio ostentou, seguiu, ao longo da sua história e no fundamental, sempre uma linha oportunista e não uma verdadeira linha marxista-leninista. Em certos momentos episódicos, sob pressão de sua base operária, do movimento de massas e do movimento comunista internacional, viu-se forçado a fazer certas concessões ao proletariado e ao povo, sempre sem revelar qualquer disposição prática de as cumprir e renegando-as na próxima oportunidade.
40 -- A CISÃO da confraria neo-revisionista não tem, por conseguinte, o carácter e a natureza duma ruptura entre o marxismo-leninismo-maoísmo e o revisionismo moderno, mas o carácter e a natureza duma divisão no seio do próprio revisionismo. Eles são os neo-revisionistas, na nossa terminologia, e para os «distinguir» do revisionismo cunhalista. Eles são os Breszhnev, enquanto Cunhal é o Krouchtchev. Ou doutra maneira: eles são, em Portugal, os Liou Chao Chis da China.
A cisão dessa gentalha com o cunhalismo é a tentativa de perpetuar, sob novas vestes, o velho revisionismo. Por outro lado, a cisão dessa gentalha constitui o começo da desagregação do partido revisionista.
41 -- QUANTO ao nosso Movimento, as divergências que o opõem ao partido cunhalista e a todos os seus filhos e netos são absolutamente inconciliáveis e antagónicas. Não se trata de divergências meramente tácticas ou sequer estratégicas, mas ideológicas e fundamentais. Nestes termos, o nosso Movimento propõe-se à organização dum novo Partido sobre a base dos princípios e métodos do marxismo-leninismo-maoísmo, fundindo intimamente a teoria e a prática do proletariado mundial, tal como foram sintetizadas e sistematizadas por Marx, Engels, Lenine, Estaline e Mao Tsé-tung, com o movimento operário português – o do passado, o do presente e o do futuro.
42 -- CELEBRAR Estaline é para nós, educarmo-nos na escola que ele nos legou, cerrarmos punhos e dentes, unirmo-nos ainda mais sob a sua bandeira vermelha e marcharmos a uma só cadência, confiantes e audazes, para a tarefa da fundação do partido marxista-leninista-maoísta do proletariado português.
A atitude perante Estaline é uma pedra de toque infalível para distinguir hoje no mundo quem são os marxistas-leninistas e quem são os revisionistas de todos os matizes e tendências.
43 -- EM RELAÇÃO ao grande Lenine, os revisionistas modernos, com a clique renegada de Brezhnev e Ca. à frente, fingem hipocritamente venerá-lo e segui-lo, invocando a cada passo o seu nome na esperança vã de fazer passar aos olhos das massas como leninismo «puro» aquilo que outra coisa não é senão uma pacotilha revisionista, social-fascista, social-imperialista e social-militarista.
Mas em relação ao grande Estaline, os revisionistas nenhuma espécie de hipocrisia se consentiram. Estaline estava demasiado vivo no coração e na inteligência dos revolucionários e dos povos de todo o mundo, para que os revisionistas o pudessem acreditar morto no seu mausoléu do Kremlin.
44 -- EM TODO o lugar onde seja pronunciada esta simples palavra: Estaline! – logo um poderoso campo magnético expele para a direita a escumalha revisionista, os reaccionários e todos os seus lacaios, e agrupa firmemente à esquerda os marxistas-leninistas, os revolucionários, o proletariado e as amplas massas do povo, isto é, os discípulos de Estaline.
Ainda agora, os imperialistas ianques acabam de anunciar as maiores manobras militares de Inverno levadas a cabo pela Nato na Europa. Têm a duração prevista de dois meses, envolvem forças de terra, mar e ar, empregam 50 mil soldados, dos quais 10 000 serão deslocados das suas bases na «retaguarda» americana em 24 horas, etc., etc.. Começarão no dia 9 de Janeiro do próximo ano e terminarão – adivinhem! – no dia 5 de Março.
Significativo! 20 anos após a morte do grande Estaline!
45 -- COM RESPEITO a Estaline, aparece também uma terceira via que procura conciliar o inconciliável e harmonizar os contrários em luta. Originariamente aparecida em França e na Itália, essa via conta com uma representação em Portugal.
Esses histriões, quando tratam deste assunto, declaram logo na primeira linha que «Estaline foi um eminente marxista-leninista» e levam as restantes duzentas linhas a denegrir o eminente marxista-leninista que foi Estaline.
São incuráveis direitistas. Não resistem à contra-prova do campo magnético!
46 -- NO DIA 21 de Dezembro de 1979, celebrar-se-á em todo o mundo o centenário do nascimento do camarada J. V. Estaline.
Nós festejá-lo-emos, sem dúvida, melhor do que vamos agora assinalar o vigésimo aniversário da sua morte.
Trabalhar arduamente para realizar as condições necessárias à fundação do Partido – eis, na hora actual, a nossa tarefa de combate! A nossa maneira de celebrar Estaline!
Devemos fazer nossas as palavras do camarada Mao Tsé-tung, escritas em 1939:
47 -- «FESTEJAR Estaline não é uma formalidade. Festejar Estaline é tomar o partido de Estaline, da sua causa, da vitória do socialismo, do rumo que assinalou à Humanidade, é tomar partido dum amigo íntimo, já que a maioria dos homens vive actualmente no sofrimento e não pode libertar-se a não ser seguindo a rota indicada por Estaline e com a ajuda de Estaline».
Que Viva Estaline!
Directiva do Comité Lenine, Comité Central do M.R.P.P.
aprovada na Reunião Plenária de Outono de 1972
"esquerdismo" - a doença infantil do com
a catastrofe iminente e os meios de a co
a classe operária e o neo-malthusianismo
as possibilidades de êxito da guerra
as tarefas dos destacamentos do exército
carta ao comité de combate junto do comi
chile: lição para os revolucionários de
discurso radiodifundido em 3 de julho de
do socialismo utópico ao socialismo cien
editorial do bandeira vermelha nº1
imperialismo - estádio supremo do capita
jornadas sangrentas em moscovo
karl marx (breve esboço biográfico...
manifesto do partido comunista
mensagem do comité central à liga dos co
o exército revolucionário e o governo re
o materialismo dialéctico e o materialis
os ensinamentos da insurreição de moscov
para uma linha política revolucionária
pensar agir e viver como revolucionários
reorganizar o partido revolucionário do
sobre o que aconteceu com o rei de portu